A escassez de jogos em língua portuguesa

Li um post neste forum que sobre o declínio da Majora e a nova tentativa de a resuscitar. Isso pôs-me a pensar num problema: como garantir a viabilidade económica dos editores de jogos portugueses? A resposta imediata é uma lapalissada: aumentar o número de compradores e jogadores de jogos de tabuleiro. Mas como é que se consegue isso? Que fatores impedem que tal aconteça?



Creio que um dos grandes obstáculos ao crescimento do número de jogadores em Portugal é a escassez de jogos de tabuleiro contemporâneos traduzidos para português.



Jogar em inglês (ou, mais raramente, em francês ou alemão) pode ser uma marca distintiva apreciada por um conhecedor. Mas afasta também um número muito grande pessoas. O facto de se ter de jogar com regras/cartas/peças/tabuleiros numa língua estrangeira é altamente inibidor porque: (a) dificulta a aprendizagem e o jogar correto do jogo; (b) obriga a um esforço adicional que se faz à custa do prazer de jogar; e/ou (c) porque se cria uma situação embaraçosa onde as nossas faltas de competências linguísticas se tornam visíveis perante os outros. Em qualquer dos casos, ter de jogar um jogo em língua estrangeira é um forte dissuasor para potenciais novos jogadores.



A inexistência de versões em português também reduz drasticamente o leque de potenciais distribuidores e vendedores ao público de um jogo. Se jogos em português já não são fáceis de vender, então se estiverem numa língua estrangeira reduz ainda mais o potencial de vendas. E o círculo vicioso continua. Sem vendas em Portugal, não há editores portugueses, sem editores portugueses, não há jogos originais ou traduzidos para português, sem jogos em português não há jogadores e sem jogadores, bem, não há vendas.



Tenho a certeza que já muita gente pensou nisto. Mas gostaria ainda assim de lançar alguns tópicos para discussão para tentar compreender este mistério da escassez de edições em português e também lançar pistas para quebrar o círculo vicioso.


  • Kickstarters e P500. Acho que o problema da Majora foi querer fazer demasiado, demasiado depressa e sem foco. Publicar um jogo, original ou traduzido, é um risco tremendo em qualquer lado do mundo – em Portugal nem se fala. Produzir vários jogos ao acaso e em rápida sucessão (como parece que aconteceu com a Majora) parece uma receita certa para a falência. Soluções do tipo P500 e Kickstarter podem ser uma forma valiosa para os editores avaliarem um mercado que ainda é de nicho, definirem calendários e prioridades ajustadas de publicação e também de garantir que (pelo menos) não perdem dinheiro com as edições em português. Já alguém o tentou? Com que resultados?


  • Brasil. Se se puder publicar jogos traduzidos para português ao mesmo tempo em Portugal e no Brasil, o número de compradores potenciais cresce exponencialmente sem acréscimo significativo dos custos de produção para além da aquisição da licença para outro país. Há experiências disto (por exemplo, Devir)?  Que aconteceu?


  • Espanha. Há um grande número de jogos que são “language independent”. Para estes, as edições portuguesas ou as edições espanholas – que são bastante numerosas -  podem facilmente transformar-se em ibéricas. É só acrescentar as regras em português. Já vi isto feito com o Formula D e com Hive, por exemplo. Economicamente, isto faz todo o sentido: as editoras espanholas estarão a expandir o seu mercado (passando a abranger Portugal e até potencialmente o Brasil) com um aumento de custos mínimo (basicamente, traduzir e imprimir um folheto de poucas páginas). O mesmo vale para as editoras portuguesas (e potencialmente brasileiras), que passam também a editar para o mercado espanhol (e potencialmente, para o mundo de língua espanhola). Então porque acontece tão raramente? Há mais experiências de contactos/colaboração com editoras espanholas?


  • Corte Inglés e FNAC. Chegaram a ter uma oferta de jogos bastante interessante mas que quase desapareceu ultimamente. Alguém sabe o que levou à inflexão na política deles? Baixas vendas? Custos demasiado elevados para os distribuidores e editores porem lá os jogos?


