Actual Play: Narrativo ou Mecânico?

..este actual play é o mais interessante deles todos e um dos melhores podcasts do momento.

Se for algo num fórum ou num artigo, não costumo ter vontade de ler sobre a narrativa ou sobre as mecânicas, porque em ambos os casos temos abstracções criadas pela interpretação de quem as escreve, ou seja, não é ACTUAL play. Como diz o jrmariano, eu quero saber o que aconteceu durante a sessão, como é que se jogou, que regras é que se usaram e porque é elas funcionaram ou não, que aspectos do setting foram interessantes ou não para a história e porquê, que expectativas e gostos existiam nos vários participantes e como é que eles se concretizaram ou não em sessão, etc.

Parece-me que, por escrito, um actual play falha sempre porque dificilmente consegue dar uma ideia do que é que a sessão foi para as várias pessoas que a jogaram, com os seus diferentes pontos de vista. Normalmente, prefiro ouvir mesmo uma sessão gravada ao vivo ou algo como o podcast que indiquei.

Em tempos tinha o hábito de escrever uma crónica das sessões que mestrava, sem pretensões literárias (ou seja, não em forma de conto). Era uma espécie de auxiliar de memória para mim (e para mais alguém que quisesse ler) sobre as sessões passadas, para se poder aproveitar alguns detalhes que tivessem ficado esquecidos, atar pontas soltas e tal. Uma coisa pragmática apenas. De resto, nunca tive paciência para ler APs de outras pessoas, fossem mecânicos ou narrativos. Imagino que os mecânicos possam ter alguma utilidade para quem acabou de comprar um jogo (e já leu as regras) e queira saber como aquilo pode funcionar na prática, mas nunca senti essa necessidade. Por outro, os narrativos podem não ter interesse nenhuma para os outsiders, mas aumentar o interesse do próprio grupo - afinal demonstram uma dose de empenho do GM acima da requerida pelas suas “funções”. Acho que isto depende, acima de tudo, das pessoas com quem se está a jogar e talvez seja melhor esquecer quem está de fora. Digo eu…

Há transcrições destas coisas? A minha memória auditiva é um pouco... fraquinha...

Pessoalmente , prefiro escrever um AP narrativo , onde descrevo o que os PC´s fizeram e conto a história da sessão.

Primeiro quero só dizer que tenho consciencia que este tipo de AP será lido quase exclusivamente pelos jogadores da campanha ( e mesmo assim , nem por todos ) , mas tenho o secreto desejo que outros leiam e se interessem e possam tirar ideias.

Segundo , as minhas razões:

-isto serve como relato da história e registo do ocorrido

-para os jogadores que não apareceram , isto serve para saberem o que se passou e mais facilmente entrarem na proxima sessao

-numa campanha como a que estou a correr , onde existe bastante intriga a decorrer, este relato serve para terem um auxiliar de memoria

-numa campanha como estou a correr onde existe tantos eventos , consigo "aligeirar" algumas sessoes , relatando eventos que estão a acontecer noutras regiões sem roubar tempo á sessão propriamente dita ( isto claro , se os jogadores lerem todas as semanas a narrativa

-sou "maluco" Tongue out... porque convenhamos , escrever todas as semanas a narrativa do que se passou ( inclusive com fotos ) não é para todos. E no inicio , ainda me dava ao trabalho de escrever em português e inglês, tendo a partir de certa altura passado a escrever só inglês ( as razões de escrever em inglês prendem-se com o facto de postar os ditos AP no site oficial da WOTC , na pagina do nosso grupo , Confused, eu sei , mais uma maluquice......)

-os meus jogadores gostaram da ideia, e esta razão tem um peso importante no manter do AP semanal....

E pronto , são estas as razões, espero ter esclarecido e feito perceber que o importante aqui , para mim , são o que tu e os jogadores pensam sobre o AP, pois convenhamos , seja em que AP for , só uma minoria se dá ao trabalho de ler AP de outras pessoas ( a menos que sejam com o intuito de "reviews" de determinado jogo).

Por curiosidade , o meu AP está aqui :

https://community.wizards.com/jttsofs

[quote=Verbus]Há transcrições destas coisas? A minha memória auditiva é um pouco... fraquinha...[/quote]

Deixa lá, memória auditiva é para quem ainda tem de ir ás aulas Tongue out nós precisamos é de qualquer coisa para ouvir a caminho do trabalho. Se te esqueceres, melhor ainda, porque dá para ouvires outra vez Ashamed

Eu gosto de uma mistura bem regada entre regras e ficção.

