"As Crónicas de Nardastinus - I"

Bom, esta secção parece ser o "parente pobre" do site no que toca a RPG, pois pouca gente lhe parece dar atenção. Mas como eu sou teimoso como uma mula, apetece-me espicaçar os ânimos!

Nos últimos dois meses temos corrido uma campanha de D&D na zona das Dalelans (Forgotten Realms). A cada sessão que passa, tento escrever a história da campanha sob a forma de Crónica seguida pelos olhos do meu personagem - um monge elfo iniciado como clérigo de Labelas Enoreth (deus da Sabedoria e do Tempo).

Pode ser que alguém por aqui aprecie a partilha de histórias de campanha... Smile

As Crónicas de Nardastinus – O Discípulo do Tempo (I)

 

A noite começa a cair enquanto o amplo grupo persegue o comando orc. A criatura está ferida, desorientada, e em fuga. O nosso grupo é grande, rápido e conta com batedores experientes. Rapidamente chegamos a uma caverna, na qual o orc se refugia. Os batedores notam uma entrada mais acima, e o grupo decide seguir por aí.

Não consigo parar de pensar no Irmão Arneson. Já passou uma semana e nem uma pista.

Não me vejo mais próximo do meu objectivo, e o tempo não parece estar do meu lado.Ao treparmos para a entrada oculta, perco o equilíbrio. Syriel olha-me, confusa.Tenho que me concentrar. O grupo é grande. Apesar de muitos terem tombado no confronto com os orcs, ainda restam nove ou dez. Avistamos luz na extensão da caverna. Enquanto os batedores – uma mulher de pele escura e um elfo arqueiro – testam o terreno, e preparam as cordas para descermos ao interior da gruta, eu flutuo solenemente. Aos poucos vamo-nos escondendo nas rochas que povoam a gruta. De súbito, um dos guerreiros escorrega pela corda. Tem uma gadanha enorme às costas.

Questiono-me, Labelas... Quem no seu perfeito juízo luta com arma tão estranha?

Quando os meus olhos acompanham a queda do humano, surpreendo-me. Ohalfling aproxima-se dele, e ambos desaparecem. A pequena criatura desperta-me a atenção. O seu potencial parece promissor. Devo segui-lo com atenção.O batedor élfico sinaliza ao restante grupo. Um bando de bugbears acompanhados de dire wolves aproxima-se de nós. Assumimos posições. Tento escalar as rochas, a fim de ganhar vantagem para surpreender os nossos adversários, mas uma vez mais os meus dedos traem-me. Fecho os olhos e abano a cabeça. Estou demasiado disperso. Nem preciso de abrir os olhos para sentir o olhar reprovador de Syriel.O combate inicia-se. Eu e Syriel ocupamo-nos dos dire wolves, enquanto os restantes membros unem esforços contra os bugbears. Ferido no orgulho pelas minhas falhas, lanço-me a um dos lobos. Novo erro. Devia parar e reflectir em vez de agir impulsivamente. A criatura supera-me facilmente, atirando-me aochão e deixando o meu ombro num estado lastimável. A agitação aumenta com o crescer do conflito. Vêm reforços a caminho, e o mago do grupo acaba de tombar.Respiro fundo. Se não conseguir ultrapassar esta inquietude coloco a minha vida em risco, e a de Syriel. Já para não falar que comprometo o destino do Irmão Arneson. Deixo sair o ar dos pulmões. Numa sucessão de movimentos fluidos lanço-me ao segundo lobo, do qual já Syriel se ocupa. Descarrego toda a fúria do Sábio do Ocaso num só golpe, e a vida da criatura cessa. Fixo o olhar em Syriel, como que a provar-lhe – de forma algo egoísta – que não tem quaisquer razões para duvidar da minha perícia.Uma vaga de goblins, gnolls e orcs associa-se aos bugbears, mas o grupo já engrenou, e facilmente tombam ao nosso redor. Paramos para respirar um pouco. Enquanto alguns companheiros tratam das feridas, aproximo-me do batedor elfo, que inicia uma rápida pesquisa pela grande gruta. Descubro o nome dele - Lore Swiftbow. Algo me soa a familiar, e insisto na conversa. Diz ser um explorador que vem à procura do pai.

É então, Labelas, que algo desperta no meu âmago. O batedor está a mentir. Reconheço o nome de família. O seu pai, um famoso artesão de arcos, imiscuiu-se em negócios obscuros com demónios, acabando por vir a morrer na sequência disso. Mantenho-me inexpressivo. Porque me estás a mentir, Lore Swiftbow?

Um grito provindo da entrada principal da caverna chama-nos a atenção. É Kinos, o halfling. No exterior, um dos guerreiros da nossa companhia jaz esmagado, e o cão do halfling desapareceu. Kinos quer sair de imediato em busca do cão, mas lanço-lhe um apelo para tratarmos primeiro de encontrar o orc que perseguimos, e prometo-lhe que depois disso procuraremos o seu cão.Descemos umas escadas naturais que nos levam aos confins da gruta. A luminosidade é inexistente. Pego na minha Ioun Stone e dou-lhe luz. Lore Swiftbow vai à frente, mas eu sigo-o de perto para lhe dar alguma visibilidade.

