Brass - a revolução de Wallace

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Previamente publicado na Rede de jogos a 27 Novembro 2007 13:30

 

Martin Wallace (2007)

Para que a Revolução Industrial pudesse acontecer, era necessário uma renovação técnica nos meios de produção, um incremento do capital líquido monetário e físico e uma oferta maior de trabalho.

A acumulação de capitais nas mãos dos comerciantes e a abertura dos mercados, proporcionada pela expansão marítima, estimularam o crescimento da produção, exigindo mais mercadorias e preços menores.

As inovações começaram na indústria têxtil. Generalizou-se a passagem da manufactura para a indústria mecânica. O aparecimento da máquina a vapor não só revolucionou o sistema de produção, como transformou os donos de forjas, de fiações e de tecelagens numa forte burguesia industrial. Em Lancashire e Yorkshire, os membros dessa nova classe eram antigos agricultores e tecelões que, com muito esforço, conseguiram comprar os teares mecânicos. Dessa maneira, passaram da actividade agrícola para a pequena indústria doméstica, desta para a manufactura e da manufactura para a grande indústria.

Até a segunda metade do século XVIII, a grande indústria inglesa era a tecelagem de lã. Mas a primeira a mecanizar-se foi a do algodão, feito com matéria-prima colonial (vinda dos Estados Unidos, da Índia e do Brasil). O tecido leve ajustava-se aos mercados tropicais; 90% da produção ia para o exterior, e isto representava metade de toda a exportação inglesa, o que sublinha o papel determinante do mercado externo, principalmente colonial, no arranque industrial da Inglaterra. As colónias contribuíam com matéria-prima, capitais e consumo. Os capitais também provinham do tráfico de escravos e do comércio com metrópoles colonialistas, como Portugal. Provavelmente, metade do ouro brasileiro acabou no Banco da Inglaterra, financiando estradas, portos e canais.

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Em 1733 (data que os historiadores atribuem ao início da Revolução Industrial) John Kay inventou a lançadeira volante, popularizada depois de 1760. James Hargreaves inventou a Spinning-Jenny (1765) que produzia oito fios ao mesmo tempo, mas eles eram finos demais e quebravam-se. Richard Arkwright (ou Thomas Highs, segundo outros autores) inventou a waterframe (fiandeira hidráulica, 1760), capaz de produzir oito fios simultaneamente, porém só permitia a fabricação de tecidos muito grossos e de baixa qualidade. Foi Samuel Crompton que conseguiu produzir fios finos e resistentes, com a mule (1779). O aumento da produção de fios obrigou a tecelagem a se revolucionar para poder consumi-los produtivamente: sobravam fios, desequilíbrio corrigido em 1785, quando Edmond Cartwright inventou o tear mecânico. No ramo metalúrgico, substituiu-se o carvão vegetal pelo carvão mineral (coque).

Cada problema surgido exigia nova invenção. Para mover o tear mecânico, era necessária uma energia motriz mais constante que a hidráulica, à base de rodas d’água. Thomas Newcomen inventou a máquina a vapor (1711), aperfeiçoada por James Watt (1765), quem, aprimorando a máquina, chegou à máquina de movimento duplo, com biela e manivela, que transformava o movimento linear do pistão em movimento circular, adaptando-se ao tear. Era a primeira máquina a vapor realmente eficaz. Estas máquinas tinham muitas utilidades. Retiravam a água que inundava as minas subterrâneas de ferro e carvão. Movimentavam os teares mecânicos, que produziam tecidos de algodão. Com isso, a Inglaterra tornou-se a maior exportadora mundial de tecidos.

Para aumentar a resistência das máquinas, a madeira das peças foi substituída por metal, o que estimulou o avanço da siderurgia.

back cover A Inglaterra possuía grandes reservas de carvão mineral em seu subsolo, ou seja, a principal fonte de energia para movimentar as máquinas e as locomotivas a vapor. Além da fonte de energia, os ingleses possuíam grandes reservas de minério de ferro, a principal matéria-prima utilizada neste período, a juntar a isso a sua vasta rede de canais, construídos a partir de 1759 para facilitar a chegada do carvão e que seria o grande responsável pelo surgimento de inúmeras indústrias na cidade, davam início ao período conhecido como "Revolução Industrial".

