As Cinco Grandes Falhas (normalmente praticadas em) um Jogo de PBeM

Jogando PBeM

Muitos jogadores de RPG desprezam o PBeM por considerá-lo apenas um subterfúgio utilizado para se distrair naquelas longas horas de trabalho. Ou então acreditam que o jogo é chato e sem graça, não percebendo como é possível que ao ler um  E-Mail se consiga a mesma emoção de um jogo de mesa.

Posso afirmar com toda a certeza de que esta é uma opinião completamente errada e que um jogo de PBeM pode ser tão ou mais divertido quanto um jogo de mesa, mesmo que na maioria das vezes tal não aconteça.

Aliás, o grande problema de um jogo de PBeM, é que a maioria dos jogadores não consegue perceber que jogar por PBeM é bastante diferente de jogar numa mesa. Para todos é bastante claro o que esperar de um jogo de Forgotten Realms quando ligam o PlayStation e começa a jogar, da mesma forma que é bastante claro que as emoções que vão ter ao jogá-lo, apesar de não serem menores nem maiores do que as de um jogo de mesa, serão bem diferentes.

Há uma percepção clara do que um jogo de RPG transposto para o vídeo pode fazer e o que se esperar dele, entretanto não há esta mesma percepção do PBeM e a maioria dos jogadores e mestres acreditam que o PBeM deve ser jogado tal e qual uma mesa de jogo e o próprio jogo deve ser igual.

  • Pensar que  PBeM é o mesmo que RPG de mesa é a primeira grande falha da maioria dos jogos de PBeM.

Imaginem uma cena clássica de um jogo de mesa: a dungeon. Uma dungeon simples tem vinte ou trinta salas, várias delas com nada mas todas parecendo que tem algo de importante.

Num jogo de mesa o mestre pode a vontade brincar com a dungeon pois há tempo e velocidade para isto. Ele pode fazer com que os PCs percam tempo na exploração e fingir detalhes, deixar que passem situações para voltar a elas mais tarde, etc…

Num PBeM uma resposta pode demorar uma semana para chegar. Um mestre que tenha desenhado uma linda dungeon com centenas de segredos, que funcionaria lindamente num jogo de mesa, e queria transpô-la para o PBeM, provavelmente vai conseguir criar um tamanho desinteresse em todos os jogadores logo de início que com três turnos o jogo acabará.

Não quero dizer com isso que o PBeM não pode ter dungeons, só que a narrativa tem que se transformada de maneira a funcionar bem com o método de jogo. Por exemplo o mestre poderia deixar os PCs entrarem numa sala e enfrentarem um zumbi para descobrirem que não havia ali nada de importante e depois dizer que eles passaram por várias outras até encontrar uma sala dourada com um pedestal de ouro maciço ao centro que parece ser o local onde está guardada a “Chave das Tempestades” que eles tanto procuram.

Enquanto na mesa a dungeon seria o ponto central da aventura, no PBeM era passou apenas a ser um pano de fundo, ou seja, houve uma adaptação para que o jogo fluísse de forma a divertir a todos. Não se esqueça que num PBeM só para mestrar estes dois encontros da dungeon, levaríamos um mês ou mais.

  • Querer jogar PBeM com um tipo de narrativa não adequada ao estilo de jogo é a segunda grande falha dos jogos de PBeM.

Imaginem agora que vocês jogam RPG de mesa e se reúnem para jogar aos sábados à tarde. No primeiro sábado o João se atrasa e o mestre espera três horas para começar o jogo. No segundo sábado a Rita não vai e o mestre resolve cancelar o jogo. No terceiro sábado de novo o João se atrasa, desta vez quatro horas, e vocês ficam ali a espera sentados na praça de alimentação do Colombo. Eu garanto que no quinto sábado dois dos membros do grupo já terão desistido de jogar e no sexto acaba a campanha de vez.

O mesmo acontece com o PBeM. Os mestres costumam sempre ter jogadores rápidos e lentos, interessados e desinteressados, que criam oportunidade e que são apenas seguidores. Permitir que o ritmo do PBeM seja marcado pelos desinteressados e pelos seguidores é o mesmo que decretar o fim do PBeM. Um jogador pode responder quase na hora que o mestre manda um E-Mail enquanto outro pode levar uma semana. Qual a motivação para este que responde na hora se o mestre espera uma semana pela responda do outro jogador?

Quando se viaja no Intercidades, de Lisboa ao Porto, pode-se perfeitamente descer do comboio em Coimbra para comprar uma revista mas se não estivermos de volta no momento em que o comboio for partir, o maquinista não pensará duas vezes em deixar-nos na estação. O mestre é o maquinista do PBeM e deve sempre obrigar o PBeM a seguir em frente sede forma que aqueles que estão lá dentro não sejam prejudicados por aqueles que estão a comprar revistas.

