Chinatown vs. Traders of Genoa

Com o advento dos jogos de leilão, ou pelo menos aqueles que têm uma pontinha de leilão, comecei a aperceber-me que era uma coisa na qual eu até me safava, relativamente, bem. Ou seja, talvez por causa da minha história de comerciante, quase secular, adapto-me bem à circunstância de ter de regatear, chorar, esmifrar, convencer, embelezar a coisa, enfim, uma carrada de coisas essenciais que deixariam a família do Quaresma com uma lágrima de inveja no canto do olho. Mas tudo com a honestidade de um boardgamer que se preza. Nada de atentados à dignidade.

Vai daí a comprar um jogo de regateanço foi um pulinho. Abarbatei a primeira edição saxónica (allemand oblige) de Traders of Genoa que encontrei no boteco mais próximo dos ponto pt. Para o caso até foi num ponto it, mas não interessa. Era em inglês e eu queria o jogo. Experimentámo-lo num duelo a dois, eu e o Carlos, numa noite sem quórum para melhor que isso. E não é que o jogo se revelou deliciosamente estimulante?! Claro que lhe encontrámos limitações. É que, jogar um jogo de negociação pura, somente com dois jogadores não é, propriamente, uma coisa grandemente aconselhável – isto dito pelos próprios familiares do Quaresma. Mas adiante. A intenção foi muito boa. Agarrámo-nos às regras e vai disto. Demorámos um pouquito até entendermos a mecânica da torre e das pecinhas e dos caminhos e tal, mas depois foi um instante. No fim da noite, a conclusão era óbvia: temos de repetir isto com mais gente. E assim foi…

O hiato de tempo da primeira vez até à segunda foi grandito. No entretanto comecei a pesquisar mais coisas sobre jogos de negociação. Daí a chegar até Chinatown também foi um pulito. O jogo era muito apetecível. O preço, nem por isso. Caro como tudo, ainda por cima para um jogo familiar e manhoseco da Alea que deve ter custado uns 10€ a produzir! Mas, ainda assim, e porque – confesso – não reparei no preço da primeira vez, coloquei-o na listinha das coisas que queria. E por lá andou uma temporada boa. Entretanto, mudou de posicionamento, descaiu mais para a direita do terreno, numas vezes, noutras, e até ao pontapé final de trivela, andou pela esquerda, embora nunca tenha chegado a ponta de lança.

Quando, finalmente, o hiato terminou e voltámos a jogar Traders of Genoa, com mais gente – não éramos muitos mas éramos mais de dois – percebi que aquilo não era o que eu queria. Como de uma boa experiência se passa para aquilo que passámos…. É esquisito. O jogo arrastou-se por mais de quatro horas. Ninguém cooperava com ninguém. Todos faziam as coisas como queriam. Discutiam-se negociações de quinze minutos que depois nunca aconteciam. Enfim, ou o problema era dos jogadores, ou o problema era do jogo. Bem, também poderia ser de ambos. Não sei. Sei que o troquei, numa dessas boas coisas do BGG.

Voltando ao problema do Traders of Genoa, percebi-o quando joguei Chinatown. Afinal, o problema era de ambos – dos jogadores e do jogo.

A nossa primeira experiência com Chinatown foi no encontro do Porto (gentilmente cedido pelo Sgrovi), e éramos os mesmos três geeks que experimentaram o Traders of Genoa num mês do ano passado. Antes de o começarmos a jogar, cumprimentámo-lo. Confesso que sofremos um bocado de complexo VIP, quando pusemos o tabuleiro na mesa mas, à medida que o tempo ia passando, esse pudor foi-nos abandonando. Olhámo-lo de frente e, já com meia dúzia de jogadas elaboradas, percebemos que aquilo não era um Traders of Genoa. Em Chinatown, os jogadores que não cooperarem e que queiram ser teimosos com aquela sensação de ganharem em todas as negociações, não conseguem jogar. Chinatown obriga a que se ceda para se conseguir jogar. Ninguém tenha a pretensão de jogar para ganhar este jogo sem querer perder nada, porque isso não acontece. No início, e porque era a primeira vez que estávamos a jogar, o jogo começou a empancar. Cheguei, nessa altura, àquela conclusão do Traders of Genoa – a culpa é dos jogadores. Estávamos ali a tentar fazer as mesmas coisas que fizéramos quando havíamos jogado este mas nada estava a resultar. Apercebemo-nos disso e cedo começámos a ceder. Por volta do meio do jogo todos sentimos (não falámos disso mas eu sei) que aquilo era um belíssimo jogo de negociação. Para o provar estava o resultado final – um empate a 127. O número não é redondo mas o jogo era. Muito polidinho, sobretudo para um jogo do género negociação, muito simples de jogar e muito “prático”, e que tinha a tal grande vantagem sobre o Traders – ninguém o ganharia se não cooperasse.