Parece-me que enquanto não tirar a limpo esta história não o deixarei afastar-se muito do meu alcance.

Imediatamente somos chamados a batalha, quando detectamos dois ogres no final da escadaria, junto a um lago subterrâneo. Kinos usa um bastão de luz para diminuir a total escuridão do local. Unimo-nos contra o primeiro ogre. Somos seis, e Kinos consegue cegá-lo com um dos seus feitiços. Infelizmente, Lore parece ter sido vítima do mesmo efeito. Com alguns golpes, Verenis – o homem da gadanha – acaba com a vida da criatura. Os restantes elementos movem-se de imediato para o segundo ogre, e enquanto Verenis limpa as entranhas do monstro que pendem da sua lâmina, eu sorrio-lhe pela franca demonstração de perícia com uma arma tão invulgar. Mas a face deste fica lívida no momento em que grita: “Gigante!”. Estou de costas para o lago subterrâneo, e apenas sinto uma pancada gigantesca a fazer-me tombar por terra. Luto internamente para não perder a consciência. Nunca senti tamanha dor. Ao meu lado cessa de rolar um pedregulho imenso. Cambaleio até junto do grupo que se ocupa do segundo ogre. Vejo mais companheiros caídos, sem vida. Tenho dificuldade em manter-me de pé. O meu braço esquerdo está a sangrar muito. Syriel está a bater-se com o ogre, tenho alguma dificuldade em entrar na dança letal, mas quando Lore se junta ao confronto, a atenção do monstro é reclamada. No momento em que se tenta lançar ao batedor, eu e Syriel estamos em perfeita sintonia. Saltamos em simultâneo, e quebramos o pescoço da criatura, que cai vencida, arrastando a gadanha de Verenis consigo.Os pedregulhos continuam a cair ao nosso redor. Ninguém consegue detectar a sua proveniência. Enquanto procuro abrigo entre as estalagmites da gruta, uso um pergaminho para tentar sarar as minhas feridas. Os pedregulhos não param de vir da escuridão. Estamos todos desorientados, sem saber o que enfrentamos, e quando um dos pedregulhos cai em cima de Kinos, temo o pior. O pequeno clérigo cai ao chão, esmagado pela rocha, e inconsciente.O tempo está claramente contra nós. Numa decisão relâmpago, alimentada pelo desespero, pego na Ioun Stone iluminada, e atiro-a às cegas, para a escuridão, enquanto corro em direcção a Kinos.

Agradecer-te-ei até à eternidade por teres guiado o meu arremesso, Senhor doContinuum, pois somente graças à sua precisão pudemos finalmente vislumbrar o responsável pela avalanche de pedras que parecia anunciar o nosso fim.

Usei um pergaminho para curar Kinos, mas este permaneceu inanimado. Quase desesperei. Seria demasiado tarde? Voltei a tentar, e o pequeno retomou a consciência.Lore Swiftbow e Verenis descarregaram todo o seu poder no gigante das montanhas. Fiquei surpreso ao ver Verenis lançar um raio de tal poder que forçou o gigante a gritar em agonia. Torna-se cada vez mais evidente que há bastante mais neste aparente camponês do que o que salta à vista...Restando apenas cinco guerreiros do grupo inicial, combinamos o nosso poder contra o monstro. Verenis usa a sua gadanha na perfeição, cortando um braço à criatura. Claramente com a sua vida a expirar, o gigante hesita – o tempo suficiente para Lore o aniquilar.Paramos uns segundos para tomar o fôlego, mas de imediato Lore e Verenis descobrem o orc que nos trouxera até esta caverna no seu encalço. A criatura, apesar de ferida, recusa-se a render-se. Tentam intimidá-lo, mas ele resiste. Vejo Syriel a cerrar os punhos, e pressinto que se prepara para exterminar o orc. Agarro-lhe levemente no braço, lembrando-a que necessitamos dele vivo para a nossa missão. Munido de extrema calma, consigo chegar a acordo com o orc, prometendo poupar-lhe a vida, conduzindo-o até às autoridades da aldeia mais próxima, se ele se render e nos revelar as informações que pretendemos. Apesar da sua parca inteligência, o seu instinto deve-lhe ter lembrado que esta era a única hipótese de sair com vida da caverna. Amarramo-lo e questionamo-lo.

Nada sabia do Irmão Arneson. Começo a perder quaisquer esperanças de o encontrar... No entanto, revelou outra coisa de não menos importância. Um exército de orcs está a dominar as restantes tribos nas Thunder Peak Mountains. E o nome do líder desse exército... Gorax! O assassino do pai de Syriel.

Saímos da gruta, reencontrando o espavorido cão de Kinos. O dia está a nascer, e temos Peldan’s Helm no horizonte.

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Não sei, Labelas. Juro-te que não sei. Estou cada vez mais longe do rasto do Irmão Arneson. Sinto-me combalido. Caminho na companhia de alguém que carrega consigo uma mentira, e que pode ser uma potencial ameaça à estabilidade de Mistledale. E no meio de todo este turbilhão, Gorax ressurge.O tempo está do meu lado, Labelas? Não sei... juro-te que não sei...