Isto não quer dizer que o mestre deva ser obrigar todos a correrem como loucos pois os dois extremos são ruins. Se o comboio chega adiantado a uma estação ele espera até chegar a hora certa para continuar, pois não é justo que alguém que tenha comprado um bilhete para as 14:30 perca o comboio por que ele chegou as 14:00. No PBeM não pode haver overbooking.

O mestre do PBeM deve marcar um tempo máximo para resposta. Digamos que seja de três dias, por exemplo. Se toda a gente tiver respondido até aí então ele pode responder antes e passar para o turno seguinte, se não quem não tiver respondido perde a vez sem direito a reclamações posteriores.

  • Permitir que o ritmo do PBeM seja ditado pelos jogadores lentos e desinteressados é a terceira grande falha da maioria dos jogos de PBeM.

Vamos agora olhar para uma mesa de RPG. Num jogo típico o mestre fala, rola as iniciativas, permite que o primeiro jogador fale, depois que o segundo fale, e assim por diante. Imaginem que o João fala ao mesmo tempo que o Telmo. Que o Marcos diga apenas “fui” e que a Maria esteja a dizer que vai entrar na sala da esquerda quando o grupo já há meia hora que entrou nela e já está em outro local. A confusão será tão grande que ninguém vai se entender e logo vão estar todos sem vontade de jogar.

O PBeM é assim. Há dezenas de técnicas para se organizar o PBeM mas a maioria das pessoas que jogam simplesmente se esquecem disso ou acreditam que tal não é importante. É muito comum que alguém envie um E-Mail de resposta a um turno com uma linha apenas a dizer, por exemplo: “olho a minha volta”. Imaginem que ele foi de férias e o último E-Mail que leu foi três turnos atrás: “olho a minha volta” tem a ver com uma sala que o grupo nem mesmo se encontra. Mensagens sem contexto são um exemplo de desorganização do PBeM.

O mesmo acontece com falas que não são diferenciadas de acções ou pensamentos. Imagine que o jogador que dizer que seu personagem pensou “Raistlin é um cabrão” mas simplesmente escreve isto no E-Mail. O jogador de Raistlin vai ler aquilo e achar que o personagem falou aquilo e vai invocar sua Death Spell em cima de Tanis por causa de uma linha mal escrita. O pior de tudo é que o jogador de Tanis ainda vai para cima do mestre por que acha que a atitude do jogador do Raistlin foi um “mau roleplaying” por aquilo que foi só um pensamento.

Isto é muito comum num jogo de PBeM. Tem que haver regras claras quando a estrutura de uma mensagem de PBeM para que não haja acções. Quem é a personagem que está a pensar, fazer ou falar. Se há um “offtopic”. Tudo tem que ser muito claro.

  • Permitir mensagens desestruturadas é a quarta grande falha da maioria dos Jogos de PBeM.

Por último mas não menos importante está a evolução das personagens. Enquanto num jogo de D&D uma personagem pode ganhar algo como dez mil XP, num jogo de PBeM ele raramente vai ganhar mais do que cem. Por isso, enquanto se um jogador de mesa jogar um ano com um guerreiro vai tê-lo no nível cinco, um jogador de PBeM que jogue o mesmo tempo vai ter seu personagem ainda no primeiro nível. Tal, além de não ser justo, é altamente desmotivante para o jogador.

Eu já ouvi muitos mestres e mesmo muitos jogadores dizerem que o XP não é importante mas sim a interpretação. Como os americanos dizem: BULLSHIT!!! A interpretação é importante, mas a evolução dos personagens é altamente importante para manter a motivação do jogo, principalmente quando se pretende uma campanha longa.

Num PBeM que jogo de Wherewolf tivemos que recriar as regras de custos de XP para que os personagens evoluíssem e foi claro o efeito motivador que conseguimos quando os jogadores começaram a perceber que seus personagens evoluíam e que já era possível adquirir uma novo dom, ou aumentar uma perícia.

Numa campanha curta adaptar as regras de XP pode passar despercebida por que a campanha terminará antes de haver evolução, mas se o mestre quiser manter uma campanha a prazo, repensar a forma como os personagens evoluirão é essencial.

  • Não repensar as regras de gastos e ganhos de XPs é a quinta grande falha da maioria dos jogos de PBeM.

Já agora vou tocar num assunto que para mim deveria ser óbvio. Em quase todos os sistemas de RPG se toca no assunto das regras. É normal inclusive dar o exemplo da brincadeira de crianças de polícia e ladrão, ou mesmo de cowboys e índios, em que um dos menidos grita “Atirei! Você morreu!” e o outro diz “Não! Você errou o tiro!”, criando um grande impasse.

