
1 A gotejar tema. Chega. Este é O jogo. Aquele que estavas à procura há anos. Complexo, sim, mas de uma profundidade narrativa que rivala um qualquer prémio Nobel
da literatura. Para toda a dificuldade da parte mecânica deste jogo (e já lá vamos), existe uma explicação temática que faz todo o sentido e ajuda até a interiorizar este
livro de regras. E o absolutamente fantástico neste jogo é a vertente revisionista com que apresente (possívelmente!) a História da Europa renascentista: "Lembras-te quando
o Sultão Mehmed II casou com a Rainha D. Isabel de Castela e conquistou os Estados Papais abrindo espaço para uma campanha dos Bórgia para usurpar a aristocracia francesa?
Como não? Foi exactamente o que aconteceu!" Isto tudo numa caixa pouco maior que um maço de cigarros. Este jogo é o génio do Aladdin: poderes cósmicos fenomenais,
dentro de uma lampadazinha.
2 Puxado da breca! O peso deste menino não é para fracos: a quantidade de regras que é preciso ter em mente quando se inicia o jogo é equivalente a muito bom wargame
que por essa terra fora se vende e joga. Há 8 acções possíveis, todas com suas regras, sendo que uma delas é jogar a carta e provocar um de 3 tipos de guerra diferente,
com intervenientes diferentes, e consequências diferentes, em cima de 4 tipos diferentes de vitória possível. Com o tempo, isto encaixa tudo. Mas demoooora.
3 Learning curve: u cursivo. "Só sei que nada sei. Mas sabendo que nada sei, sei mais que aqueles que pensam que sabem e nada sabem" - Lemon, e também Sócrates.
O primeiro contacto com o jogo é tipo burro a olhar para o Taj Mahal: não só é preciso saber aquelas regras todas mas também perceber 'o que raio é que é
suposto eu tar a fazer agora??' - o que os cultos deste nosso óbi chamam de opacidade. E depois aos poucos, com múltiplas partidas, lá vai entrando na mioleira uma ou
outra estratégia, pequenos truques na manga, até que - ahhh já percebi! - só para vir depois aquela sensação de que estamos a cair quando nos apercebemos das enormes
possibilidades estratégicas do jogo que ainda mal roçámos. E a escalada para a mestria começa de novo.
4 Si Vis Pace, Parabellum Este belíssimo adágio romano traduz-se mais ou menos em: "se queres paz, prepara-te para a guerra". Isto é o que me fascina na série Pax: não são wargames.
mecânicas mais mirabolantes da série é o Strawman: um jogador atacar ou fragilizar a sua posição por motivos pérfidos. Por exemplo: se eu sei que vou perder a influência sobre um
reino para outro jogador, é de todo o meu interesse destabilizar a economia e sociedade desse "meu" reino, aumentando impostos e oprimindo o povo, para que quando mude de mãos
seja preciso apenas um empurrãozinho para estalar a revolução. O conceito de abandonar todo o sentimento de "estas são as minhas peças, aquelas são as tuas" é extremamente difícil.
A partir do momento em que as peças estão no tabuleiro, são de todos. Ou melhor, do influenciador mais persuasivo.
5 O céu é o limite. Cada jogatana vai usar à volta de 40 cartas, de um baralho de 120. Claro que isto significa que, com todas as combinações possíveis, é muito difícil de se ver o mesmo
jogo com as mesmas estratégias e os mesmos resultados duas vezes. A rejogabilidade é altíssima mas mais relevante que isso é a tal narrativa de que falava. Com um pouco de imaginação
todas as sessões de Pax Renaissance vão contar uma história diferente. Qual será o futuro da Europa quinhecentista? Expansão em direcção ao Novo Mundo? Renascimento iluminado?
Paraíso democrático sufragista? Teocracia suprema absoluta? Ou um mergulho nas profundezas do Feudalismo eterno?
6 É essencialmente um jogo de cartas. Mais especificamente um tableau-builder. Embora exista um mapa físico e a interacção se dê em grande parte nesse mapa, este jogo é um jogo
de cartas. É absolutamente imprescindível que se jogue com atenção aos tableaus dos adversários e aos seus avanços em direcção às diferentes condições de vitória. E isso leva-me a
outra particularidade do sistema pax: os tableaus estão ligados geograficamente. Com isto quero dizer que, tendo as cartas todas uma localização onde actuam no mapa, duas cartas
que partilhem uma localização encontram-se ligadas uma à outra para ataques e afins. Mais uma cena para dar dores de cabeça!
7 3 é a conta que Deus fez. O jogo desenrola-se muito bem com 2 jogadores. Ia dizer que é um pouco como xadrez mas isso é mentira: a incerteza de que cartas estão
presentes nos baralhos não nos deixa apostar numa estratégia a 100%. Mas a verdade é que é uma contagem que permite uma flexibilidade mais relaxada, menos caótica. O mesmo não
acontece com 3 jogadores. Sendo que o mercado de onde podemos adquirir cartas é composto de apenas 10 cartas, um jogo a 3 jogadores torna-se menos determinístico e mais táctico.
Gosto de jogar a 2 aos dias de semana, a 3 ao fim de semana.
8 The King Stays The King. Tal como muitos jogos do seu peso, a habilidade dita o nível de jogo. Isto significa que não existe quase hipótese nenhuma de um novato derrotar um veterano
neste jogo. Isto gera uma condição interessante que às vezes é menos acolhedora: não há muita gente a apreciar jogos do peso de Pax Renaissance, e menos a quererem jogar regularmente,
levando a uma desigualdade de habilidade entre ti e os novatos que vão jogando de vez em quando. Se acharem que têm um grupo que alinharia em jogos semi-regulares deste peso, então
o jogo é definitivamente um must-buy. De outra forma, é preciso trabalhar para arranjar parceiros à altura.
9 Portugal a pôr-se no mapa. Existe uma variante a solo extraordinária, feita por um Português, José Cunha! (GANDA TUGA!) A razão pela qual menciono a variante, é porque acho que triunfa
acima das outras variantes Pax - tenta eficazmente simular uma intelegência artificial desafiante ao invés de usar dados para substituir agência competitiva.
10 Fora de brincadeiras. Este jogo é absolutamente fenomenal. Não é para todos, principalmente porque requer uma dedicação acima da diversão casual (é preciso suar um pouco antes de
começar a diversão), é pesado, denso, e opaco. Mas é essencialmente um livro em forma de simulação histórica. Vasto como o oceano em termos de rejogabilidade, e profundo como o
mesmo em termos de estratégia. Não devia admitir isto, mas devido à raridade do jogo e o quanto eu amo este jogo, é o único na minha prateleira do qual tenho duas cópia. Tinha medo
de ficar sem ele em caso de desastre natural!
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