a/state - You will never forget The City. But The City will forget you

À primeira vista esta edição da Contested Ground Studios parece ser ‘Dark City’ meets ‘Brasil’ o RPG. Mas – feliz ou infelizmente, dependendo dos gostos – não é o caso. a/state tem como pano de fundo, como o próprio nome indica, uma cidade. Ou melhor, A Cidade. A única cidade, tanto quanto se sabe, deste universo de jogo sujo e deprimente que mistura elementos de vários géneros, que vão desde o cyberpunk, ao steampunk, passando pelo terror. “Welcome to The City. You will never forget The City. But The City will forget you” é a frase-chave que resume o conceito do jogo. Na história do ‘setting’, cerca de 1000 anos antes da actualidade um evento desconhecido, mas certamente trágico e dimensões apocalípticas, mudou o destino dos habitantes. Uma das escassas memórias que persistem é a do Bombardeamento, uma chuva de fogo que fustigou a cidade até apagar todos os registos do que existiu antes. Outra das dolorosas memórias que nunca foram apagadas foi o evento conhecido como Shift. A grande mudança, que alterou não só a estrutura da própria cidade, como também originou o aparecimento de raças de seres sobrenaturais: os Drache, seres insubstanciais cujos objectivos são tão tangentes como a sua forma física, os Hager, criaturas humanóides fisicamente muito poderosos, Lugner, raramente vistos, mas cujos murmúrios são constantemente ouvidos por habitantes da Cidade, compelindo-os a executar tarefas cujos propósitos são desconhecidos, os Simils, seres inorgânicos, constituídos por metal vidro e bronze, mais comuns do que os restantes Shifted e muitas vezes contratados por humanos para tarefas pesadas, e os temidos Ubel, assassinos brutais, vestidos com farrapos ensanguentados.

A vida na City – um lugar saído do pior pesadelo da Revolução Industrial, cheio de ruas obscuras e canais fétidos, fábricas poluentes, becos imundos e casas decrépitas – é muito diferente dependendo da classe a que se pertence. A classe alta vive em torres de marfim muito longe (em termos de qualidade, senão em termos de distância) das slums imundas das classes baixas. Enquanto os executivos das grandes corporações têm acesso a tecnologia futurista, os recursos ao alcance dos mais pobres estão ao nível do nosso século XIX. Enquanto os ricos dispõem de todos os luxos, os pobres vestem-se com roupas de pele de cão e alimentam-se da carne dos mesmos. São lutas diferentes que se travam diariamente, a classe alta luta pelo poder numa complexa teia de rivalidades e complôs entre corporações, enquanto a classe baixa luta pela sobrevivência num mundo restrito e fechado, onde os rumores e as lendas imperam: a maioria dos habitantes conhece apenas o seu bairro e para além dos limites da City existem apenas as Outlands, onde a sobrevivência é impossível, tornando a fuga da vida miserável apenas um ilusão.

Naturalmente a classe baixa é a mais numerosa e o motor da prosperidade dos mais ricos. Para controlar o hipotético ímpeto revolucionário das massas existem, como seria de esperar, os mass media, a religião e o desporto. Várias corporações dedicadas ao entretenimento são descritas no ‘setting’, assim como as mais populares religiões e seitas e os desportos que atraem a atenção do povo, a maioria deles violentos.

Em linhas gerais é esta a descrição de a/state. Quanto ao sistema não tem muito que se diga, sendo simples o suficiente para apreender rapidamente, sem nenhumas características surpreendentes ou inovadoras. Atributos e skills medidos em percentagem, vantagens e desvantagens… Como o próprio criador do jogo (o escocês Malcolm Craig) afirma, a/state é sobretudo um cenário, as regras estão apenas lá para o servir. a/state já tem vários suplementos, alguns deles gratuitos (como é o caso do jornal fictício ‘Mire End Tribune’, posteriomente substituído pelo e-zine The Circular, que contém informações sobre as várias publicações da Contested Grounds). O material gratuito bastante razoável é, aliás, uma das grandes vantagens de a/state, incluindo uma versão lite do jogo perfeitamente jogável por si só. Dito isto, acrescento que ainda não joguei nem mestrei a/state nem conheço ninguém que o tenha experimentado. O material parece bastante promissor, mas sem a experiência prática não sei até que ponto é jogável. Caso alguém já o tenha experimentado, agradecia algum ‘feedback’.

Não deverias nunca ter escrito esta critica! Agora não consigo deixar de pensar que as imagens que descreves são perfeitas para o Filth & Fury!

Queria só apontar que sendo o autor escocês, isso parece-me mais algo da sua visão da Grâ-Bretanha do que outra coisa. ;)

--~~--

Alguém muito sábio disse uma vez: "So, Trebek, we meet again! The game's afoot!"

Por incrível que pareça, este setting é muito parecido com um descrito pelo autor de SF Português João Aniceto no livro “a teia”… Que eu aconselho vivamente como inspiração :wink:

Talvez tenham ido beber às mesmas fontes de inspiração. Entre os exemplos referidos pelo autor estão ‘New Crobuzon’, de China Mieville, ‘Gormenghast’, de Mervyn Peake, ‘Only Forward’ de Michael Marshall Smith e ‘Malachia’, de Brian Aldiss. Nunca li nenhum, mas também não sou grande conhecedor de ficção científica. Só mesmo em RPGs…

Definitivamente New Crobuzon é uma excelente fonte de inspiração pró A/State, se bem que essencialmente steampunk. Recomendo vivamente o Perdido Street Station e sequelas. É o único setting de steampunk que gosto mesmo. Pensa “Trinity” mas steampunk e mais porco.

Li Perdido Street e é também o único steam punk que gosto (por oposição a cyberpunk que adoro). Mas esse setting faz-me lembrar também Alita/Metropolis/Judge dread, etc. Pensando bem, esse setting não é lá muito original!

De facto o conceito não é original, mas o jogo apresenta-o de uma forma diferente dos exemplos que deste.