Entre favas, gelados, e montanhas russas (ou como eu vejo o PTA)

[quote=jpn]Para mim, o que ele está a dizer é que os quatro primeiros jogos são as próteses que permitiram jogar os seis últimos.[/quote]

Criar é o que ele está literalmente a dizer ali. Ele já disse isso várias vezes, sempre no sentido de que aqueles jogos abriram a porta que deu novos mundos ao mundo, que mostrou que há outros territórios abertos onde se pode jogar.

Eu não joguei nenhum dos quatro jogos originais e jogo PTA, por exemplo. Agora se o autor de PTA não tem jogado um ou vários deles, o PTA seria um Now Playing. Um jogador não precisa de aprender nada para jogar um típico jogo da Forge... só tem de pegar no livro de regras e seguir à risca as indicações, mais nada. Não há conceitos básicos e avançados, rodas de treino, ou jogos de demonstração. Há jogos para se jogar & gozar e mais nada. :)

Oi, :)

Vou então tentar organizar as minhas ideias.

Em primeiro lugar, há imensa gente que não gosta de PTA, pelas mais variadas razões. Uns acham o conceito de narração partilhada completamente contra-natura, vá-se lá saber porquê. Outros não gostam de agressive scene framing. Outros ainda curtem é Step On Up (gamism), coisa que, realmente, o PTA não tem. That's just fine, nem toda a gente tem que gostar da mesma coisa.

Em segundo lugar, estou cada vez mais convencido que de Narrativista, PTA tem pouco. Tem muito mais de Simulacionista, do ponto de vista de realmente recriar o conceito de uma série de televisão, o que consegue com um sucessso mais ou menos inquestionável.

Em terceiro lugar, as tuas razões:
[quote=Rui]Porque eu como jogador não gosto de saber onde a historia vai parar, gosto de andar à descoberta, de me assustar com os monstros, de não saber se vou ou não acertar no meu nemesis.[/quote]
Erm... hmm.... olha, bleagh. Ya, é isso mesmo, não colam. PTA é O jogo onde ninguém sabe onde é que a história vai parar (embora, para isso realmente se tornar óbvio, seja preciso jogar pelo menos um episódio inteiro). Por outro lado, é um jogo em que, como cada roll de dados realmente interessa (em oposição a, por exemplo, saber se aquele quarto To Hit entrou ou não), o pessoal realmente assusta-se com os stakes que são postos em cima da mesa. E nem sequer consegui parsar a frase "saber se vou ou não acertar no meu nemesis".

Não ponho em causa que PTA possa não ser para ti. Ponho em causa que talvez possas não estar a ser complementamente honesto contigo mesmo acerca das razões que te levam a não gostar. (Ou então apenas não conseguiste expressar correctamente os problemas que tiveste.)

Para além disso, recomendo que não descartes o conceito de Narrativismo com base em meia sessão de um jogo que nem sequer é bem representativo desse modo de jogo (na minha humilde opinião).

Dexia-me, no entanto, particularizar. Tu dizes que gostas de andar à descoberta. Isso quer dizer que gostas da descoberta em si, ou do [i]desafio[/i] de tentar descobrir o que se está a passar? É que do primeiro, o PTA tem aos magotes, mas do segundo, tem basicamente zero.

Num contra-comentário, disseste ainda o seguinte:
[quote=Rui]Repara no seguinte: tu preparas um grande plot twist durante 5 sessões, deixando hints aqui e ali[/quote]
Pois. Mau exemplo. Se tentares fazer isto em PTA, vais pura e simplesmente estar a fazer batota, a jogar contra as regras. Já agora, o teu plot twist preparado com tanto amor e carinho pode passar completamente ao lado dos interesses dos jogadores, que se podem estar nas tintas para o verdadeiro autor do atentado chupa-chupa, querem é saber o que aconteceu aquela jornalista bueda cute que estava lá mas, sabe-se, não morreu. (Er... isto assumindo que o verdadeiro autor [i]não[/i] era a jornalista... you get my driuft.) (Ah, e já para não falar dos jogadores que [i] nem sequer reparam[/i] que houve um plot twist, para quem os acontecimentos parecem completamente normais, ou porque têm brilhantes poderes de dedução, ou precisamente o contrário...)

Já agora, não há nada contra misturar plot twists com Narrativismo. Se, de facto, gostas de plot twists, recomendo que experimentes Sorcerer.

Ah, e comentei o teu exemplo de MnM no outro thread sobre railroading. Pareceu-me mais apropriado ali do que aqui.

