Aces&Eights : Melhor RPG tradicional de sempre?

Há pouco tempo comprei um RPG chamado Aces&Eights. É um RPG sobre o Old West, realista mas com uma historia Americana alternativa.

Meus amigos, este RPG é o melhor RPG tradicional que alguma vez li. Em termos de qualidade de apresentação é o melhor, em termos de qualidade de conteudo é incrivelmente crunchy, mas no bom sentido. As regras são excelentes, não há restrições de nenhum tipo a criar PCs e a jogá-los, o setting é excelente ao ponto que eu nem gostava de Old West e agora gosto graças a este RPG, tudo neste livro é perfeito. Eu devo ter lido todos os sistemas tradicionais desde AD&D 1st e já li mais RPGs que eu possa contar mas este Aces&Eights bateu tudo em termos de qualidade.

Pessoalmente nunca li um RPG tradicional tão bom como este. Realista, sem limites, possibilidades de histórias intermináveis, livro principal muito completo e cheio de pequenos detalhes brilhantes. Enfim, pela primeira vez na vida dou um 20 de 20 a um RPG, a este.

Investiguem este RPG da Kenzer pois vale vem a pena.

Daí as perguntas:

Como é o jogo?

O que é que tem de distintivo em termos de sistema de jogo?

E em termos de apresentação?

O que queres dizer com «não há restrições de nenhum tipo a criar PCs e a jogá-los»?

O que é para ti «tradicional» e não «tradicional»? (Nomeadamente ao ponto de poderes afirmar que tu deves «ter lido todos os sistemas tradicionais desde AD&D 1st»?)*

Gostava de ter uma ideia mais precisa, até porque o produto mais conhecido da Kenzer é um derivado do AD&D, o que não é exactamente muito representativo.

Sérgio Mascarenhas

* É que grande parte dos «sistemas tradicionais» mais resistentes ao tempo são anteriores ao AD&D1...

Vou tentar responder a tudo.

Como é o jogo?

O jogo é sobre o velho Oeste. Não tem exactamente nenhum objectivo, é literalmente um jogo sandbox. É passado na América mas uma América alternativa, em que o Sul empatou a Guerra Civil com o Norte e agora é um estado independente, o Texas é uma républica independente, tanto os Mormons como os Indios têm a sua própria nação e o território do Oeste ainda está a ser explorado, tal como no velho Oeste. Na prática isto não muda quase nada do ambiente do velho Oeste tradicional. O ambiente é mais do género Deadwood, a série, do que os westerns clássicos a que estamos habituados. É uma terra dura, brutal, racista e que não perdoa. É um setting amoral tal como o velho Oeste o foi.

O que é que tem de distintivo em termos de sistema de jogo?

Bem, o combate é o que salta à vista. Procura no Youtube pelo Shotclock e logo verás. Não, não é o primeiro RPG que usa tal mecanismo mas é um dos que os usa melhor. Não há iniciativa no combate, passa-se tudo em tempo real fracionado. A criação de PCs é incrivelmente crunchy mas no bom sentido, tu podes criar um PC através das regras e ficas com um PC tão completo ao ponto de poderes ter o passado delineado quase todo. Claro que podes também criar tu o teu passado mas a criação de PCs neste jogo foi feita para estimular a imaginação e criar PCs memoráveis. O jogo é muito realista, se tu entras numa batalha com armas de fogo o mais provável é morreres, e aqui as feridas são horriveis, dão-te danos permanentes do género nunca mais corres na vida e pior é que uma ferida pode infectar e grangernar, o que te mata. O sistema é um sistema de skills rollover, e o livro tem regras para tudo e mais alguma coisa que possas imaginar, mas são regras modulares, as que não precisas nem sequer lês, como por exemplo as regras para garimpar ouro. Outra coisa muito boa é que todos os atributos do teu PC são independentes um dos outros, não há modifiers na criação de PCs entre os atributos. Ou seja, podes ser um barbeiro epileptico que treme bastante as mãos quando barbeia mas que mesmo assim é excelente com uma shotgun. Podes criar um PC literalmente da maneira que tu queres e sair um PC brutal para RPing. As regras apesar de crunchy fazem sentido e acabam por ser intuitivas. O sistema em si não é um rehash de outros sistemas, usa muita coisa familiar mas dá-lhe sempre uns twists que tornam o sistema em algo único.