E é aqui, inevitavelmente, que aparecem os resultados principais da comparação entre ambos. São muito bons nas diversas mecânicas que combinam, o Traders num estilo mais pesado, com mais para fazer e para controlar, o Chinatown muito mais simples, sem ser simplório, e muito mais rápido, mas que também consegue ser o mais estimulante. Porque serve o propósito para o qual foi criado. Ou seja, em Chinatown negoceia-se porque se quer ganhar o jogo. Em Traders of Genoa, pode-se negociar mas também se pode jogar solitário e, revelando o tal defeito do jogo, também se pode ganhar assim.

Para o resultado final, para a história, fica o desejo de um reprint de Chinatown que, espero, venha a ser feito ainda este ano. Em relação ao Traders of Genoa, não obrigado. E não é que seja um mau jogo, não. Nada disso. Simplesmente, não tem de ser de negociação e, para isso, que venham outros. E melhores.

Creio que mais uma vez se provou aquilo que se ganha em participar nos nossos eventos. Novos jogadores, mas especialmente novas oportunidade de conhecer jogos. Mais fácil é desenbolsar o "plin" depois de realmente conhecermos o jogo e percebermos a mecanica do que arriscar a adquirir um jogo que nada nos diz a nível pessoal. Fico contente que tenha servido o propósito.

Em relação aos jogadores percebo perfeitamente ( e ainda não tentaste com o Tereso e o Vasco ... o DrZ que diga ... ufa!!) neste tipo de jogo temos de dar a ganhar para ganharmos ... Não é fácil mas é curioso quando ambos acham que fizeram o melhor negócio (ou com os nossos jogadores, o inverso Wink ).

Tanto o Chinatown como o Traders são boardgames de negociação pura, no entanto o Traders tem muito mais elementos de negociação do que o Chinatown e, por isso, tem o problema que mencionaste, ou seja, passar quatro horas a olhar pro boneco.

O Chinatown obriga um jogador a negociar, e isso é bom. Entre os dois, o Chinatown ganha pela sua simplicidade aparente e pela velocidade a que decorre.

O meu grupo a jogar Chinatown é brutal a negociar, e isso é algo que gosto ver num jogo.

I know this: if life is an illusion, then I am no less an illusion, and being thus, the illusion is real to me. I live, I burn with life, I love, I slay, and am content.

Julgo que a grande diferença está na envolvencia de cada turno. No chinatown os jogadores estão em pé de igualdade, mas no Traders existe um unico homem da torre que vai ganhar proveitos e tem de ser convencido quanto à direcção a tomar.

Logo a decisão tipica no Chinatown é: será que a vantagem que vou receber é maior ou igual que a vantagem que estou a dar? Eu sei o valor possivel de cada peça ou espaço, e não existe jogo escondido (excepto o dinheiro).

No Traders of Genoa é mais uma decisão de serviços: o tamanho da fatia do bolo que eu estou disposto a dar aquele chulo por um favor? Prefiro dar dinheiro: é dificil quantificar os custos das coisas, porque depende onde elas vão ser utilizadas (jogo escondido).

Julgo que o Chinatown possa vir a torna-se previsivel, ao contrario do Traders com vários caminhos possiveis para a vitoria. Mas o Chinatown é muito mais apelativo pela sua simplicidade e duração.

Por tudo isto, ambos teem de fazer parte da minha colecção ;-)

O dedo na ferida é, claramente, o facto de se poder jogar o Traders sem negociar. Porque tu tens coisas na mão (cartas, tiles...) que podes realizar sozinho sem ninguém te ajudar. Ou seja, eu jogo com a torre e calhei ali num sítio qualquer, e vou ter sempre uma possibilidade pelo menos de concretizar uma tarefa. Claro que podes chegar à conclusão que o teu adversário quer passar por determinado sítio e aceitares favores para isso, mas TAMBÉM podes não o fazer. E ganhas o jogo na mesma, ou não, dependendo da sorte das cartas que te saem e do sítio onde inicia a torre na tua jogada.

O grande defeito que aponto a Traders tem precisamente a ver com isso. Existem outros jogos em que se pode trocar (negociar) tudo e mais alguma coisa mas que não são de negociação pura, como este apela que é. Se eu tivesse de escolher escolheria o Chinatown, mas percebo que a maioria das pessoas prefira o Traders.

O vencedor dos três jogos que joguei, tentava fazer as suas coisas no turno do outro, e receber o máximo de rendimentos possivel na torre. Por isso não posso falar, porque houve sempre negociação.