Por último, não confundir Indie e Forge com Narrativismo. O meu Project Senate, por exemplo, tem pretensões de vir a ser Indie, é claramente nascido do meu seguimento da Forge, e é tudo menos Narrativista.

Agora, vou comentar alguns comentários...

[quote=jpn]acho que o problema é que os jogadores em PTA sabem exactamente, ou decidem na hora, as motivações dos NPCs e os seus segredos obscuros. Em vez daqueles momentos em que se descobre que o sacana-mor anda a lixar a vida à irmã do PC desde há 4 sessões, o PC decide na hora que é isso que o sacana-mor anda a fazer[/quote]
Ah sim? E porque é que é [i]esse[/i] jogador que está a decidir isso em particular, e não outro qualquer? Porque é que tem que ser o GM e não outro jogador qualquer que não o dessse PC a lançar a bomba para a mesa e apanhar o jogador desse PC totalmente nas curvas?

O meu ponto: eu sempre achei que PTA [i]não[/i] é o jogo para jogar com GM mais dois, quanto mais com GM mais um. Pelo menos um producer e três jogadores, para permitir boa rotação de história e evitar vícios de narrativa. (Sei que pelo menos a Raquel e o Ricardo discordam de mim neste ponto.) De qualquer modo, quantos mais gajos houver à mesa, maior a probabilidade de um deles te surpreender. PTA tem potêncial para ter pelo menos uma surpresa por sessão de jogo, coisa que nos jogos tradicionais acontece de quando em vez.

Por último:
[quote=jpn]O "Project Senate" do JMendes parece-me um exemplo de um tipo de jogo diferente, que realmente se foca num assunto raramente coberto por regras de RPG (só me lembro do Aria) mas que é realmente muito vasto.[/quote]
Whoa! Isso é talvez o comentário mais fixe que alguém alguma vez fez a respeito do jogo! :D :D Curto particularmente o facto de comparares o meu jogo com o Aria. :) I'm flattered and rejoiced. Obrigado! :)

P.S. Fiz o preview desta coisa e [i]não cabe no meu monitor de 19"[/i]!!! Bah. Eu avisei...

[quote="jmendes"][quote="jpn"]acho que o problema é que os jogadores em PTA sabem exactamente, ou decidem na hora, as motivações dos NPCs e os seus segredos obscuros. Em vez daqueles momentos em que se descobre que o sacana-mor anda a lixar a vida à irmã do PC desde há 4 sessões, o PC decide na hora que é isso que o sacana-mor anda a fazer[/quote]

Ah sim? E porque é que é [i]esse[/i] jogador que está a decidir isso em particular, e não outro qualquer? Porque é que tem que ser o GM e não outro jogador qualquer que não o dessse PC a lançar a bomba para a mesa e apanhar o jogador desse PC totalmente nas curvas?

 

O meu ponto: eu sempre achei que PTA [i]não[/i] é o jogo para jogar com GM mais dois, quanto mais com GM mais um. Pelo menos um producer e três jogadores, para permitir boa rotação de história e evitar vícios de narrativa. [/quote]

Esse é o ponto mais engraçado do PTA, concordo contigo. Eu jogo PTA (ou jogava, antes da tese de PhD...) para lançar a bomba na mesa aos outros jogadores. Só que aqui entra um ponto pessoal. Por alguma razão, no PTA é-me completamente indiferente ter um personagem (gosto muito de ser GM :) Acho que é pelo facto de saber que os mistérios todos do setting foram inventados na hora, e muitas vezes são completamente incoerentes com o resto do setting. É o meu bicho simulacionista a vir ao de cima e a refilar, admito :)

JP

Creio que o ultimo Dork Tower resume praticamente tudo o que tenho a dizer sobre PTAs e companhia:

 https://archive.gamespy.com/comics/dorktower/archive.asp?nextform=viewcomic&id=1095

Não quero um Mago chupa-chupa, mas contento-me com a minha campanha de Teen Supers!  

 

Oi, :)

[quote=jpn]os mistérios todos do setting foram inventados na hora, e muitas vezes são completamente incoerentes com o resto do setting. É o meu bicho simulacionista[/quote]
Ou eu não percebi o que querias dizer, ou isto é non-sequitur. Podes esclarecer?

[quote=plasmas]Creio que o ultimo Dork Tower resume praticamente tudo o que tenho a dizer sobre PTAs e companhia:[/quote]
Erm... Esta ligação... Mim também não perceber...

