Li um post neste forum que sobre o declínio da Majora e a nova tentativa de a resuscitar. Isso pôs-me a pensar num problema: como garantir a viabilidade económica dos editores de jogos portugueses? A resposta imediata é uma lapalissada: aumentar o número de compradores e jogadores de jogos de tabuleiro. Mas como é que se consegue isso? Que fatores impedem que tal aconteça?
Creio que um dos grandes obstáculos ao crescimento do número de jogadores em Portugal é a escassez de jogos de tabuleiro contemporâneos traduzidos para português.
Jogar em inglês (ou, mais raramente, em francês ou alemão) pode ser uma marca distintiva apreciada por um conhecedor. Mas afasta também um número muito grande pessoas. O facto de se ter de jogar com regras/cartas/peças/tabuleiros numa língua estrangeira é altamente inibidor porque: (a) dificulta a aprendizagem e o jogar correto do jogo; (b) obriga a um esforço adicional que se faz à custa do prazer de jogar; e/ou (c) porque se cria uma situação embaraçosa onde as nossas faltas de competências linguísticas se tornam visíveis perante os outros. Em qualquer dos casos, ter de jogar um jogo em língua estrangeira é um forte dissuasor para potenciais novos jogadores.
A inexistência de versões em português também reduz drasticamente o leque de potenciais distribuidores e vendedores ao público de um jogo. Se jogos em português já não são fáceis de vender, então se estiverem numa língua estrangeira reduz ainda mais o potencial de vendas. E o círculo vicioso continua. Sem vendas em Portugal, não há editores portugueses, sem editores portugueses, não há jogos originais ou traduzidos para português, sem jogos em português não há jogadores e sem jogadores, bem, não há vendas.
Tenho a certeza que já muita gente pensou nisto. Mas gostaria ainda assim de lançar alguns tópicos para discussão para tentar compreender este mistério da escassez de edições em português e também lançar pistas para quebrar o círculo vicioso.
- Kickstarters e P500. Acho que o problema da Majora foi querer fazer demasiado, demasiado depressa e sem foco. Publicar um jogo, original ou traduzido, é um risco tremendo em qualquer lado do mundo – em Portugal nem se fala. Produzir vários jogos ao acaso e em rápida sucessão (como parece que aconteceu com a Majora) parece uma receita certa para a falência. Soluções do tipo P500 e Kickstarter podem ser uma forma valiosa para os editores avaliarem um mercado que ainda é de nicho, definirem calendários e prioridades ajustadas de publicação e também de garantir que (pelo menos) não perdem dinheiro com as edições em português. Já alguém o tentou? Com que resultados?
- Brasil. Se se puder publicar jogos traduzidos para português ao mesmo tempo em Portugal e no Brasil, o número de compradores potenciais cresce exponencialmente sem acréscimo significativo dos custos de produção para além da aquisição da licença para outro país. Há experiências disto (por exemplo, Devir)? Que aconteceu?
- Espanha. Há um grande número de jogos que são “language independent”. Para estes, as edições portuguesas ou as edições espanholas – que são bastante numerosas - podem facilmente transformar-se em ibéricas. É só acrescentar as regras em português. Já vi isto feito com o Formula D e com Hive, por exemplo. Economicamente, isto faz todo o sentido: as editoras espanholas estarão a expandir o seu mercado (passando a abranger Portugal e até potencialmente o Brasil) com um aumento de custos mínimo (basicamente, traduzir e imprimir um folheto de poucas páginas). O mesmo vale para as editoras portuguesas (e potencialmente brasileiras), que passam também a editar para o mercado espanhol (e potencialmente, para o mundo de língua espanhola). Então porque acontece tão raramente? Há mais experiências de contactos/colaboração com editoras espanholas?
- Corte Inglés e FNAC. Chegaram a ter uma oferta de jogos bastante interessante mas que quase desapareceu ultimamente. Alguém sabe o que levou à inflexão na política deles? Baixas vendas? Custos demasiado elevados para os distribuidores e editores porem lá os jogos?
- Runadrake. Um caso curioso. Esta editora fez um excelente trabalho em traduzir o Dominion para português e conseguiu colocá-lo à venda em grandes superfícies como a FNAC (eu comprei uma cópia lá). Chegaram a prometer a tradução de uma das expansões, mas parecem ter desaparecido do mapa (a página deles está em baixo). O que lhes aconteceu? Como chegaram às grandes superfícies? Que vendas conseguiram? Fizeram algum tempo de pesquisa de mercado? A que conclusões chegaram?