Para mim é óbvio que um jogo tenha regras. E que o RPG, como o próprio nome Role Playing Game, ou Jogo de Representação, já diz, é um jogo e precisa de regras para ser jogado. O PBeM significa Play By E-Mail, ou seja, Jogar por E-Maill, e para ser jogado precisa de regras, sejam elas de qual sistema for. GURPS, D20, CoC, ou mesmo um sistema criado pelo mestre, é preciso haver regras de alguma forma.

Se houver um PBeM sem mestre, bem, pode ser qualquer coisa mas não é um PBeM. Se houver um PBeM sem regras, bem, pode ser qualquer coisa mas não é um PBeM. Eu já vi muita gente tentar contar histórias colectivas a dizer que isto é jogar PBeM. Não é.

Não posso dizer que esta é uma das grandes falhas de um PBeM por que tentar jogar sem regras não existe…

Vou ver se em breve coloco neste site algumas regras e métodos de como organizar mensagens de PBeM.

Ufa, trabalhei Sábado e Domingo só agora é que consegui um tempinho para me sentar e ler este artigo com a calma que ele merece. Sim senhor; gostei muito, Eduardo! Há ali um ponto ou outro com o qual não concordo a 100% (depois elaboro), mas é sem dúvida um artigo que deveria ser de leitura obrigatória para qualquer organizador de um PBeM. Obrigado por partilhares!

Ah, e ia-me esquecendo de mencionar isto... Quando li o título do teu artigo, "As cinco grandes falhas de um PBeM" fiquei com a ideia de que ias deitar abaixo o PBeM como forma de fazer roleplay. Afinal não é nada disso. Não ficaria melhor um título como "as cinco falhas mais comuns de um PBeM" ou "os cinco erros mais comuns de um mestre de PBeM"?

[quote=efernandes]Eu já ouvi muitos mestres e mesmo muitos jogadores dizerem que o XP não é importante mas sim a interpretação. Como os americanos dizem: BULLSHIT!!! A interpretação é importante, mas a evolução dos personagens é altamente importante para manter a motivação do jogo, principalmente quando se pretende uma campanha longa.[/quote]

Eu percebo o que estás a dizer, mas também percebo o que os tais mestres e jogadores querem dizer; aliás, se estamos a falar dos típicos XPs à la D&D e quase todos os jogos que o seguiram, eu próprio repetiria a opinião desses jogadores dizendo que os XPs e Evolução do Personagem não me interessam… bom, não muito, pelo menos. Se o jogo fosse D&D, sim, eu aí quereria muitos XPs para tornar o meu personagem mais eficaz - porque é esse o objectivo num típico jogo de D&D, superar desafios cada vez maiores. Já se o jogo fosse a típica campanha de Kult do Miguel, que gira à volta de resolver mistérios, lidar com situações pessoais intensas, aí já não tenho qualquer uso para XPs… nem eu nem a maioria dos jogadores dele, tanto que o Miguel já se habituou a deixar-nos criar personagens com os pontos extra que acharmos que precisamos e depois não nos dar qualquer XP durante o jogo.

No entanto, acho que estas duas visões diferentes podem ser conjugadas numa só que representa os interesses de ambas ao mesmo tempo. Em vez de falarmos especificamente de XPs, vamos falar de "recompensas" em termos gerais. Aí sim; se na campanha de D&D do João Pedro eu quero XPs como recompensa, já na campanha de Kult do Miguel acho os XPs inúteis e gostaria de receber como recompensa por um trabalho bem feito algo que me ajudasse direccionar in-game a história para os assuntos que eu acho mais intensos.

Daí que eu teria escrito a a tua frase como "as recompensas são importantes para manter a motivação". Os XPs e consequente Evolução do Personagem, embora sejam o mecanismo de recompensa em quase todos os jogos, muitas vezes não servem para fazer nada que jogador realmente quer, dando origem aos tais comentários sobre XPs não serem importantes.

Para terminar...

[quote=efernandes]Se houver um PBeM sem mestre, bem, pode ser qualquer coisa mas não é um PBeM. Se houver um PBeM sem regras, bem, pode ser qualquer coisa mas não é um PBeM. Eu já vi muita gente tentar contar histórias colectivas a dizer que isto é jogar PBeM. Não é.[/quote]

Bom, eu aqui vou ser picuinhas ouitra vez... Não há jogos sem regras, nisso tens completa e absoluta razão. O que acho que falta clarificar é que esses jogos de cowboys & índios e esses tais esforços de storytelling colaborativo também têm regras. Têm sempre regras. O que acontece é que muitas vezes estas regras são invisíveis, pois não estão escritas nem ensinadas em nenhum lado. Os próprios participantes dizem que não há regras, mas elas existem... algures.