  • Runadrake. Um caso curioso. Esta editora fez um excelente trabalho em traduzir o Dominion para português e conseguiu colocá-lo à venda em grandes superfícies como a FNAC (eu comprei uma cópia lá). Chegaram a prometer a tradução de uma das expansões, mas parecem ter desaparecido do mapa (a página deles está em baixo). O que lhes aconteceu? Como chegaram às grandes superfícies? Que vendas conseguiram? Fizeram algum tempo de pesquisa de mercado? A que conclusões chegaram?

Excelente texto, parabéns!



De facto, desde que entrei de forma mais séria no hobby há cerca de 10 anos, que nunca percebi muito bem a política da destribuição/tradução dos jogos em português. Na altura, entre o Corte inglês e a Tabak de Telheiras, consegui comprar jogos de qualidade como o Catan, Tigris & Euphrates, Puerto Rico, e até a Guerra do Anel em português (que na altura me disseram estar esgotado em todo o país, e portanto tive que comprar a cópia de exposição da Tabak…logo, suponho que tenha sido um sucesso de vendas? Ou não?..).



Hoje em dia, se for à fnac ou Cortes Inglês, a maior parte dos jogos são direccionados para um público mais casual ou infantil. O que por si só não é um problema, só acho que, dentro do género, poderiam disponibilizar produtos de melhor qualidade e não sempre a mesma treta de jogos de cartas simples à la Tom Vasel…



Por outro lado, aparecem alguns jogos mais complexosà venda, como o Zombicide a 90€, que não acredito que consigam vender em grande quantidade e fico perplexo por aparecer nas estantes… por três razões: 1ª, porque quem está por dentro do hobby, em principio não compra esse jogo lol (além da bonecada, o resto parece-me ser de fraca qualidade); 2ª, se de facto gosta do jogo, conhece outros sítios onde é bem mais barato; 3ª, quem não está dentro do hobby, não estou a ver a dar 90€ por um jogo que não conhece e que parece complicado (ainda para mais, totalmente em inglês).



A única coisa positiva que vejo nos anos recentes, é o aumento dos jogos portugueses à venda nas grandes superfícies. Só tenho pena que não se estenda também aos jogos do Vital Lacerda, do qual só apanhei uma vez o Vinhos na Fnac (que, claro, comprei). No entanto, num movimento contrário, no Colombo, por exemplo, há cerca de 5 anos havia quatro ou cinco lojas onde era possível comprar jogos de mesa. Actualmente, há apenas uma, a Fnac…



Em todo o caso, parece que a Devir recentemente voltou a apostar na tradução de grandes jogo. Pode ser um bom sinal para os próximos tempos!



Bernardo Cardoso








O texto é de veras interessante e o autor está de parabéns, pois não é todos os dias que se vêm posts destes por aqui a tentar discutir com alguma profundidade o problema dos jogos de tabuleiro em Portugal. Por algumas razões como falta de tempo e mais importante, a mairia das pessoas neste site já estão "plenamente integradas" nos jogos de tabuleiros, pelo que não há que pensar em "perguntas difíceis", pois não há interesse para isso de forma contínua (comparando com a restante quantidade de posts mais "simples e directos".



Mas a ideia da tradução e publicação em Portugal de jogos de tabuleiro é interessante, mas, a meu ver, não terá "seguimento", pelo menos nos tempos mais próximos.



Senão vejamos.



Temos dois grandes tipos de jogos. Os Ameritrash e os eurogames. Eu posso falar à vontade de ambos porque até à bem pouco tempo odiava eurogames e não via qualquer interesse em brincar ao farmville em tabuleiro (porque tb nao via interesse em brincar ao farmville no pc lol). E há cerca de um mês "vi a luz" dos eurogames, no formato do worker placement. Por enquanto ainda odeio jogos com dependência de leilões (acho parvo e isso vem bem retratado no going going gone, que é um bom light auction game, e nas palavras sábias do seu criador - " andar a apostar de 1 em 1 é entediante e parvo") e jogos pesados em termos economicistas. De ameritrash sempre gostei (rolar um carradão de dados, o tema forte, a imprevisibilidade, etc.), mas começo a gostar cada vez menos depois de jogar o Elder Sign no Android (considero o pior jogo da linha da FFG de CoC).



