Muitos jogadores de RPG desprezam o PBeM por considerá-lo apenas um subterfúgio utilizado para se distrair naquelas longas horas de trabalho. Ou então acreditam que o jogo é chato e sem graça, não percebendo como é possível que ao ler um E-Mail se consiga a mesma emoção de um jogo de mesa.
Posso afirmar com toda a certeza de que esta é uma opinião completamente errada e que um jogo de PBeM pode ser tão ou mais divertido quanto um jogo de mesa, mesmo que na maioria das vezes tal não aconteça.
Aliás, o grande problema de um jogo de PBeM, é que a maioria dos jogadores não consegue perceber que jogar por PBeM é bastante diferente de jogar numa mesa. Para todos é bastante claro o que esperar de um jogo de Forgotten Realms quando ligam o PlayStation e começa a jogar, da mesma forma que é bastante claro que as emoções que vão ter ao jogá-lo, apesar de não serem menores nem maiores do que as de um jogo de mesa, serão bem diferentes.
Há uma percepção clara do que um jogo de RPG transposto para o vídeo pode fazer e o que se esperar dele, entretanto não há esta mesma percepção do PBeM e a maioria dos jogadores e mestres acreditam que o PBeM deve ser jogado tal e qual uma mesa de jogo e o próprio jogo deve ser igual.
- Pensar que PBeM é o mesmo que RPG de mesa é a primeira grande falha da maioria dos jogos de PBeM.
Imaginem uma cena clássica de um jogo de mesa: a dungeon. Uma dungeon simples tem vinte ou trinta salas, várias delas com nada mas todas parecendo que tem algo de importante.
Num jogo de mesa o mestre pode a vontade brincar com a dungeon pois há tempo e velocidade para isto. Ele pode fazer com que os PCs percam tempo na exploração e fingir detalhes, deixar que passem situações para voltar a elas mais tarde, etc…
Num PBeM uma resposta pode demorar uma semana para chegar. Um mestre que tenha desenhado uma linda dungeon com centenas de segredos, que funcionaria lindamente num jogo de mesa, e queria transpô-la para o PBeM, provavelmente vai conseguir criar um tamanho desinteresse em todos os jogadores logo de início que com três turnos o jogo acabará.
Não quero dizer com isso que o PBeM não pode ter dungeons, só que a narrativa tem que se transformada de maneira a funcionar bem com o método de jogo. Por exemplo o mestre poderia deixar os PCs entrarem numa sala e enfrentarem um zumbi para descobrirem que não havia ali nada de importante e depois dizer que eles passaram por várias outras até encontrar uma sala dourada com um pedestal de ouro maciço ao centro que parece ser o local onde está guardada a “Chave das Tempestades” que eles tanto procuram.
Enquanto na mesa a dungeon seria o ponto central da aventura, no PBeM era passou apenas a ser um pano de fundo, ou seja, houve uma adaptação para que o jogo fluísse de forma a divertir a todos. Não se esqueça que num PBeM só para mestrar estes dois encontros da dungeon, levaríamos um mês ou mais.
- Querer jogar PBeM com um tipo de narrativa não adequada ao estilo de jogo é a segunda grande falha dos jogos de PBeM.
Imaginem agora que vocês jogam RPG de mesa e se reúnem para jogar aos sábados à tarde. No primeiro sábado o João se atrasa e o mestre espera três horas para começar o jogo. No segundo sábado a Rita não vai e o mestre resolve cancelar o jogo. No terceiro sábado de novo o João se atrasa, desta vez quatro horas, e vocês ficam ali a espera sentados na praça de alimentação do Colombo. Eu garanto que no quinto sábado dois dos membros do grupo já terão desistido de jogar e no sexto acaba a campanha de vez.
O mesmo acontece com o PBeM. Os mestres costumam sempre ter jogadores rápidos e lentos, interessados e desinteressados, que criam oportunidade e que são apenas seguidores. Permitir que o ritmo do PBeM seja marcado pelos desinteressados e pelos seguidores é o mesmo que decretar o fim do PBeM. Um jogador pode responder quase na hora que o mestre manda um E-Mail enquanto outro pode levar uma semana. Qual a motivação para este que responde na hora se o mestre espera uma semana pela responda do outro jogador?
Quando se viaja no Intercidades, de Lisboa ao Porto, pode-se perfeitamente descer do comboio em Coimbra para comprar uma revista mas se não estivermos de volta no momento em que o comboio for partir, o maquinista não pensará duas vezes em deixar-nos na estação. O mestre é o maquinista do PBeM e deve sempre obrigar o PBeM a seguir em frente sede forma que aqueles que estão lá dentro não sejam prejudicados por aqueles que estão a comprar revistas.
Isto não quer dizer que o mestre deva ser obrigar todos a correrem como loucos pois os dois extremos são ruins. Se o comboio chega adiantado a uma estação ele espera até chegar a hora certa para continuar, pois não é justo que alguém que tenha comprado um bilhete para as 14:30 perca o comboio por que ele chegou as 14:00. No PBeM não pode haver overbooking.