E em termos de apresentação?

Este RPG bate tudo, mas mesmo tudo, que há no mercado ou que houve, e aqui não estou a exagerar. Capa em couro, livro a cores e com páginas de papel glossy de alta qualidade, o livro é pesado, a organização do livro é excelente, a font é muito boa e os parágrafos estão bem organizados. O livro é fácil de ler. Melhor, usa fotos da época e pinturas de artistas famosos que viveram e retrataram essa época.

O que queres dizer com «não há restrições de nenhum tipo a criar PCs e a jogá-los»?

Tudo o que fazes com o teu PC é independente de tudo o resto. Por exemplo, a tua profissão não vai influenciar em nada o resto do teu PC, tal como o teu passado, religião ou skills, por exemplo teres o atributo Looks baixo não te impede de seres o pinga-amor com mais sucesso da tua cidade ou região. Estás livre de criares um PC à tua medida, visto que o jogo usa o sistema de atribuição e compra de pontos para moldares o PC. Agora quando digo que não há restrições digo no sentido em que os modifierss negativos por teres um Looks baixo não te impedem de seres o pinga-amor, por exemplo, mas antes ajudam-te tanto a moldar o PC como a ganhar build points. Os modifiers negativos relativos ao teu PC, em vez de penalizarem uma acção, criam antes oportunidades de RPing. É dificil de explicar mesmo para mim, só lendo o livro.

O que é para ti «tradicional» e não «tradicional»? (Nomeadamente ao ponto de poderes afirmar que tu deves «ter lido todos os sistemas tradicionais desde AD&D 1st»?)*

Bem, para dizer a verdade eu não faço distinção entre RPGs, só usei essa frase por causa das discussões entre o que é produzido na Forge e o que é produzido pelas grandes companhias, logo para mim tradicional é algo publicado pelas “grandes” companhias mas muito honestamente para mim um RPG é um RPG. Logo o meu contexto é, de RPGs criados por Mongooses e WWs e WotCs e afins, este é o melhor. Nos meus 22 anos de GMing já li todos ou quase todos os sistemas das grandes companhias de RPG, Storyteller, Basic, as várias formas de D&D, Runequest, Heroquest, Traveller, Kult, Earthdawn, Shadowrun nas várias edições, etc.

O A&8s é muito diferente do Hackmaster tanto em ambiente como em regras. A crunchiness é maior mas ao mesmo tempo é muito mais util. No A&8s não há literalmente um parágrafo com informação inutil, podes aproveitar tudo. Tal nunca tinha visto num RPG para ser sincero, os gajos da Kenzer acertaram em cheio com o A&8s nesse sentido de por tudo o que está no livro útil.

Agora claro está o teu interesse neste RPG também vai depender de gostares ou não do velho Oeste. Eu vejo o setting deste RPG como o Conan de Howard mas com armas de fogo.

Espero ter conseguido explicar as coisas mais ou menos bem.


A slumber did my spirit seal;
I had no human fears,
She seemed a thing that could not feel
The touch of earthly years.

Fica aqui uma bela recomendação.

Aces&Eights Roleplaying Game

[quote=MGBM]Bem, para dizer a verdade eu não faço distinção entre RPGs, só usei essa frase por causa das discussões entre o que é produzido na Forge e o que é produzido pelas grandes companhias, logo para mim tradicional é algo publicado pelas "grandes" companhias mas muito honestamente para mim um RPG é um RPG. [/quote]Também não faço distinções, mas, já agora, qual era o teu "melhor RPG de sempre" até aparecer o Aces&Eights? De qualquer forma, suponho que ainda não o experimentaste, mas ficaste com muito boas expectativas. Assim sendo, já saquei o preview para dar uma olhadela.

