Regras de Combate: Interferência

Esta é uma questão simulacionista voltada para os RPGs cujas regras incluam normalmente um lançamento dos dados por acção - seja para atacar, defender, fugir, etc. um lançamento de cada vez, como acontece em D&D, Call of Cthulhu, Vampire ou Legend of the Five Rings, entre outros. Outras regras podem resolver toda uma cena ou um turno de combate num só instante de resolução, mas não é sobre esses RPGs que queria falar.

Todos sabemos que, na generalidade das regras de combate, há um atacante, um defensor e uns lançamentos/opções lá pelo meio. No entanto, já vos aconteceu terem um terceiro personagem que, no decorrer das acções dos outros, põe-se no meio com o intuito de tentar parar o combate?

Imaginem a cena clássica da princesa pela qual dois cavaleiros estão apaixonados e, por isso, lutam um contra o outro. O combate começa e a princesa mete-se no meio com a ideia de interferir em todos os ataques para que ninguém se magoe. Sempre que um cavaleiro quer golpear o adversário tem que ultrapassar a interferência da princesa, sem correr o risco de a atacar. Por outro lado, sempre que um cavaleiro é atacado conta com a cobertura adicional da princesa, mas também não quer que ela leve com um golpe que era para ele. Quanto à princesa, imaginem que ela não quer mesmo atacar - nem mesmo agarrar - nenhum dos cavaleiros, ela guarda sempre a sua acção para se põr à frente de todos os ataques que puder.

Entendem a minha questão? Já vos aconteceu algo do género?

Outra situação mais comum é o companheiro de batalha que quer tentar defender o golpe que ia para o amigo ou mesmo apanhar com ele, mas esta parece-me mais fácil de resolver.

Existe algum RPG cujas regras falem destas complicações? Não havendo, como é que as costumam adjudicar?

Eu fiquei grande fã das regras de combate de Sorcerer desde que fiz um one-shot que acabou numa espectacular cena de pancaria caótica entre quase todos os intervenientes e os seus demónios. Havia pelo menos uma boa meia-dúzia de intervenientes, quase todos a tentarem fazer coisas que interfeririam e/ou cancelariam as acções uns dos outros, etc, etc, e deu-me prazer puro ver aquilo resolvido em três tempos, com toda a gente a lançar os seus dados em simultâneo e a olharmos todos com expectativa para os dados em cima da mesa para perceber o que se tinha passado. A mecânica é de facto brilhante.

A ideia base, como bem sabes, é toda a gente chegar a acordo sobre o que quer fazer, e depois fazerem em simultâneo os seus rolls; cada roll serve ao mesmo tempo de iniciativa e de resolução da acção. Assim se o cavaleiro 1 conseguir agir primeiro que todos pode ser que os dados cheguem para dar uma sova no cavaleiro 2 (que pode abortar a sua própria acção de ataque para se defender, ou mantê-la na esperança de não ficar fora de acção com este primeiro golpe) antes de mais nada, ou se a princesa for primeiro cada um dos cavaleiros vai ter de alterar a sua acção, nem que se seja apenas para fazer primeiro um roll para ver se consegue bater no outro através dela (usando o grau de sucesso dela como penalização neste roll), com o sucesso ou falhanço desse roll a dar bónus/penalizações (ou até a impedir completamente o segundo roll para o ataque) ao ataque que faz então através dela, etc. As possibilidades são quase ilimitadas. É muito fixe.

Acho que o conceito é facilmente transportável para a maioria dos jogos, se é que eles não são já capazes de lidar com algo assim por si mesmos.

Num sistema de iniciativa por rounds aconteceria algo parecido. O cavaleiro que conseguir agir primeiro pode inutilizar a acção que o outro queria fazer porque este opta por se defender (pelo menos acho que em muitos jogos se alguém se quiser defender activamente gasta a sua acção do round nisso) ou então simplesmente porque o deixa incapaz, ou ferido, ou algo. E se a princesa conseguir agir primeiro, a sua acção torna os ataques dos cavaleiros mais difíceis porque têm de a ultrapassar a ela; nem todos os sistemas deixariam que o grau de sucesso da princesa influenciasse directa e proporcionalmente o grau de dificuldade que os cavaleiros precisam de superar para se baterem, mas pelo menos nenhum sistema é tão rígido assim que não permita ao GM obrigar os cavaleiros a superarem o obstáculo “princesa” para baterem no gajo do outro lado dela.