O mestre do PBeM deve marcar um tempo máximo para resposta. Digamos que seja de três dias, por exemplo. Se toda a gente tiver respondido até aí então ele pode responder antes e passar para o turno seguinte, se não quem não tiver respondido perde a vez sem direito a reclamações posteriores.
- Permitir que o ritmo do PBeM seja ditado pelos jogadores lentos e desinteressados é a terceira grande falha da maioria dos jogos de PBeM.
Vamos agora olhar para uma mesa de RPG. Num jogo típico o mestre fala, rola as iniciativas, permite que o primeiro jogador fale, depois que o segundo fale, e assim por diante. Imaginem que o João fala ao mesmo tempo que o Telmo. Que o Marcos diga apenas “fui” e que a Maria esteja a dizer que vai entrar na sala da esquerda quando o grupo já há meia hora que entrou nela e já está em outro local. A confusão será tão grande que ninguém vai se entender e logo vão estar todos sem vontade de jogar.
O PBeM é assim. Há dezenas de técnicas para se organizar o PBeM mas a maioria das pessoas que jogam simplesmente se esquecem disso ou acreditam que tal não é importante. É muito comum que alguém envie um E-Mail de resposta a um turno com uma linha apenas a dizer, por exemplo: “olho a minha volta”. Imaginem que ele foi de férias e o último E-Mail que leu foi três turnos atrás: “olho a minha volta” tem a ver com uma sala que o grupo nem mesmo se encontra. Mensagens sem contexto são um exemplo de desorganização do PBeM.
O mesmo acontece com falas que não são diferenciadas de acções ou pensamentos. Imagine que o jogador que dizer que seu personagem pensou “Raistlin é um cabrão” mas simplesmente escreve isto no E-Mail. O jogador de Raistlin vai ler aquilo e achar que o personagem falou aquilo e vai invocar sua Death Spell em cima de Tanis por causa de uma linha mal escrita. O pior de tudo é que o jogador de Tanis ainda vai para cima do mestre por que acha que a atitude do jogador do Raistlin foi um “mau roleplaying” por aquilo que foi só um pensamento.
Isto é muito comum num jogo de PBeM. Tem que haver regras claras quando a estrutura de uma mensagem de PBeM para que não haja acções. Quem é a personagem que está a pensar, fazer ou falar. Se há um “offtopic”. Tudo tem que ser muito claro.
- Permitir mensagens desestruturadas é a quarta grande falha da maioria dos Jogos de PBeM.
Por último mas não menos importante está a evolução das personagens. Enquanto num jogo de D&D uma personagem pode ganhar algo como dez mil XP, num jogo de PBeM ele raramente vai ganhar mais do que cem. Por isso, enquanto se um jogador de mesa jogar um ano com um guerreiro vai tê-lo no nível cinco, um jogador de PBeM que jogue o mesmo tempo vai ter seu personagem ainda no primeiro nível. Tal, além de não ser justo, é altamente desmotivante para o jogador.
Eu já ouvi muitos mestres e mesmo muitos jogadores dizerem que o XP não é importante mas sim a interpretação. Como os americanos dizem: BULLSHIT!!! A interpretação é importante, mas a evolução dos personagens é altamente importante para manter a motivação do jogo, principalmente quando se pretende uma campanha longa.
Num PBeM que jogo de Wherewolf tivemos que recriar as regras de custos de XP para que os personagens evoluíssem e foi claro o efeito motivador que conseguimos quando os jogadores começaram a perceber que seus personagens evoluíam e que já era possível adquirir uma novo dom, ou aumentar uma perícia.
Numa campanha curta adaptar as regras de XP pode passar despercebida por que a campanha terminará antes de haver evolução, mas se o mestre quiser manter uma campanha a prazo, repensar a forma como os personagens evoluirão é essencial.
- Não repensar as regras de gastos e ganhos de XPs é a quinta grande falha da maioria dos jogos de PBeM.
Já agora vou tocar num assunto que para mim deveria ser óbvio. Em quase todos os sistemas de RPG se toca no assunto das regras. É normal inclusive dar o exemplo da brincadeira de crianças de polícia e ladrão, ou mesmo de cowboys e índios, em que um dos menidos grita “Atirei! Você morreu!” e o outro diz “Não! Você errou o tiro!”, criando um grande impasse.
Para mim é óbvio que um jogo tenha regras. E que o RPG, como o próprio nome Role Playing Game, ou Jogo de Representação, já diz, é um jogo e precisa de regras para ser jogado. O PBeM significa Play By E-Mail, ou seja, Jogar por E-Maill, e para ser jogado precisa de regras, sejam elas de qual sistema for. GURPS, D20, CoC, ou mesmo um sistema criado pelo mestre, é preciso haver regras de alguma forma.
Se houver um PBeM sem mestre, bem, pode ser qualquer coisa mas não é um PBeM. Se houver um PBeM sem regras, bem, pode ser qualquer coisa mas não é um PBeM. Eu já vi muita gente tentar contar histórias colectivas a dizer que isto é jogar PBeM. Não é.
Não posso dizer que esta é uma das grandes falhas de um PBeM por que tentar jogar sem regras não existe…
Vou ver se em breve coloco neste site algumas regras e métodos de como organizar mensagens de PBeM.