O comércio interno e externo sustentou a empresa industrial, pois os capitais acumulados, que contavam com uma sólida instituição financeira, o Banco da Inglaterra, concedia amplos créditos aos industriais britânicos. Por volta de 1840, a indústria inglesa já estava mecanizada, havia uma rede nacional de estradas de ferro, começava a construir ferrovias em outros países, exportava locomotivas, vagões, navios e máquinas industriais.

Além de possuir grandes reservas de carvão, as jazidas inglesas estavam situadas perto de portos importantes, o que facilitava o transporte e a instalação de indústrias baseadas em carvão. Nessa época a maioria dos países europeus usava madeira e carvão vegetal como combustíveis. As comunicações e comércio internos foram facilitados pela instalação de redes de estradas e de canais navegáveis. Em 1848, a Inglaterra já possuía oito mil quilómetros de ferrovias. Por outro lado, a localização da Inglaterra, na parte ocidental da Europa, facilitava o acesso às mais importantes rotas de comércio internacional, e permitia conquistar mercados ultramarinos. O país possuía muitos portos, e intenso comércio costeiro.

Quanto mais sofisticados os meios de trabalho, maior a produtividade, menores os custos e os preços, maior a possibilidade de vender para mais gente, conquistando mais mercados.

É nesta emocionante época de evolução, construção, exploração e desenvolvimento de mercado que decorre este jogo, inundado de tema, que nasce da genialidade de Martin Wallace.

Brass é o nome de uma liga de cobre e zinco e que na época era o principal metal no fabrico de moedas. Como tal o principal objectivo deste jogo é ganhar dinheiro, muito dinheiro.

Sendo cada jogador um burguês com visão estratégica em relação aos acontecimentos da época, estes resolvem investir no seu desenvolvimento no condado de Lancashire. Construindo indústrias mineiras e têxteis, canais de distribuição e concluindo negócios com os principais portos e o mercado externo, estes industriais vão ganhando fama e poder, retirando grandes lucros como aconteceu nessa época.

Tal como a liga que dá o nome ao jogo, Wallace conjuga mecânicas de dois dos melhores jogos da actualidade, Age of Steam e Power Grid para transportar os jogadores a uma aventura emocionante durante as duas principais épocas da revolução industrial. As épocas do canal e do caminho de ferro. Mecânicas essas que tornam este jogo um dos mais competitivos e difíceis que já joguei.

Os tempos são fundamentais, a estratégia e o olho para o negócio, a identificação das necessidades do mercado e a criação de novos mercados que originam uma nova procura, são as principais razões para que se torne um jogo difícil de jogar.

 

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Não é um jogo para toda a gente, como a maioria dos Wallace, nem todos vão gostar de o jogar por causa da sua dificuldade, pela quantidade de decisões difíceis de tomar, pelo número curto de jogadas que se tem e pela agonia constante na procura da melhor maneira de as conseguir optimizar. Apesar de ter uma pitada de sorte devido ao recurso a cartas de construção e como tal, ser possível ter uma má mão, não é um jogo tão imperdoável como o AoS, pois com algum planeamento e sangue frio, é possível evoluir no jogo com uma fluidez notável. Para quem procura um puro euro muito desafiante, táctico e sempre no limite das possibilidades é um jogo a considerar.

No principio procuramos apenas um bom sítio para começar a nossa indústria, que pode ser de carvão, têxtil ou minério de ferro. Um bom local para iniciar, de preferência perto de um porto, um sitio que fique bem pertinho para pouparmos na primeira venda, pois tal como no AoS é imperativo entregar rapidamente a primeira encomenda e fazer subir o nosso rendimento.

demand track Construir é caro e o pouco dinheiro com que se inicia o jogo rapidamente desaparece. É preciso rentabilizar a indústria o mais possível e depois vender, vender, vender.