[quote=JMendes][quote=jpn]os mistérios todos do setting foram inventados na hora, e muitas vezes são completamente incoerentes com o resto do setting. É o meu bicho simulacionista[/quote]
Ou eu não percebi o que querias dizer, ou isto é non-sequitur. Podes esclarecer?[/quote]

Eu não estou a dizer que, em PTA, os mistérios da história são necessáriamente incoerentes com o setting só porque foram inventados na hora (isso seria um non-sequitur, acho). Estou a dizer que isso tem sucedido quando jogo PTA, não por causa das regras, mas por causa da atitude dos jogadores que usam o sistema assim (e fazem bem!). Ou seja, não é um problema das regras do PTA em si, é um problema da forma como tem sido jogado. Como é um problema só para mim, não o procurei resolver (e se os jogadores todos gostam nem sequer se classifica de problema), mas que afectou a minha posição sobre PTA, afectou :)

JP

[quote=jpn]Eu não estou a dizer que, em PTA, os mistérios da história são necessáriamente incoerentes com o setting só porque foram inventados na hora (isso seria um non-sequitur, acho). Estou a dizer que isso tem sucedido quando jogo PTA, não por causa das regras, mas por causa da atitude dos jogadores que usam o sistema assim (e fazem bem!).[/quote]

Estás a falar de jogos que fizeste como Produtor, certo? Ou como jogador tens algum caso concreto para apresentar à mesa?

Anyway, parece-me uma questão de perspectiva. Todos os jogadores participam na criação do setting, logo o setting é o resultado das ideias de todos... quem é que pode em boa consciência afirmar que a ideia X do jogador Y não pertence ali? Se a ideia X contradiz directamente o que se estabeleceu antes, e não é nenhum plot twist inesperado, apenas uma grande gafe de continuidade, nesse caso cabe a toda a gente à mesa mostrar esse facto ao culpado pela gafe... qual é o problema? Se o jogador teimar em estragar o jogo aos outros jogadores só porque sim, pronto, não joguem mais com ele porque o PTA não foi feito para jogar com ele.

Experimentaste chamar na altura a atenção do pessoal para a tua insatisfação e apresentar sugestões que não quebrassem a estrutura do setting?

De resto, como indicam as regras, há uma série de coisas que podem ou devem ficar estabelecidas à partida sobre a premissa e o tom da série, para que o pessoal não leve aquilo para onde nem toda a gente o quer levar. Se não se quer comédia numa série de terror, ou não se quer poderes mágicos numa série de SciFi, isso fica determinado por consenso e pronto. Ninguém pode mudar, pelo menos sem o pessoal todo chegar a outro consenso.

[quote=ricmadeira]Anyway, parece-me uma questão de perspectiva. Todos os jogadores participam na criação do setting, logo o setting é o resultado das ideias de todos... quem é que pode em boa consciência afirmar que a ideia X do jogador Y não pertence ali?[/quote]

Exacto. Mas eu estava a falar de coerência em termos dos mistérios por trás do setting, só...

-JP

Oi, :)

Mmmm.....pois. De facto, não era disso que eu estava a falar.

Eu tenho apanhado aqui e ali várias pessoas que estão convencidas que o apelo à coerência, às relações causa-efeito e à verosimilhança são indicação de tendências simulacionistas.

Pareceu-me que era isso que querias dizer, e isso é um non-sequitur. Se não era isso que querias dizer, então essa é a parte em que eu digo que se calhar não percebi.

Para esclarecer: coerência, causa-efeito e verosimilhança são preocupações a nível de exploração, e sem exploração, não há role-play. Ok? Role-play é imaginação negociada. Insistir na "coerência interna" é apenas um aspecto dessa negociação, e não tem a ver com simulacionismo.

Como eu tenho já dito muitas vezes, para mim, PTA foi [i]completamente[/i] simulacionista. E teve a coerência interna que teve, que não foi particularmente reforçada pela narração partilhada, mas também não foi particularmente posta em causa por esta.

Voltando ao teu ponto anterior, quando tu dizes que não te interessa ter um personagem em PTA porque os mistérios podem não ser coerentes, eu analiso isso como sendo o teu bicho [i][b]gamist[/b][/i] a refilar. O que isto me diz é que tu gostas visceralmente de analisar e possivelmente resolver mistérios, o que realmente só é [i]consistentemente[/i] possível se esses mistérios forem cudadosamente afinados e coerentes, o que de facto, em PTA, nem sempre acontece.

As always, corrige-me se estiver enganado.

Cheers,
J.