Num storytelling colaborativo, por exemplo, há sempre formas de filtrar conteúdo indesejado: o participante cujo estilo não está de acordo com as guidelines inconscientes que o resto do grupo usa como regras não tarda muito a ser expulso, ou a desistir por falta de interesse nas suas ideias ou feedback negativo, ou a converter-se através de um processo de tentativa & erro à mentalidade do grupo.

No fundo não é assim tão diferente do que acontece nos nossos grupos de RPG. Toda a gente joga usando o mesmo livro de regras, só que essas são normalmente tão inconsistentes (no sentido em que permitem abordagens incompatíveis e contraditórias ao mesmo jogo) que a sua implementação varia imenso conforme a pessoa que as interpreta. Daí que haja muitos jogadores que andam por aí a passar de grupo em grupo, até finalmente encontrarem pessoas que partilham as mesmas convicções.

Assim, eu teria descrito este problema como sendo "uma falha de deixar vísiveis e claras as regras", em vez de "uma falha por inexistência de regras". As regras estão sempre lá, mas se estão invísiveis e guardadas num canto escuro da mente dos organizadores do jogo que as podem mudar sempre que lhe apetecer sem dar satisfações a ninguém porque ninguém sabe quais elas são, o jogador arrica-se a uma viagem bem complicada e pouco produtiva.

Bem, eu ia responder a esse ponto também, mas agora só me resta assinar por baixo.

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Sim! Tens toda a razão... vou mudar o título para que seja melhor compreendido. 

Wel... tem piada teres mencionado Kult. Um dos meus RPGs preferidos é Call of Cthulhu e ele se enquadra no mesmo estilo: "Coisas que o homem não deveria conhecer" e "o horror de se descobrir que não somos capazes de enfrentar um destino pior do que a morte que virá pela nossa frente".

Quando eu falei em XPs como factor de motivação eu estava específicamente a falar em campanhas longas e muito longas, como a que estou a jogar em PBeM que já dura quase quatro anos. Os jogos do tipo Kult/CoC são muito específicos e normalmente são utilizados como aventuras solo ou então em curtas campanhas.

Como tu mesmo dissestes o autor destes livros previu que o XP não seria muito eficaz neste caso e pôs formas do personagem evoluir de forma paralela: as magias no caso do CoC e qualquer outra coisa semelhante no caso do Kult. Entretanto no caso do meu post eu estava a falar especificamente em PONTOS DE EXPERIÊNCIA e não em RECOMPENSAS.

Todo o mestre recompensa os PCs de alguma forma. Ou ele permite que eles encontrem uma espada +1 após matarem um monstro chave da campanha, ou lhes dá dinheiro para comprar uma splint mail, ou lhe dá uma magia, ou o que quer que seja. As recompensas não servem para emprenhar o jogador a longo prazo por que elas são PRESENTES do mestre.

Nenhum jogador pensa: "vou obrigar meu personagem a lutar somente com facas durante as próximas dez aventuras para que ele se torne um especialista nesta arma" se o mestre se preocupa com recompensas e não XPs. Quando o PC recebe XPs seu jogador consegue pensá-lo a longo prazo, ou seja, imaginá-lo como alguém que daqui a um ano terá as disciplinas POTÊNCIA e PRESENÇA a nível 3. Nenhum jogador pode pensar: "Daqui a um ano, se calhar, vou ter encontrado uma espada +1 no covil do monstro...

Neste aspecto reside uma das principais vantagens do XP. Ele ajuda a manter a motivação pois o jogador consegue se imaginar no futuro. Convenhamos: a faculdade é uma grande seca... nós só aguentamos aqueles professores chatos e todos aqueles trabalhos pois tinhamos em mente que um dia iríamos nos formar e conseguir um emprego X com um salário 3X (não que isso seja verdade :-) O mesmo funciona nas grandes campanhas... uma boa história é ESSENCIAL mas a motivação do XP e da visualização do personagem no futuro é também muito importante.

Mas notem que o que eu disse foi baseado na minha experiência... em nehum momento estou a me dizer como dono da verdade. 

"Num storytelling colaborativo, por exemplo, há sempre formas de filtrar conteúdo indesejado"

Usastes muito bem o termo storytelling, ou seja, uma história. Eu já fiz parte de histórias colectivas e até achei divertido... a minha grande questão é: elas são PBeM? Na minha opinião não.

O PBeM vêm do RPG. É uma forma de jogar RPG. Então têm que obedecer as mesmas regras do RPG. Quando eu li a Manopla de Karastan do Filipe Faria eu tive a nítida impressão que o autor estava a escrever aquilo que aconteceu durante uma campanha de AD&D. Entretanto, por mais que ele esteja a contar uma história baseada num jogo de RPG, o acto dele escrever não é jogar RPG.