A verdadeira beleza dos eurogames, para mim, não está na estratégia pura e na eliminação do factor sorte. Para mim os eurogames brilham mesmo a sério no factor "sem dependência de língua" quase sempre presente a 100% ou a pelo menos 80%.



E parece-me que é isso que verdadeiramente os destingue. Outro dia pus-me a pensar nisso. Uma das principais produtoras de jogos é a Alemanha. E no entanto não há uma massificação da língua alemã. Então como é que isso é possível? Pelo factor "sem dependência de língua". Se o Catan, o Ticket to Ride, o Agrícola, o Le Havre, etc. tivessem a mesma dependência linguística que o Mansions of Madness por exemplo, seriam jogos bastante mais caros e menos procurados, creio eu.



"Hoje em dia" assistimos a uma verdadeira revolução de conceitos. O Mage Knight e o Robinson Crusoe são jogos claramente "euro-ey", mas nos quais a pessoa tem de saber inglês, ou então dificilmente se safa.



Esses jogos, que para mim são os melhores actualmente (para mim!), dificilmente serão "massificados", pois os custos de publicação em português devem ser proibitivos.



Assim, as editoras devem efectivamente apostar na publicação de jogos "euros", cuja única coisa que há necessidade de traduzir é o manual de regras. Isso seria um possível sucesso.



Já no que toca aos jogos mais Ameritrash, tentar uma publicação em português seria potencialmente desastroso, dados os custos envolvidos.



Por outro lado, os Ameritrash são potencialmente aqueles que as pessoas mais "facilmente papariam". Porque são aqueles em que há o atirar dos dados, o tema todo, etc.



Ou seja, é paradoxal! Daí a tendência ser cada vez mais aproximar os dois estilos, como se vê, por exemplo, em jogos como Fire Rescue, Nations, Euphoria, Lords of Waterdeep ou mesmo o famigerado Zombicide.



O Zombicide não está a 90, mas sim a ± 70 (regra geral, a FNAC está a vende-lo a 90, mas é um abuso). E, tendo em conta a qualidade dos componentes e o tipo de jogo (acção), são altamente justificados. Ou melhor são justificados comparativamente. Porque nada justifica os preços dos jogos na Europa. São exponencialmente caros em comparação com os EUA.



Mas esses jogos são jogos cheios de tema, de desenhos excelentes e que fogem do "banal eurogame".



Dificilmente uma pessoa qualquer vai querer jogar um jogo de tabuleiro sobre produção de Vinhos, ou de agricultura genérica, ou mesmo de carregamentos de mercadorias num porto. MAs se lhe meterem um Zombicide à frente até se baba (graças ao Walking dead, mas não interessa). Se lhe colocarem um Flash Point Fire Rescue ele identifica-se imediatamente com um bombeiro e toda a acção de percorrer a casa a salvar pessoas.



Não se pode pensar em introduzir as pessoas no mundo dos jogos se não se conhecer a pessoa e a aliciar aos jogos. Normalmente as pessoas não são aliciadas pela possibilidade estratégica e a mecânica x ou y. São aliciadas pelo tema e pela facilidade e rapidez de jogo.



A meu ver a aposta, a haver, tem de ser em jogos fáceis de explicar/aprender, rápidos, sem grande depência de língua (restrita ao manual se possível para baixar custos) e com um tema forte e arte marcada. Tudo o resto não vai servir a massificação dos jogos de tabuleiro e vai acarretar prejuízo às empresas. Não podemos pensar "epá gostava imenso de jogar este jogo com a pessoa x, se ao menos houvesse isto em português", temos de pensar "a pessoa x vai gostar deste jogo de certeza pois é rápido fácil e ela gosta de Y (tema), quase de certeza que a convenço a exprimentar.".