Mas não duvido que possa acontecer, tal como ja vi no settlers. Tal como o Bohnnanza, se não fizeres negociação perdes a piada do jogo.... Depende do estilo do jogador. Sei que se fizeres negociação reduzes a tua sorte: o que te calha e a movimentação da torre.

Eu não devia estar aqui a postar uma vez que nunca joguei nenhum destes jogos. Só queria lançar para o ar um bitaite matreiro... e SANTIAGO?? Tem uma razoável e satisfatória componente de negociação.

 

https://oblogdocosta.blogspot.com

Se souberem mais algum fixe com componente de negociação, apitem

O melhor deles todos, de facto. O Civilization/Advanced Civilization da AH. A componente de negociação do Civ é tão boa que nenhum boardgame que tenho se compara. O nosso grupo chega ao ponto de limitar o tempo de negociação para 15 minutos, senão ficávamos o dia todo no mesmo turno a negociar.


I know this: if life is an illusion, then I am no less an illusion, and being thus, the illusion is real to me. I live, I burn with life, I love, I slay, and am content.

Mais jogos com componente de negociação: Variante de Big City, Colossal Arena, Diplomacy (este sim é negociação destilada ao seu mais elemento puro), Dragon’s Gold, Illuminati: Deluxe, Quo Vadis?, Serenissima.


I know this: if life is an illusion, then I am no less an illusion, and being thus, the illusion is real to me. I live, I burn with life, I love, I slay, and am content.

Por isso é o meu jogo mais esperado. Mas está complicado em reservar um dia inteiro :frowning:

O Colossal Arena joguei, mas do que me lembro, não o achei de negociação... pelo menos verbal.

O Diplomacy além do problema do tempo, acho que tem facadas a mais: não gosto da minha faceta em dá-las ou da minha reacção em recebê-las....

O Illuminati: Deluxe ainda não tinha ouvido falar dele, por isso vou investigá-lo melhor. Obrigado...

Todos os outros, já estavam na wishplaylist ;-)

Bem, pelo que sei pelo menos a Runadrake tem o Quo Vadis? da Mayfair à venda, acho eu.

Esse é um bom jogo de negociação do Knizia, mais um filler que outra coisa, embora seja um heavy filler. Mas é muito bom e dá uma nova perspectiva ao aspecto de negociação, sem falar que se joga em 40 minutos ou menos.

Não é o Civ, mas dá pra matar a traça por um bocado.


I know this: if life is an illusion, then I am no less an illusion, and being thus, the illusion is real to me. I live, I burn with life, I love, I slay, and am content.

Vi um jogo na quarta feira e pareceu-me excelente. Tenho mesmo de o experimentar....

E pareceu-me bom para apresentar a um grupo de amigos non-gamer's.

Sim, o Quo Vadis? é muito bom para iniciar non-gamers. Por ser simples, fácil e rápido acaba por atrair muita gente para o jogar.

Lê a minha review aqui:

https://www.abreojogo.com/2006/10/quo_vadis

Recomendo o boardgame como alternativa ao Traders e ao Chinatown quando quiserem negociação leve mas séria.


I know this: if life is an illusion, then I am no less an illusion, and being thus, the illusion is real to me. I live, I burn with life, I love, I slay, and am content.

Estava a falar do jogo Lifeboats. Com furos nos barcos, pessoas a saltar dos barquinhos, votações e regras curtas, acho que pode ser um jogo fácil…

Ooops não me apercebi disso hehehehe


I know this: if life is an illusion, then I am no less an illusion, and being thus, the illusion is real to me. I live, I burn with life, I love, I slay, and am content.

Tendo já jogado os dois também concordo com a preferência para com o Chinatown.

Devo contudo começar por dizer que negociação não é bem o meu forte, normalmente só gosto de a utilizar quando tenho o modificador "olha aqui para a minha divisão de artilharia pesada" hehe.

O que o Chinatown tem que me agrada mais é as possibilidades de trocas, podes trocar pontos/dinheiro, tiles de lojas, espaços vazios e/ou ocupados, no Traders basicamente ao principio é um jogo mais de leilão para ver quem (é o louco que) dá mais dinheiro ao Sr. da torre do que propriamente negociação e por isso as hipóteses parecem-me mais limitadas no Traders do que no Chinatown.

Além que no Chinatown começam todos no mesmo pé de igualdade com as posições e tiles que compram, o que me parece ser promotor de posições de negociação mais equilibradas.

No entanto estou disposto a mais um jogo de Traders para tirar estas diferenças a limpo.

Sobre outros jogos com negociação, devo dizer que em poucos jogos negoceio tanto como no Shogun hehe.

"the drunks of the Red-Piss Legion refuse to be vanquished"