Fiquei curioso em relação a:

- como é que o jogo escolhe lidar com a questão habitual da descriminição sobre personagens femininas

- como é que o jogo equilibra a tremenda profundidade da criação de personagem com a facilidade que elas morrem

No entanto, suspeito que este é um toolbox RPG que passa um bocado ao lado destas questões. Vejo muitos mapas, stats e módulos de regras (para já não falar da menção a uma calculadora e a uma fita métrica). Suponho que caberá ao mestre-jogo montar a campanha a seu gosto.

Por acaso o meu favorito antes deste era o velhinho Earthdawn, mais pelo setting do que pelas regras mas até ter o A&8s tinha sido o RPG que mais me tinha impressionado em termos gerais.

Em relação às tuas questões:

-A discriminação no setting é identica à da época, ou seja, muita. O racismo também. É um jogo realista e brutal nesse aspecto, não há falinhas mansas. Aqui a escravatura ainda existe, pois o Sul empatou a guerra e ganhou o direito À independencia, portanto existem muitos ex-escravos que fugiram dos Estados Confederados da América, alguns tornando-se lendas no Oeste com as suas capacidades em várias áreas. Mas sim, racismo e descriminação é o pão nosso de cada dia neste jogo, é um setting realista à época. Mas aqui mesmo as PCs femininas podem-se tornar grandes lendas, nisso não há entraves. Qualquer um pode manusear uma pistola e criar a sua própria lenda. E sim, este jogo tem regras em o PC criar a sua própria reputação através de gabarolices.

-A criação de PCs é demorada, mesmo quando nos habituamos. Isto cria-nos um certo afecto a cada PC que criamos e faz com que nós o protejamos ainda mais, fazendo-nos pensar duas vezes antes de entrar num duelo por exemplo. Este RPG tem a alternativa de fazeres um random PC no entanto, só rodando dados e escrevendo os resultados. Por acaso este método cria PCs mesmo espectaculares que nos desafiam a fazer RPing.

Sim, este RPG é literalmente um sandbox. É mais um RPG de viveres a vida da altura do que tares a viver aventuras. É mais do género o teu PC decidir comprar um lote ao pé do rio e garimpar ouro do que formar um bando de bandidos e roubar tudo e mais alguma coisa, embora possas fazer isso também se quiseres.


A slumber did my spirit seal;
I had no human fears,
She seemed a thing that could not feel
The touch of earthly years.

[quote=MGBM]Sim, este RPG é literalmente um sandbox. É mais um RPG de viveres a vida da altura do que tares a viver aventuras. É mais do género o teu PC decidir comprar um lote ao pé do rio e garimpar ouro do que formar um bando de bandidos e roubar tudo e mais alguma coisa, embora possas fazer isso também se quiseres.[/quote]

Está-me aqui a passar muita coisa ao lado. Muitos dos rpgs que conheço são sandbox. Define viver a vida do que viver aventuras. De que modo é que garimpar ouro se torna excitante?


“You think I'm old and feeble, do you? Well, face my Flying Windmill Kick, asshole!"

[quote=Dwarin]Define viver a vida do que viver aventuras. De que modo é que garimpar ouro se torna excitante?[/quote]É excitante para quem seguir uma motivação simulacionista. Eles até recomendam o uso de cenários montado com casinhas, miniaturas, etc. Por outro lado, a vida de justiceiro ou bandido parece-me realisticamente perigosa, por isso - quem gostar da sua personagem - vai mas é cuidar do gado que a vida tá difícil :)

Yeap, exacto. Neste RPG tudo é perigosamente realista e como tal tudo acarreta uma certa dose de excitação e perigo. Pessoalmente adoro RPGs onde viver a vida seja o foco, em Conan eu faço isso com o meu grupo e de facto eles adoram isso. Não é preciso ter aventuras para tornar um RP excitante e interessante.