Digo isto eu que me sujeitei recentemente a jogar eurogames em virtude de alguns amigos meus não apanharem grande coisa de inglês (não o suficiente para o MoM).



Uma última situação. Bernardo, segundo a tua lógica o Zombicide seria um fracasso. Replicando a situação para o resto do mundo. O Zombicide está a 90 dólares (± os 70 euros), 70 libras e 70 euros. Quem está por dentro do hobby compra o jogo, sim, porque, actualmente está considerado como o melhor zombie game do mercado (principalmente tendo em conta ser cooperativo), não só por causa do tema, como pela minis, como ainda pela possibilidade de ser jogado em cooperativo e ainda pelas mecânicas de jogo em si (ah e a arte também é bastante boa…). Quem está muito dentro do hobby não compra na Fnac, mas tb tem de desembolsar 70 euros. Não é pouco. Qurem não está dentro do hobby não gasta 70 euros num jogo, nem 30. No máximo compra o carcassonne e das duas uma, ou gosta muito da mecânica, ou então fica horrorizado pela ideia de um jogo de tabuleiro. O IPAD/Android veio preencher algum vazio de promoção de jogos de tabuleiro no mercado que não os compra por defeito. A questão do Zombicide ser "totalmente" em inglês não é correta, tendo em conta que tem o manual em inglês e pouco mais. Mas garanto que mais depressa compravam o Zombicide a 30/40, que o carcassonne ou o Catan a 20(este último se o houvesse a 20 lol). Porquê? Tema e arte. são apelativos. o Zombicide é fácil, não é altamente complexo. Não é fácil estilo Carcassonne ou Catan, mas puxa mais por um não jogador para o integrar, devido ao tema.



Outro factor muito importante para um não jogador habitual, alguém que não está dentro do hobby. Jogo solo! Se eu não jogo jogos de tabuleiro, quase de certeza que não conheço quem jogue, ou então teria sido "chamado" por essa pessoa e não andava à procura de um jogo para jogar. Ora, assim sendo, eu "não jogador" não vou comprar um jogo (mesmo que de 20 euros), se não o puder jogar sozinho, pois existe o risco de eu gostar do jogo e ficar a ver navios porque não conheço ninguem que queira jogar comigo.



A componente solo em eurogames (veja-se o agricola, Mage Knight, Robinson, etc.) a meu ver é importantissima e talvez a razão pela qual as editoras não andam a descurar esse facto é o abrir as protas a um novo mercado, chamar nova gente para o hobby.



Bem, o texto vai longo, por isso fica por aqui.



My two cents anyway



Pedro

Aviso: o comentário abaixo é uma opinião bastante pessoal!



Tendo vários hobbies mais ou menos "obscuros", sendo jogar este tipo de jogos um deles, aquilo que me parece é que não temos massa crítica para estes negócios vingarem. E porque não somos suficientes para este negócio florescer?



Razão 1:

O povo português na sua maioria não está virado para este tipo de hobbies, as razões podem ser muitas, podemos sempre culpar a crise económica, podemos dizer que é histórico, mas na minha opinião é mesmo uma questão cultural.



Há um conjunto de temas que são vistos como demasiado infantis. Chega a ser uma antítese haver tanta resistência a estes temas, mas relativamente a tecnologia, o "brinquedo" mais novo é obrigatório de se ter, seja um telemóvel ou uma Bimby.

São este tipo de coisas que o português gosta, objectos que mostram (elevam?) o status quo. Não um passatempo "estranho" que junta a família e/ou amigos.



Razão 2:

Os gamers (neste caso específico). Estes somos todos nós, aqueles que poderiam ajudar este negócio a vingar e a crescer.

Como? Vou dar um exemplo mais ou menos relacionado:

Alguns americanos não abdicam de comprar os seus jogos na sua FLGS (friendly local game shop). Fazem isto pois sabem que se eles próprios não suportarem esse negócio, aquele pequeno oásis desaparece e não poderão voltar a pegar nos jogos fisicamente antes de os comprar tendo de recorrer a lojas online sem espaço físico.