Se escrever histórias sozinhas não é jogar RPG, então por que escrever história colectivas é?  

[quote=efernandes]Se escrever histórias sozinhas não é jogar RPG, então por que escrever história colectivas é?[/quote]

E porque é que não seriam, tanto a escrita solitária como a colectiva? Não seria todo e qualquer caso, obviamente, mas pelo menos em certos formatos em que os autores assumem e se identificam intimamente com os personagens/narradores da história. Tanto a sós como grupo, em qualquer uma das versões os participantes controlam personagens bem identificados e decidem as suas acções, falas e pensamentos, sendo que no formato colectivo há regras/procedimentos para os casos em que um participante precisa de interagir com algo que pertence ao domínio de outro. A única diferença básica entre isso e um RPG tradicional da velha guarda é que os poderes do GM se encontram distribuídos pelos participantes, tendo estes controlo significativo sobre a trama, setting, NPCs, etc.

Acho que se fossemos perguntar aos milhares e milhares de pessoas por essa internet fora que se juntam para fazer Roleplay, ou Sim, ou o que for que lhe chamam, de Harry Potter, ou Buffy, ou Star Trek, ou que for, a razão pela qual o fazem e pela qual o acham tão divertido, as razões deles seriam bastante semelhantes às de um roleplayer tradicional: escapismo, a capacidade de se transformar durante algum tempo em alguém diferente que vive num mundo diferente.

Bom, obviamente que isto é uma discussão muito mais complexa, mas pronto. Eu cá do meu ponto de vista isto não vejo isto como algo fundamentalmente diferente de um RPG; é apenas algo diferente… de um RPG tradicional, bem entendido. Isto porque se estivermos a falar de RPGs como Universalis, PTA, The Window, Polaris, etc, então aí a diferença pode ser nula ou quase. É claro que também há quem não considere os jogos que citei como RPGs, mas pela experiência que tenho, e desde que a minha jogadora mais dedicada bradou aos céus que a sua personagem de PTA foi a personagem mais memóravel que jogou, para mim não há dúvidas que são de facto jogos de roleplay.

Mas pronto… se merece o título de RPG ou não, também não é o importante. O importante é a malta divertir-se e fazer o que mais gosta! :wink:

Bom, cá para mim merecer o título é mais importante em competições desportivas, mas como se está a discutir esta questão dos RPG tradicionais vs outra coisa qualquer, eu, enquanto defensor aguerrido da velha guarda não posso abster-me de comentar! A verdade é que depois de ter lido e ouvido tantas discussões sobre isto, a única conclusão a que cheguei é que continuo com a mesma opinião que tinha no princípio: estes novos RPGs não são propriamente RPGs. Mas isso não é necessariamente mau - como até o próprio Ric indicia no post anterior, o que interessa é que quem joga se divirta. Eu não gosto de jogos de tabuleiro, por isso não os jogo, eu gosto de RPGs (vamos chamar-lhe tradicionais) por isso jogo-os e, até aqui, nenhuma das novidades me seduziu, portanto continuo a preferir o tradicional. A verdade é que estas novas propostas se afastaram tanto do conceito habitual do RPG tradicional que poderão ter criado um género próprio ou, pelo menos, um sub-género. Pelo menos é a minha opinião - e não é depreciativa… E já agora, a propósito dos XPs e recompensas anteriomente discutidos neste tópico. Por norma não ligo muito aos XPs (ou seja lá como eles se chamem no jogo em causa) e prefiro dar aos jogadores a hipótese de abusarem dos pontos iniciais de criação de personagem para além do sugerido pelas regras, para que possam fazer aquilo que querem fazer desde o início. Afinal é mais realista do que - só para dar um exemplo - o sistema White Wolf. Se formos a seguir a sugestão deles, os personagens começam a campanha como adolescentes imberbes (em termos de capacidades, porque até podem ser velhos de 70 anos…) e, em algumas sessões de jogo, aumentam exponencialmente as suas habilidades. Qual é a lógica? Viveram escondidos num armário a vida toda e, de repente, descobriram o mundo? Talvez em Vampire isso tivesse alguma lógica (o treino dos Neonates e tal…), mas em outros jogos… Duvido… De qualquer modo há utilizações muito mais criativas dos XPs do que simplesmente aumentar skills e atributos. Por exemplo, equilibrar o Mental Balance em Kult para evitar cair no abismo da loucura (para quem não quer cair no abismo da loucura, é claro). E melhor do que isso, a intervenção social, possível em jogos como Underground e a/state, uma utilização brilhante (tenho que o sublinhar novamente, BRILHANTE) dos XPs em acções directas dos personagens sobre o meio em que vivem (obviamente o dispêndio de XPs nestes casos não é a acção por si próprio, mas a manifestação em termos de regras de algo que já foi feito em jogo).

