Contra todas as minhas expectativas, ontem à noite ainda acabámos por jogar a nossa primeira sessão da campanha de Kult! Como ninguém, à excepção de um jogador, tinha personagem pronto, pensei que íamos passar a noite a fazer contas de cabeça aos pontos, e a falar sobre conceitos, e sobre o que se pretendia da campanha, etc. Afinal, ainda se jogou mesmo.
Acho que isto é das coisas que mais admiro no Miguel, a sua força vontade e capacidade para enfrentar os problemas directamente e não se limitar a assumir uma posição passiva. Eu conheci-o justamente porque, numa altura em que o meu grupo regular passava meses sem conseguir combinar uma sessão, em casa dele todos os fins-de-semana havia um jogo a decorrer, fizesse chuva, sol ou neve; bastava haver dois jogadores e pronto, havia jogo, não era como o meu grupo em que se algum dos 5 ou 6 jogadores tivesse de faltar se desmarcavam os planos.
De modo que, ontem à noite, depois de o Miguel obrigar os jogadores com personagens inacabados a darem-lhe alguns dos dados essenciais em falta, começámos de imediato a jogar. Isto apesar de ele não ter nada preparado, até porque não sabia que tipo de personagens lhe iam calhar na rifa. No meu caso, passei-lhe o meu personagem inacabado para as mãos apenas uma hora antes da hora combinada para a nossa reunião! Soube muito bem jogar, tanto mais que não estava nada à espera de o fazer. Aquilo que eu tinha para acabar no meu personagem é algo que requer tempo para pensar, e como tal fui para a sessão apenas com ideias de passar umas tantas horas com os amigos na conversa. Nem sequer me apeteceu fazer as tais continhas de cabeça e distribuir os pontinhos pelas skills e atributos e tal. Passei a sessão toda a jogar com uma folha de personagem completamente em branco à minha frente!
Acho que isto confirma algo sobre os nossos jogos que eu me farto de tentar demonstrar por A + B ao próprio Miguel, mas pronto, isso já é outro assunto. Bom, como eu estava a contar, o que aconteceu é que afinal, joguei mesmo o personagem, incompleto como estava, improvisando com o input do Miguel, e até dos outros jogadores, os detalhes necessários no momento, à medida que eram precisos.
A desvantagem disto é, é claro, que meti o pé na argola aqui e ali, no sentido que deixei que certos acontecimentos e detalhes de background improvisados na hora por mim e pelo Miguel levassem a história para direcções que não eram bem o que eu queria de facto explorar. Isto agora torna um pouco mais difícil o meu trabalho de acabar o background, pois vou ter de compensar os desvios que aconteceram. A grande argolada reside essencialmente em que eu queria um personagem com um passado oculto que tinha mesmo manter escondido das autoridades. Ele não fez nada de grave, mas teve de fingir a morte da sua filha (que ninguém sabia originalmente que era dele) e fazer várias trafulhices para lhe dar a ela uma identidade nova.
Quanto o jogo começou, partiu-se do princípio que um certo NPC sabia muitos detalhes sobre o acontecimento que deu origem a tudo isto. A argolada foi essencialmente minha. Eu queria que esses detalhes viessem a lume o mais rápido possível; foi para isso que os criei. Simplesmente o meu personagem teria feito qualquer coisa para manter isso escondido de toda a gente, especialmente da filha, (e aí está a graça de possuir este segredo obscuro, descobrir até onde é que o personagem está disposto a ir para o manter secreto).
Ora justamente o que aconteceu foi que, quando dei por mim, o segredo estava cá fora há bastante tempo, semanas ou meses antes do jogo começar, e o meu personagem não parecia ter feito nada para manter a coisa escondida, nem sequer da sua filha. Ora isto implica que ele não é, de todo, o tipo obcecado por manter o passado enterrado que eu queria jogar. Agora vou ter maneira de explicar os acontecimentos da sessão de ontem - sem interferir (muito) com a continuidade - de modo a ainda poder explorar o tipo de personagem e o tipo de situações que queria de facto.