Ora, quantos jogos abdicamos de comprar online para comprar a versão portuguesa? Ou seja, como estamos nós a apoiar as editoras e lojas portuguesas que tentam entrar neste difícil mercado? Procurando o preço mais baixo em lojas online estrangeiras… smiley





É uma situação difícil de desembrulhar para quem queira investir neste negócio, por um lado tem um país inteiro de potenciais clientes que não está sensibilizado para estes hobbies, por outro tem um pequeno grupo de gamers ávidos que compram apenas os jogos mais recentes e obscuros na procura de experimentar, e por vezes coleccionar, a maior quantidade de jogos possíveis. O primeiro grupo será eventualmente comprador dos chamados jogos gateway, o outro será comprador dos jogos mais gamer.

Destes dois grupos tem um subconjunto muito pequeno de jogos que consegue comercializar a estes dois grupos sendo que o primeiro grupo não sabe porque deve gastar dinheiro neste item e o segundo grupo quer apenas comprar os jogos mais recentes ao preço mais barato.



 A grande questão, na minha opinião, é mesmo: "Como mudamos o hábito dos portugueses, gamers e não-gamers?"

Não sei bem se é a questão do solo a mais importante nisto tudo cheeky

Não tenho números, mas tenho ideia que a quantidade de gamers que jogam a solo é bastante reduzida.

E se os gamers não o fazem, os não-gamers menos o fariam.



Penso que as editoras apostam nessas variantes, porque repararam que há jogos em que de facto podem alterar de forma mínima o jogo para suportar um número mais variado de jogadores. Nos eurogames nota-se particularmente, pois bastantes possuem nenhuma ou muito pouca interacção entre jogadores, o que facilita simular estes factores externos através dum mecanismo simples.

E ter um jogo que dá de 1 a 6 jogadores, em princípio terá mais público alvo do que de 2 a 6.



A questão do preço é um bocado tendenciosa, porque é que alguém gasta centenas de euros num iPad, mas não gasta menos de 100 num jogo? Não tem somente a ver com o valor financeiro, tem também relação com o retorno que a pessoa calcula que vai ter com determinada compra.

Verdade seja dita também não invisto muito em violinos, não vejo utilidade nos mesmos, no entanto de certeza que há quem gaste fortunas em violinos cheeky

com as razões acima. Quanto à questão cultural, é uma inevitabilidade. Mas, quanto à 2, o que dizes parece a mesma questão entre comprar jogos de consola no "comércio local" ou online. Ou mesmo, in extremis, entre comprar tomate espanhol ou português. eu prefiro pagar menos, mesmo que online e em inglês. Mas entendo que tal prejudica o factor "português". Mas compreendo e aceito. Para mim também é uma inevitabilidade. É triste e egoísta da minha parte? É. Mas não vejo razão para gastar mais dinheiro.



Quanto ao factor solo. Continuo a achar que há um grande preconceito contra o factor solo. O que não percebo, pois creio que é um mercado com um potencial incrível e cada vez mais em expansão.


Quanto ao preço dos jogos nas FNAC e lojas físicas --- o preço é totalmente racional e resulta do "price targeting". Quem ouviu falar e tem possibilidades compra mesmo mais caro (como eu próprio já fiz). Não baixam os preços porque nunca têm o objectivo de vender muito e há sempre meia dúzia que pagam o preço mais alto.

Não tenho a certeza que a lingua seja tão relevante na maior divulgação dos jogos de tabuleiro; mesmo que o fosse os eurogames tipo Carcassone, Genial, Keltis, etc. não "sofreriam" desse problema --- e não há evidencia de que vendem melhor do que jogos que dependam do texto.

Francamente acho que a maior limitação é cultural. Um mercado para jogos de sociedade ou tabuleiro só pode prosperar num pais onde há há uma classe média com formação e possibilidades económicas para valorizar os aspetos lúdicos da vida. É exatamente a mesma razão pela qual há em Portugal pouca edição de livros, de revistas de especialidade, de hobbies, etc. Correndo o risco de incomodar alguém eu acrescentaria que há entre nós uma costela de "mal estar católico" em relação ao jogo (excepto futebol!) por não ser trabalho ou castigo.