Só para dizer mesmo que não concordo nada com isso.

Mas acho que passa muito por uma questão de gostos.

Especialmente quando falas de XP como mecanismo de evolução das personagens. Essa mesma evolução não é de todo necessária, como outras pessoas já falaram em vários posts por aqui nesta thread e até vai contra as minhas preferências pessoais na maioria dos casos (curto uma evolução 100% baseada e dependente apenas do que os personagens fazem, as in, se treinarem podem ficar melhores naquilo q treinam mas não fazem outras coisas, se fizerem outras coisas podem perder os beneficios do treino, etc).

Quanto à parte das recompensas também não concordo. Nem todos os GM's fazem isso e, mais uma vez, até vai contra os meus gostos. O GM não dá uma espada +1, dinheiro ou acesso a magia. Os personagens se quiserem é que tentam encontrar uma espada +1, fazem algo para ganhar dinheiro ou aprender magia. Se não fazem nada nesse sentido não esperem recebê-lo como recompensa por fazerem outras coisas que não tenham nada a ver.

Simplesmente, por muitos e grandes monstros que matem, não vão encontrar nenhuma espada +1 a menos que fizesse sentido para o monstro e para o mundo realmente o monstro ter uma na sua posse. Quem quer fazer dinheiro não vai para aventureiro, vai para comerciante, etc. Se querem aprender magia, em vez de andarem a passear pelo mundo vão para uma guilda aprender ou então tornam-se aprendizes de algum mago. Esse tipo de coisas.

Assim não vejo qualquer problema em um personagem pensar "daqui a x tempo vou ter uma espada +1 e depois....", da mesma forma que qualquer pessoa pode pensar "daqui a x tempo vou comprar um computador novo ou um carro novo ou uma casa nova, whatever". Não há cá presentes para ninguém, há aquilo para que cada um trabalhar em jogo.

Por outro lado eu sou aquele gajo que quando vai para um curso não é a pensar no emprego nem em ordenados mas sim a pensar em aprender alguma coisa que lhe interessa aprender! ;)

Acho que a maior parte dos jogadores que conheço ou até mesmo a maior parte dos jogadores existentes deve concordar contigo. Felizmente isso não é o caso do ppl que joga comigo, e os que eram "evoluiram" (não no sentido de ficarem melhores, mas no sentido de uma alteração num certo sentido) no sentido de ficarem com gostos mais semelhantes aos meus! :)

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Não vou dizer que ninguém gosta de receber uma boa dose de XPs ou uma espada +1, mas, se é só por causa disso que se está a jogar, é preferível poupar trabalho e ir antes matar monstros no Diablo ou no Dungeon Siege.

Seja qual for a motivação, existem vários tipos de jogadores e vários tipos de jogos. O mérito dos RPGs "não tradicionais" é darem forma a essa motivação, é irem ao encontro do essencial. Nisso, o formato "tradicional" é um óptimo ponto de partida para esculpir o jogo que se pretende. Em inúmeros RPGs os designers já se perguntaram: "para que é que temos XPs nisto mesmo?" - ou então - "não faz mais sentido ser o jogador a descrever esta cena?".

Do que eu conheço, são os próprios defensores de RPGs "tradicionais" que, há medida que ganham experiência, acabam por fazer as suas próprias adaptações para tornar o jogo mais adequado a uma determinada cena, sessão ou grande campanha. É assim tão estranho haver mestres-jogo que querem comprar já feito? Ou jogadores que queiram ter um papel mais activo no sistema?

Creio que houve um desvio do tópico inicial...

Minha intenção nunca foi discutir se o mestre deve distribuir XP ou não, muito pelo contrário, eu já assumo que o mestre, como acontece em 99,9% dos casos, distribui XP aos seus jogadores. Eu estava a falar, MUITO ESPECIFICAMENTE, da aplicação do XP numa campanha de PBeM.

Vamos voltar ao tópico original, que tem a ver com as falhas que ocorrem normalmente nos PBeMs . Imaginem por exemplo que vocês estejam a jogar um PBeM e estejam a utilizar regras do WoD. Uma vez por mês vocês distribuem a cada jogador um número de pontos que pode variar de 1 a 5, sendo o normal 2 ou 3.

Numa campanha de mesa, normalmente, chega a haver cinco ou mais sessões durante um mês, o que significa que um jogador que esteja a jogar com um personagem WoD num jogo de mesa irá ganhar uma média de 2 ou 3 pontos por semana.

Enquanto num PBeM um jogador que jogue um ano irá ganhar uns 30XP (6 meses * 2XP) + (6 meses * 3XP), um jogador de mesa que jogue o mesmo período irá ganhar 150XP (30 sessões * 2XP) + (30 sessões * 3XP). Isto sendo que os dois jogaram um ano e foram igualmente presentes na campanha.