Afinal, ser-se advogado e defender um caso importante na cidade e ganhar bastante reputação com isso e começar a construir uma carreira através desse caso por exemplo é bastante divertido de se jogar se for feito bem, ou um rancheiro que conduz sua manada de gado para outra cidade, etc.

Se queres um exemplo de viver a vida neste RPG, vê a série Deadwood. Isso seria um exemplo do estilo deste RPG.

A slumber did my spirit seal;
I had no human fears,
She seemed a thing that could not feel
The touch of earthly years.

[quote=MGBM]Yeap, exacto. Neste RPG tudo é perigosamente realista e como tal tudo acarreta uma certa dose de excitação e perigo. Pessoalmente adoro RPGs onde viver a vida seja o foco, em Conan eu faço isso com o meu grupo e de facto eles adoram isso. Não é preciso ter aventuras para tornar um RP excitante e interessante.[/quote] Terás que me dar exemplos do que poderá ser uma sessão de Aces & Eights. Afinal de contas, o Deadwood tinha intrigas e histórias para contar e as personagens não passavam o dia a garimpar ou a conduzir gado do ponto A para o Ponto B. Quando ao Conan, nunca achei (lendo as histórias do REH) que o foco das histórias fosse a vida fora das aventuras. O Conan está sempre metido em intrigas e histórias cheias de acção (não confundir com combate). Claro que entre aventuras ele lá tem a sua vidinha mas acho que o REH fez bem em não nos descrever isso.


“You think I'm old and feeble, do you? Well, face my Flying Windmill Kick, asshole!"

Ok então. Por exemplo o grupo é constituido por um barbeiro, um engenheiro de locomotivas e um marshall.

O marshall decide ir ao barbeiro fazer a barba, tal como era costume neste tempo. Estando lá eles conversam acerca da nova linha de comboios que está planeada em passar pela cidade. O engenheiro de locomotivas chega à cidade para fazer a pesquisa do terreno por onde vai passar a linha. Nisto recebe um telegrama da companhia de caminhos de ferro dizendo que afinal a linha já não passa por lá. O marshall encontra o engenheiro e pergunta quanto tempo a linha demora até ser construida. O engenheiro diz que afinal já não vai passar ao que o marshall fica indignado e convoca a cidade para ouvir um discurso de quão importante o comboio seria para a cidade. O barbeiro, no entanto, aparece e defende a decisão da companhia, dizendo que as companhias têm direito a fazer o que querem, pois sendo ele um empresário assim por dizer ele sente uma certa afinidade com as companhias grandes. Uma discussão entre o marshall e o barbeiro segue-se, ao que o marshall decide não fazer mais negócios com o barbeiro. O engenheiro no entanto está no posto de telégrafo a tentar convencer a companhia a passar o comboio pela cidade, já que o discurso do marshall o convenceu. Entretanto o barbeiro agora terá que pensar em maneiras de conseguir clientela, visto que o marshall tinha bastante influencia na cidade e ele dizer que não vai mais à loja dele significa que o barbeiro vai perder muitos clientes, clientes esses que seguiam sempre a recomendação do marshall que tem uma reputação excelente devido a ele ser um gabarolas que exagera sempre os seus feitos. O barbeiro começa ainvestigar essas alegações dos feitos com esperanças de descobrir alguma mentira e provar à cidade que o marshall não é o que parece, esperançado assim de ganhar a clientela perdida.


A slumber did my spirit seal;
I had no human fears,
She seemed a thing that could not feel
The touch of earthly years.

Eis uma review no Youtube que encontrei

https://www.youtube.com/watch?v=Z9aLLrZFWw8

https://www.youtube.com/watch?v=mypdHolO_g8


A slumber did my spirit seal;
I had no human fears,
She seemed a thing that could not feel
The touch of earthly years.

Nesta categoria de "vou precisar das férias de Natal inteiras para ler isto" :) sugiro este doce tradicional:
Artesia: Adventures in the Known World

Talvez já o conheçam, mas acho que ainda não tinha sido referido aqui no site.