É também pela mesma "razão" que se despreza em Portugal a investigação ciêntifica teórica (que é com um jogo -- não se aplica ao "mundo real").

Enfim, admito que esteja a ser demasiado pessimista -- acho que é sinal que já estou a ficar velho ;-)


Pedro 


Acho um pouco diferente, principalmente se pensares numa loja física de jogos. Jogar jogos de vídeo ainda é uma coisa relativamente solitária (mesmo quando se está a jogar online).



Para jogar jogos de tabuleiro, se tiveres um sítio onde possas socializar e se a sobrevivência dessa loja depender do volume de negócio então o que disse faz mais sentido,

Antes de mais, peço desculpa se ofendi alguns fans do Zombicide ;). Eu gosto realmente mais de eurogames do que jogos Ameritrash, e talvez tenha sido isso que me levou a ir buscar este exemplo. O Zombicide pode ser o melhor jogo zombie do mercado, mas isso não faz com que seja um grande jogo. Pelo menos, na minha opinião, no panorama geral, comparando com outros. No mesmo sentido, tal não impede que seja um grande sucesso comercial. 



Eu referi este jogo por duas razões: primeiro, porque continuo a achar o preço absurdo (falo do caso da Fnac)! Segundo, porque acho que é um tipo de jogo que não ajuda muito à divulgação ou introdução de novos jogadores. Diria o mesmo se o Caverna fosse posto à venda por 90€ na Fnac.



Outro ponto que penso ser importante é definir que novos jogadores são esses. Penso que o caminho não será tentar persuadir pessoas que geralmente não gostam de jogos de tabuleiro, jogos de coomputador, nem nunca jogaram. Ou então tentar apanhar um fan Batman ou The Walking Dead. Grande parte das pessoas que se tornam "gamers" são as que jogavam Monopólio, Risco, etc., quando eram miúdos (grupo no qual eu me incluo e suponho que grande parte dos membros deste fórum), mas que só mais tarde tiveram oportunidade de conhecer outro tipo de jogos, mais complexos. Nesse sentido, penso que o problema não é falta de interesse, mas sim desconhecimento total sobre os bons jogos que há. Porque para os jogadores casuais penso já haver uma oferta mais que suficiente, o problema está na oferta para os potenciais hardcore gamers.



Por exemplo, eu entrei no mundo "hardcore" dos jogos de mesa porque adorava o Risco. Acontece que também adorava o Senhor dos Anéis. Resolvi fazer uma pesquisa e encontrei a A Guerra do Anel (claro que fiquei WOW quando vi imagens do jogo). Foi dos primeiros jogos "a sério" que tive, a par do Catan e do Puerto Rico, e a partir daí nunca mais parei. Mais tarde, na Faculdade, quando disse aos meus amigos que tinha vários jogos de tabuleiro, incluindo um jogo sobre o Senhor dos Anéis "tipo Risco", ficaram fascinados a pedir para jogar. Algund deles, começaram também a comprar jogos.



Na minha opinião, há em Portugal um grupo relativamente grande de pessoas que conhecem e gostam do Monopólio e do Risco. O caminho será mostrar jogos que lhes tragam semelhanças a esses dois. Para os que também são fans do Senhor dos Anéis, acredito que nenhum deles resistiria ao esforço de aprender a jogar a Guerra do Anel (eu, pelo menos, não resisti :)). No entanto, se lhes mostrarem o Hobbit (o do Knizia, que nunca joguei, mas ao que consta é bastante fraquinho e bem inferior ao excelente Lord of The Rings do mesmo autor), não sei se o interesse será o mesmo. Digo isto porque já vi uma montra na Fnac com esse jogo exposto numa vitrine. Suponho que alguns compram para experimentar (por serem fans do LOTR ou por ter sido oferta, etc.) e acham piada e tal, mas pouco depois põem o jogo de lado. Enquanto que se pusessem a A Guerra do Anel exposta (mesmo em inglês), iria atrair não só fans dos livros, mas pessoas que também gostavam de jogar Risco (e portanto, que já tiveram o impulso de comprar um jogo de tabuleiro). E, como tal, potenciais compradores de mais jogos e não apenas uma compra de um jogador casual.