Quando a procura de carvão aumenta e as redes de distribuição e novas industrias começam a ficar totalmente dependentes daquele minério. Quando já se importa este minério do mercado externo, é a altura certa para investir numa dessas indústrias, ou noutra de ferro que produza máquinas rentáveis, que mais tarde serão absorvidas pelas industrias mais desenvolvidas. O timming aqui é tudo. Ter olho para o que vai ser necessário daqui a dois ou três rounds, posicionar as fábricas na melhor situação geografica e conseguir vender o que se produz é fundamental. Mais uma vez tudo aqui é dependente do timming, esta é a essência do jogo. O que construir, quando construir. Vender agora ou esperar um pouco para vender de um só vez. Esperar que as linhas de distribuição se desenvolvam ou ocupar o nosso lugar estrategicamente. Garantir agora o desenvolvimento da nossa industria ou esperar para mais tarde. Pedir um empréstimo para poder construir ou vender e receber esse rendimento primeiro. Arriscar o mercado externo ou fazer negócios com portos já existentes?
O jogo funciona em crescendo, é com prazer que se vê o tabuleiro a ficar cada vez mais composto e cada vez mais industrializado, é com um brilhosinho que se vê a revolução industrial a acontecer, as indústrias a desenvolver, a evoluir.

Como todos os bons Wallace é pesado, desafiante e difícil. Um jogo económico com muitas decisões, o dinheiro é sempre apertado e penaliza a má gestão. As mecânicas são geniais. O jogo exige preparação e a primeira época em que decorre não é mais que isso, preparar a nossa industria e rendibilidade para enfrentarmos uma segunda parte do jogo ainda mais desafiante e que cresce ainda mais depressa. O ritmo do jogo é alucinante, as peças ocupam o tabuleiro rapidamente, quase que não temos tempo de reagir, as cidades ficam ocupadas, as rotas de distribuição são cortadas, os portos fecham negócio num abrir e fechar de olhos, o mercado externo fica saturado e os recursos começam a escassear tal é a procura exigida.

O maior desafio é a leitura do tabuleiro em relação ao que vai ser necessário no futuro. Se mais industrias, se mais portos de entrega, se mais rotas de distribuição. Conseguir antecipar qual será a maior procura nos rounds seguintes e obrigar os outros jogadores a utilizarem o que se tem para oferecer.

Apesar da curva de aprendizagem ser um pouco elevada, por exigir alguma adaptação ás regras, estas torna-se relativamente simples depois de jogado pela primeira vez .

cards Brass é um jogo que tem de ser construido e preparado a médio prazo, principalmente por causa das cartas que lhe dão um cheirinho de sorte. Mas é bastante controlável, muito estratégico, exigente e terrivelmente arrebatador.

Na minha opinião e apesar de não ser o melhor jogo do Wallace, anda lá muito perto. Para mim é um dos melhores, senão o melhor jogo de 2007 que eu já tive o prazer de jogar. Neste momento já se tornou num dos meus top 10.
Merece um valente 9, provavelmente a subir para 9.5 nos próximos jogos.

 

3 a 4 jogadores, sessões de 2 a 3 horas.


Referências sobre a revolução industrial baseadas nos artigos:

DA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL AO MOVIMENTO OPERÁRIO
As origens do mundo contemporâneo de Osvaldo Coggiola
https://www.moreira.pro.br/tema24.htm
e
Revolução Industrial
em https://www.culturabrasil.org/revolucaoindustrial.htm

 

Quando tiveres a escrever um texto nunca copies directamente das fontes que vês na net. Pelo menos não em copy paste. Porque assim as pessoas que tavam a achar o texto da tua autoria até interessante percebem que foste copiar isto de um site brasileiro. "As colônias contribuíam com matéria-prima, capitais e consumo."

A certa altura dizes "Brass é o nome de uma liga de cobre e zinco e que na época era o principal metal no fabrico de moedas (...)". Se quiseres podes traduzir Brass para Latão, sempre fica um bocado melhor.

Isto de eu andar a ter aulas de como preparar trabalhos científicos... Dá-me para isto!

Obrigado pelas sugestões.O erro foi corrigido.

De qualquer forma, as referências bibliográficas estão incluidas em rodapé e em relação à frase que define o latão, a escolha foi propositada.


Espero que tenhas gostado do artigo.

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