Logo ao fim de um ano, o personagem da mesa vai já ter uma série de disciplinas ou dons e já ter aumentado umas quantas perícias e atributos. O personagem do PBeM entretanto mal vai ter conseguido aumentar o que quer que seja no seu personagem.

O PBeM é um estilo de jogo que facilmente se torna desinteressante até por que não há contacto directo com outros jogadores. E o mestre precisa tomar providências para que os factores de desmotivação sejam mínimos, pelo menos naquilo que toca à campanha.

Ora. Como eu já disse apesar de não ser essencial a evolução do personagem é um factor altamente motivante para qualquer campanha e o mestre precisa REPENSAR a forma de distribuir ou utilizar XP para que a evolução no PBeM, por causa do factor TEMPO envolvido, seja eficaz.

Por exemplo no nosso caso, uma vez que usávamos o sistema WoOD, modificamos a tabela de gastos de XP. Ao invés das evoluções serem sempre custo vezes nivel, passamos a cobrar somente o custo. Ou seja, para um personagem evoluir sua disciplina potência de 2 para três, teria que pagar 14Xp, ou seja, 7 que é o custo da disciplina vezes o nível que já se tem. Nós alteramos a tabela de maneira que ele tivesse que pagar somente 7 o que reduz drásticamente o custo da evolução e já permite que um personagem de PBeM tenha uma evolução equiparada ao da mesa e que possa ser sentida pelo jogador.

É disso que eu tenho estado a falar. Não é chamada para este tópico, creio eu, a discussão dar ou não XP, é importante ou não XP. Eu estou de forma muito especificamente a falar num problema que ocorre no PBeM que é o personagem nunca evoluir pelas normas de distribuição e gasto de XP serem pensadas para uma campanha de mesa em que num período de tempo X há pelo menos 5 vezes mais distribuição de experiência do que há um PBeM.

Este é o primeiro ponto.

Agora em relação às regras também estamos a fugir drásticamente do assunto. Eu jogo PBeM como mestre e como jogador há seis ou sete anos. Já participei de histórias colectivas e já participei de jogos de PBeM com regras e de outros em que não havia ficha mas que era o mestre que decidia se o jogador conseguia ou não realizar uma acção.

O grande problema do primeiro, ou seja das histórias colectivas, é que era tudo caótico. Nunca havia por exemplo uma confrontação entre um jogador ou outro por que simplesmente não havia maneira de se decidir o que iria acontecer. Depois o que acabava por acontecer era que um dos jogadores assumir o papel de pseudo mestre conduzindo a história e deixando brechas que os outros pudessem seguir. Na minha opinião, e não tenho problema em dizer aqui, isto não é um jogo de RPG apesar de poder ser divertido, da mesma forma que os livros Aventuras Fantásticas não são RPG mesmo que tenha sido baseado no RPG.

Não vou voltar a debater se isto deve ser considerado um PBeM ou que não deve mas vou dizer que este tipo de narrativa vai causar problemas a alguém que queira começar um PBeM no sentido real da palavra. Primeiro há o problema do tempo. Vai chegar uma hora em que ou esgotaram-se as idéias ou vai estar um caos e alguém vai ter que se levantar como se fosse um mestre para por ordem na casa. Eu não vejo sentido em se ter as desvantagens do mestre e nenhuma das vantagems que este traz para um jogo.

Depois há o factor motivação e nisto eu posso falar à vontade por que as listas em que se joga desta maneira está sempre a mudar de jogadores e é constante alguns desaparecerem simplesmente e entrarem novos do nada. É muito difícil, quase impossível, alguém permanecer um ano que seja activamente num jogo assim. E uma das razões por que escrevi este tópico foi para dar soluções baseadas na minha experiência para que não se cometam certas falhas, dentre elas  desmotivação e o abandono do PBeM.

Sinceramente toda a gente é livre para escolher a melhor forma de avançar com um PBeM mas, na minha humilde opinião, a hisória contada em grupos simplesmente não serve para quem quer fazer algo mais sério, não trará os resultado desejados e não é simplesmente PBeM. Note entrentando que esta é a minha opinião. 

O terceiro caso, jogos sem ficha decididos pelo mestre, nós podemos dizer que é realmente um PBeM pois há regras apesar das mesmas serem implícitas. Entretanto o grande problema que este jogo causa é a falta de motivação e liberdade de jogo.

Se um jogador não sabe exactamente o que seu personagem é capaz de fazer, como pode avançar para novas aventuras e buscar histórias por si próprio? Vai acabar por seguir sempre o que o mestre decidir e o todo mestre acaba por eventualmente ficar sem idéias. Uma campanha acaba sempre, com o tempo, por continuar baseada nos backgrounds dos jogadores e nas aventuras criadas por eles mesmos. Além diso há o problema do personagem não evoluir de forma sensível aos jogadores o que é desmotivante.

