[quote=b0rg]Não me parece que o comentário que me chamou a atenção tenha a ver com uma relação qualquer imaginada entre o CA e o jogo In-Character ou Out-of-Character![/quote]
Hmm... é que na frase «there's less detachment when you try to think just like the character instead of with ulterior motives» ele está basicamente a dizer que Stance de Actor = Mais Ligação ao Personagem. Ora, todas as agendas podem usar todas as stances, tal como a maioria dos jogadores, ao longo de uma sessão, vai variando entre várias delas sem sequer se aperceber. Para o autor, Sim é usar o personagem como um perfeito avatar, enquanto que considera que em Gamism e Nar o personagem é pouco mais que um peão para explorar desafios ou a história. Nada mais errado! O uso das “stances” Peão, Actor, Autor, Director não é de forma nenhuma o que define uma agenda criativa.
No fundo, acho que o post trata sobretudo destas questões de Stance, e claramente está ali a confundir técnicas com a agendas. Apesar de as palavras Joguismo, Simulacionismo e Narrativismo conjurarem na nossa mente imagens bastante fortes, estas imagens e conceitos “intuitivos” não correspondem a nada de minimamente verdadeiro. Jogar/Competir não é Joguismo, Simular/Emular/Imitar/Representar não é Simulacionismo e Narração/História não é, de todo, Narrativismo.
Repara bem que o jogo onde te sentiste mais dissociado do teu personagem foi em PTA Heritage. Invoco aqui a máxima do JMendes: Narrativismo não é Narração. Um jogo não é narrativista porque te oferece a narração; é apenas uma técnica que, como qualquer outra, pode ser usada em G, N ou S. Se vires bem, PTA Heritage foi uma campanha de Simulacionismo quase puro, em que se estava a tentar ser o mais fiel possível ao que as pessoas achavam que uma série de TV devia ser. Curiosamente o momento em que talvez te tenhas ligado mais ao personagem ocorreu num daqueles irregulares lampejos de Narrativismo: quando eu te atirei um meio-bang para cima, ficaste uma semana inteira a sonhar com o assunto.
Percebo como te podes identificar com as palavras do autor, mas cavando debaixo da superfície acho que aquilo não tem ponta por onde se lhe pegue. Basicamente o teu problema com PTA parece-me ser o uso cíclico e inescapável das Stances de Director e/ou Autor; não é uma questão de ser ou deixar de ser G, N, ou S. Tens também problemas com a parte do enquadramento de cenas, que corta a “palha” do jogo; novamente isso é apenas uma técnica de bom storytelling, destinada a manter o ritmo e o interesse, que podes usar à vontade sem G, N ou S se gostares dela. Narrativismo não é Storytelling... RPGs são Storytelling, todos eles.
[quote=b0rg]Sendo gamismo um jogo pelo desafio, a personagem é uma ferramenta para enfrentar os desafios colocados. Sendo narrativismo um jogo para criar significado, mais uma vez, de alguma maneira, a personagem torna-se uma ferramenta para tal. Apenas no simulacionismo pode acontecer (não acontece sempre, atenção! por simulacionismo aqui, acho que se deve entender sim-char) a personagem ser um fim em si própria! Daí que possa ganhar uma maior importância nesse sentido e, como tal, uma "maior ligação ao personagem"![/quote]
Pois, lá está, essa coisa da “ferramenta” é a falha fundamental do raciocínio do autor original e também do teu, parece-me. Se estás a falar da Stance Peão, em que realmente o jogador joga o personagem como um peão (ou seja, uma ferramenta), já o meu discurso todo abordou essa questão: é apenas uma técnica que qualquer agenda usa. Se estás a falar de “ferramenta” como algo mais teórico e abrangente, bom é só lembrarmo-nos de que isto é um jogo de <em>role-play</em>: a personagem é, por definição, a forma do jogador interagir com o mundo, e o objectivo é, por definição, o jogador representá-la e controlá-la. Não são o G, N ou S que mudam isso.
Agora se quiseres discutir que uma Stance de Actor deixa o jogador mais próximo da personagem do que as outras stances... bom, é bastante possível e altamente provável que seja verdade (mas mesmo isso estaria aberto a discussão). É que, afinal, toda a definição da Stance de Actor é mesmo que o jogador joga a personagem a partir de dentro sem ligar a quaisquer outras considerações exteriores das quais o personagem não esteja consciente. Cito novamente o autor do post inicial: «there's less detachment when you try to think just like the character instead of with ulterior motives». Parece-me que é só isso que há a retirar dali para submeter a reflexão; no resto do texto ele tenta dizer que uma das três agendas criativas usa isto e as outras não, mas isso é uma conclusão sem qualquer nexo.
[quote=b0rg]Nota que não estou a dizer que noutras agendas criativas a ligação ao personagem não pode acontecer, mas que se essa própria ligação num determinado tipo de jogo é o objectivo em si então a ênfase e/ou importância que se lhe dá será maior (por norma). (...) é possível que isso seja um fim em si e, como tal, exista uma diferença nesse sentido.[/quote]
Certo, aceito perfeitamente que me digas que um jogador com tendência Sim [u]se[/u] consegue ligar melhor aos [u]seus[/u] personagens numa campanha Sim. Mas, da mesma maneira, parece-me óbvio que um jogador prefere um bom desafio que lhe faça suar os neurónios, se vai “ligar” mais às personagens que para ele são melhor sucedidas e melhor construídas em termos de eficácia. E um narrativista com gostos semelhantes a mim vai ficar completamente imerso nos personagens que têm mais dilemas e questões embutidos neles à partida e achar as personagens ultra-realísticas de um Sim-Char com pretensões a actor são uma seca desgraçada porque têm muita polpa e pouco sumo. Nesse ponto acho que concordamos sem problemas.
Mas depois, pelo menos para mim, o foco de Sim-Char será algo como “exploração do personagem pelo prazer da exploração”, e não o teu “criar uma ligação ao personagem” (que pode ser, e normalmente até é, um dos grandes objectivos de jogo quer estejas em G, N ou S). E aqui volta sempre tudo a cair na questão de gostos do parágrafo anterior. Quem já não gostava antes de explorar só para explorar e descobrir coisas novas, vai continuar a preferir jogar de outra maneira.
E vou mais longe: podes explorar um personagem sem precisares de o “encarnar”; a “encarnação” (que eu aqui uso como sinónimo da já falada Stance de Actor) é apenas uma técnica que, tal como qualquer outra, podes usar ou não. Nalguns jogos até exploras o personagem olhando para listas de regras e tabelas de números, sendo os lançamentos de Humanidade/Sanidade que vão decidir qual o comportamento do personagem naqueles próximos minutos. Quase toda a gente aqui concordaria que isso não os ajuda muito a ligarem-se ao personagem, e no entanto não deixa de ser exploração do personagem, ie, o foco de Sim-Char.
Isto tudo para dizer que não me parece, de todo, que haja um modo que tenha à priori qualquer vantagem sobre outros no que toca a criar ligações aos personagens. Talvez alguns submodos de Sim que têm tradicionalmente tendência a preferir determinadas técnicas, sim, mas se usares exactamente as mesmas técnicas em Gam e Narr o resultado é o mesmo; a única coisa que desempata o resultado final será então a preferência pessoal do jogador, que obviamente vai ter preferências no que diz respeito a G, N e S.