Em relação aos jogos a solo, concordo perfeitamente com o user que mencionou o assunto. Também gosto de jogos a solo, nos eurogames não, mas sim no estilo do Mage Knight e do Eldricht Horror (um dos poucos ameritrash que tenho, comprei-o só mesmo para jogar a solo, pois mais ninguém que conheço gosta do jogo). Acho que é uma funcionalidade importante, pois algumas pessoas que conheço não compram jogos de tabuleiro porque não têm ninguém para jogar. 










Por acaso não sou fã de zombicide, por isso não fico nada chateado ou ofendido. Acho o jogo brutalmente caro. Disse que é considerado o melhor zombie game actualmente, mas atenção que eu não o considero. Para mim os 2 melhores zombie games são Last Night on Earth (continua a ser) e o Zpocalypse (se ao menos lhe tirassem as piadolas parvas que tem… era perfeito). Mas acho que o Zombicide não são só minis. Acho a mecânica do jogo muito boa. Para além de ter vários cenários, permite ter aquela sensação de sufoco no meio de zombies, e é coop (permitindo jogar a solo). Não é um excelente jogo, mas é bastante bom.



Só um aparte em relação a este tópico. Os jogos estilo Zombicide têm sido mais "popularizados" por causa do Kickstarter, que permitiu aumentar exponencialmente a output the minis, por causa dos stretch goals. Jogos como o Kingdom Death Monster, o Myth, Journey, ou mesmo o Shadows of Brimstone (único que fui a tempo de apoiar), têm um output the minis enorme, mas ainda assim não descuram o gameplay.




Até pode ser pensado, não tem é que ser "bem pensado". :slight_smile:  Na FNAC, em relação aos livros isso funciona, pois eu sei que se lá for eles têm uma seleção enorme, não me importo de pagar um pouco mais sabendo que vou a um sítio onde posso olhar para a prateleira e escolher à vontade, até posso ler um pouco dum livro (se bem que há quem os leia por inteiro…).

Se não tiverem o livro que procuro posso encomendá-lo sem grande trabalho…



Quanto aos jogos já é diferente, a seleção é extremamente limitada, não consigo obter informação nenhuma acerca deles através dos empregados, porque não hei-de ir a uma loja online nesse caso?



Para mim lojas físicas tipo FNAC, tabacarias, Continente, não são os sítios onde se deve apostar inicialmente. Isso são lojas para um produto já massificado, tem de haver o primeiro passo, a loja de especialidade. Tem é de ter maneira de sobreviver no nosso tipo de mercado…

Concordo com o que já foi dito sobre a desvalorização das lojas físicas ou das traduções para português. Ao contrário de países como Espanha, Brasil ou França as pessoas não estão dispostas a pagar mais por uma edição de qualidade na sua língua ou para ajudar a que uma loja mantenha aberto um espaço para se jogar.



Também, já que estamos numa de filosofar :slight_smile: na medida em que não temos dados concretos de nenhum dos negócios em causa, não acho que a cultura Portuguesa seja de alguma forma resistente aos jogos de convívio. No entanto, é verdade que, em todas as áreas, priveligiamos "o nosso cantinho" em prejuízo do "espaço público".  



Quanto à questão da língua, as pessoas não estão habituadas a aprender um jogo sozinhas comprando-o, levando-o para casa e lendo o manual. Por isso, o nosso papel como fãs e promotores destes jogos é essencial para que nos encontros de todo o género que organizamos em Portugal as pessoas possam efectivamente conhecer e aprender o que querem jogar.