Gosto de ler a parte ficcional para perceber que género de histórias se consegue contar com aquele jogo. Gosto de ler como é que os personagens agiram, com que situações foram confrontados, como é que reagiram a elas, etc. Se for um relato muito extenso sou capaz de me fartar, se for muito curto não percebo patavina do que aconteceu durante o jogo, mas uma boa dose de ficção para eu conseguir perceber o que se passou sem entrar em muito detalhe para mim é o suficiente.

Gosto de ler a parte das porcas e parafusos para perceber como é que as regras do jogo ajudaram a construir aquela história. Quem é que contribuiu para o quê, como é que aplicaram a mecânica x ou y, que limitações encontraram nas mesma ou onde é que as ela correram mesmo muito bem na construção da história. Muitas vezes leio relatos onde vejo mecânicas que já conheço a serem aplicadas de uma maneira completamente inesperada que me deixam a pensar “claro, faz todo o sentido, espectacular!!”, ou então ajudam-me a perceber como é que elas deviam funcionar. Por outro lado, se for meramente apresentação de regras, também, perco o interesse.

Tendo a ler muitos APs com o intuito de tentar perceber melhor jogos que gosto ou de descobrir novos, para mim é importante ver como é que a ficção e as regras fluiem e interagem entre si alimentando-se uma à outra. Também gosto de ler no fim do relato um pequeno paragrafo de reflexão sobre o jogo, onde se chega a alguma conclusão do que correu bem ou mal, dúvidas que surgiram, o que fazer de diferente ou novo na sessão seguinte,etc..

Quanto à escrita, tendo mais a escrever APs quando me surgiram dúvidas no decorrer de um jogo e por isso gosto de dar a contextualização da ficção, porque pode muitas vezes ajudar na resolução dessas mesmas dúvidas.

"the drunks of the Red-Piss Legion refuse to be vanquished"

Parece-me que tudo depende do objectivo do relato do jogo. Há aqui várias possibilidades:

(1) Diário de jogo do ponto de vista das personagens. Basicamente destina-se a preservar a memória para servir de referência futura, assegurando a consistência dos eventos. Centra-se mais na narração dos eventos tal como percepcionados pelas personagens. Não é ficção, assim como um diário não é ficção, mas pode ser escrito com algumas pretensões literárias, sobretudo se for para leitura aberta a mais gente do que o grupo de jogadores.

(2) Diário do jogo do ponto de vista out of character. Cumpre os mesmos objectivos do acima mas adiciona as questões dos jogadores. Problemas logísticos/pessoais a resolver, questões relacionadas com as regras (e como foram resolvidas), etc.

(3) Ficção de jogo. O escritor considera que o seu jogo é muito bom e interessante, que o universo de jogo é conseguido, que as personagens são notáveis, que os eventos idem, idem, e decide tornar aquilo tudo numa narrativa «literária», possivelmente adicionando uns pózinhos e subtraindo outros para tornar o todo ainda mais envolvente. Como é escrito do ponto de vista das personagens, não figura aqui o sistema, ou melhor, este figura apenas subliminarmente: quem conheça bem o jogo conseguirá identificar onde é que a situação narrada se desenrolou de acordo com as regras, o que pode ser parte do prazer de ler este tipo de escrito.

É comum a sua utilização nos próprios livros de jogo, como é evidente, pelo menos desde que o RuneQuest 2 foi publicado em 1978.

(4) Análise/apresentação de jogo. Aqui a descrição visa expor como é que o jogo decorre na prática. As regras em acção são absolutamente obrigatórias.

Pessoalmente prefiro (4). (1) e (2) são normalmente demasiado pessoais, compreensíveis e interessantes para os participantes no jogo. (3) cai facilmente no campo da ficção chunga escrita por gente sem talento nem técnica. (4) dá-me sempre algo: uma boa análise do jogo, que o ilustra e ilumina, nos melhores casos; a certeza de que não é por ali que eu vou chegar a qualquer conclusão útil quanto ao jogo, nos piores casos.

No entanto, há bons casos de (3) que para mim são modelares. Já referi o RQ2. A generalidade dos exemplos de jogo da gama desse jogo eram muito bons. Acompanhavam a exposição das regras, por isso não precisavam de notas explicativas de como a ficção ilustrava o sistema. Fora dos livros de jogo havia outra ficção de jogo sobre Glorantha razoável, mas não tão boa (Grizelda, etc.).

Quanto a (4), um exemplo recente e excelente é o thread da RPGnet «101 Days of MRQ II!»: https://forum.rpg.net/showthread.php?t=512391. É isto que eu gosto de ler em termos de narrativas de jogo.

Sérgio Mascarenhas