Uma boa solução para este caso é o mestre pedir para que os jogadores criem seus background através de uma história sem se importarem com as regras. Neste background eles descreveriam seus personagens, sua história, aparência, altos e baixos, pontos fortes e fracos. O mestre então criaria uma ficha a a daria ao jogador que teria a oportunidade de tentar modificar ou não a ficha. Um meio termo ao fim e ao cabo.

Entretanto, mesmo que se use um sistema muito simples, eu aconselho vivamente a utilização de regras de jogo no PBeM. O mais usado continua a ser o WoD mas o GURPS ocupa imediatamente a segunda posição. O sistema de evolução por níveis acaba por ser tornar o D20 menos eficaz no PBeM embora muito gente o use.

Para quem gosta de aprender coisas novas eu aconselho o FUDGE que além de ser gratuito, podendo seu download ser feito na página www.fudgerpg.com, funciona lindamente num PBeM pois é baseado em descrição e palavras e não em números. É um dos melhores sistemas que já joguei mas pode ser difícil para mestres de primeira viagem. Para jogadores não há problema.

Malta, o Eduardo tem toda a razão... o tópico já vai a milhares de quilómetros de distância do assunto principal. Quem tiver algo a acrescentar por favor cite o texto a que quer responder e abra um tópico novo no fórum, a menos que seja um comentário bem rápido e pouco importante.

Bom, e num perfeito exemplo de "façam o que eu digo e não façam o que eu faço", vou só encerrar a minha participação (pelo menos neste tópico) com dois comentários rápidos a um texto bastante longo...

[quote=efernandes](...) este tipo de narrativa vai causar problemas a alguém que queira começar um PBeM no sentido real da palavra. Primeiro há o problema do tempo. Vai chegar uma hora em que ou esgotaram-se as idéias ou vai estar um caos e alguém vai ter que se levantar como se fosse um mestre para por ordem na casa.[/quote]

Bom, quanto a isto só vou dizer que estás a partir do pressuposto que um roleplay mais colaborativo é sempre "um tudo ao molho e fé em Deus". A maioria dos RPGs não-tradicionais que mencionei mantém ordem & disciplina, estimula a inspiração, e promove um espírito colaborativo e/ou competitivo, exclusivamente através do uso das suas regras; deles, só o PTA usa um misto de regras e de um mestre. Funcionaram como PBeM tão bem (ou tão mal) como qualquer outro RPG criado para ser jogado à mesa.

[quote=efernandes]Se um jogador não sabe exactamente o que seu personagem é capaz de fazer, como pode avançar para novas aventuras e buscar histórias por si próprio? Vai acabar por seguir sempre o que o mestre decidir e o todo mestre acaba por eventualmente ficar sem idéias. Uma campanha acaba sempre, com o tempo, por continuar baseada nos backgrounds dos jogadores e nas aventuras criadas por eles mesmos. Além diso há o problema do personagem não evoluir de forma sensível aos jogadores o que é desmotivante.[/quote]

E aqui parece-me estás a partir do pressuposto que o jogador tem de influenciar o rumo dos eventos única e exclusivamente através das capacidades do seu personagem. Obviamente que precisa de ter um personagem minimamente definido, com pelo menos um hint um background, nisso tens toda a razão; uma história/aventura não nasce do nada, e não cresce sem ter um base para se alimentar. Mas se querias também dizer que um personagem precisa de ter atributos, ou habilidades, ou poderes, ou whatever, bem definidos numa escala de tipo numérico ou outro... quero que fique registado aqui nas actas desta discussão interessantíssima o meu protesto. Por exemplo: nos jogos que mencionei, se for colocado a um personagem um obstáculo, esse desafio é superado (ou não) recorrendo quase exclusivamente aos recursos que o jogador possui à disposição, em vez de a características intrínsecas do personagem definidas antes de o jogo começar. No máximo, se o personagem é conhecido por ter uma característica particularmente útil para superar aquele obstáculo é atribuído ao jogador um bónus para gastar.

Bem, o ric já contestou alguns pontos, eu vou contestar um outro que acho que sou o único com essa opinião aqui pelo site.

O que criticas na distribuição de XP's nos PBeM's para mim é uma das grandes vantagens que eles têm em relação ao tabletop. Uma evolução extremamente lenta!

Mais depressa faria (e fiz) o contrário, tornar a evolução bastante mais lenta num tabletop, do que torná-la mais rápida num PBeM.

Tudo questão de gostos do ppl que está a jogar.

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[B0rg]
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