 

Concordo com a maior parte do foi dito aqui, no entanto, acho que a questão original sobre o que seria necessário para um renascimento da Majora (ou o nascimento de uma qualquer editora) ser um sucesso passa precisamente pelo ignorar da questão linguística…



Pensar no mercado português não faz qualquer sentido hoje em dia. Nem neste negócio nem em nenhum outro. Portugal é um país demasiado pequeno e demasiado pobre para ser viável como mercado para produtos de entretenimento… Onde o dinheiro escasseia para coisas importantes e os salários são extremamente baixos, não há mercado para o superflúo como são os jogos de tabuleiro.



Ah e tal mas as consolas vendem e os estádios de futebol têm gente.

Sim, é verdade, mas as consolas não são produzidas em Portugal. São importadas e o esforço de marketing feito pelas multi-nacionais que as produzem é de uma brutalidade difícil de crer. Aqui há uns tempos vi uns cartazes na rua e pensei que eram a anunciar um filme… Afinal era um jogo. Mesmo assim, acreditem que não vendem nem de perto tanto, em termos percentuais, como na maioria dos países europeus, por exemplo.

Os estádios estão com gente (mas longe de cheios, mesmo assim) porque, infelizmente, Portugal é um país que vive para o futebol. A maioria da população está alienada e obcecada pelas tricas, mariquices e outras coisas associadas ao futebol, mesmo que o que é efectivamente jogado no campo seja pouco e mau. Isto é mais ou menos cultural e vem de há muito (a cultura de Fátima, Futebol e Fado promovida pelo Estado Novo será, talvez, o início) e será difícil de ultrapassar…

Só mostrando alternativas é que as pessoas poderão interessar-se pelas mesmas e isso passaria pelo mudar de paradigma na comunicação social, nas políticas ligadas à cultura e em muitos outros aspectos onde a inércia e os "interesses instalados" são extremamente fortes.



Continuando, para uma Majora ter esperança de sucesso terá que pensar no mercado global, pelo menos no ibérico e luso-brasileiro.



Claro que um esforço na dinamização da comunidade de jogadores é uma boa estratégia paralela. Uma comunidade activa gera um mercado activo. Mas dinamizar a comunidade e trazê-la para a compra de produtos editados por empresas portuguesas (não necessáriamente em português) passará pela aposta em títulos adequados (algo que a Morapiaf tem feito muito bem), pela facilitação do acesso à informação sobre os jogos (disponibilizar a explicação da regras online em formato vídeo, por exemplo), quem sabe pela abertura de espaços,ou estabelecer parcerias com espaços, onde seja possível experimentar os jogos (ou ter demonstrações em curso com frequência nos espaços onde os jogos estão à venda) e claro, pelos preços minimamente atractivos…



A questão dos preços é fundamental e aqui eu acho que o problema está a tomar contornos globais e que me fazem lembrar uma bolha de mercado… Os jogos estão muito caros. Não é só cá, note-se.

E seria de suprema importância garantir que a "compra nacional" compensasse em relação à compra online… Para isso só vejo uma solução, vender directamente online e oferecer aos distribuidores/retalhistas condições para que, vendendo ao mesmo preço da loja online, tenham algum lucro.



Uma outra forma de tentar minimizar os riscos que poderá ajudar na viabilização passa pela utilização de formas de financiamento como o Kickstarter (embora eu seja avesso a isso e desconfie da vasta maioria dos projectos aí presntes) ou o estabelecimento de programas como o P500 da GMT que "garante" o número de vendas necessário a cobrir o investimento numa edição. Claro que um programa tipo P500 ou mesmo um projecto no Kickstarter implicam um investimento na divulgação do que é o jogo, como funciona, etc… Há que perder o medo de que roubem as ideias ou a mania de que o segredo é a alma do negócio. Clientes informados são clientes satisfeitos. Clientes satisfeitos são a melhor forma de publicidade.



Enfim… A questão é muito complexa e nenhuma resposta é garantidamente a correcta, incluindo estas. Aquilo que podemos fazer é conjecturar…



Conjecturei.



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E muito bem diria eu.