Desde o início que os sistemas de regras tentam impôr ordem aos caos do combate que na vida real acontece quase em simultâneo; acho que ao fim de 30 anos disto serão poucos os que não permitem de alguma forma resolver algo assim… seja de forma mais ou menos elegante, ou com mais improviso ou não.

[quote=ricmadeira]A ideia base, como bem sabes, [/quote]Ya, bem lembrado! Já li duas vezes Sorcerer, mas, como nunca experimentei, ainda não tenho uma ideia na prática dessa flexibilidade do sistema.

Como tu disseste, as coisas complicam-se nos casos em que as regras não usam um lançamento para defender (ex: D&D), mas também se pode lidar com a princesa como se ela desse cover :) apesar de me parecer estranho.

De qualquer forma, este é o tipo de situação em que sistemas mais integrados (ex: stakes resolution) conseguem não perder o fio à meada e aproveitar a tensão da princesa poder ou não ser atingida por um dos cavaleiros.

Se for resolvido acção-a-acção e quiseres incluir a possibilidade de um ataque falhar, mas ainda poder acertar nela, mas ainda o outro a defender... são muitos lançamentos. Acho que mesmo em Sorcerer teria que se lançar duas vezes.

Sistema XPTO

Knight 1 tenta atingir knight2.
Princesa mete-se ao barulho para impedir q o ataque acerte.
Princesa tenta não ser atingida.
knight1 tenta evitar atingir princesa.
knight2 tenta proteger a princesa.
Princesa tenta não ser retirada do caminho pelo knight2.

Todos rolam contra todos e também para evitar atingir a princesa.

R representa o risco da princesa ser atingida.

Resultados:
K1 vs K2 - Se o ataque sem interferencias acerta ou não
K1 vs P - Se a princesa bloqueia ou não o ataque
K1 vs R - Se o atacante evita ou não colocar a princesa em risco
P vs R - Se a princesa se coloca a si em risco ou não
K2 vs P - Se o defensor retira a princesa da confusão ou não
K2 vs R - Se o defensor coloca a princesa em risco ou não

Aí tens todas as possiveis combinações.

Isto não muda muito dependendo dos valores serem rolados ou serem fixos. O que muda realmente é se se usa o mesmo valor para cada lado do conflicto em todos os rolls desse lado ou se cada lado muda de valor de roll para roll.

Claro que com uma mecânica de FitM e um valor para cada um dos lados resolve isto com resultados abstractos ou definidos na altura com base nos valores finais dos lançamentos! :wink:

Portanto, tens um conjunto de acções “activas” - os cavaleiros que tentam cortar as goelas um ao outro - e outro conjunto de acções passivas - a princesa que não faz mais nada a não ser meter-se no meio deles. A partir daqui podes dizer que:

a) Aumento de dificuldade em todos os Roll to Attack. Motivo: A princesa está à frente, e atrapalha os teus movimentos. Além disso, ninguem a quer atingir (se um deles nao se importar de a cortar ao meio, bom… tem a tarefa facilitada em 50% :stuck_out_tongue: e podes dizer que a princesa apanha com metade do dano que ele eventualmente infligir )

b) Bonus à Defense: Da mesma forma que atrapalha, ela tambem protege cada um dos cavaleiros. Pode-se atribuir um pequeno bonus à defense/AC/Dodge de cada um - mas atenção! estamos a contar 2x com a influencia da princesa… o bonus à defense não deve ser mto alto, apenas deve dar flavour ao combate.

c) Decididos os bonus/penalidades consequentes das acções passivas da princesa, é altura de tratar das activas. Os cavaleiros rolam iniciativa, e com todos os bonus/penalidades, tentam cortar as goelas um ao outro.

Simple.

[quote=Aramoro]Simple.[/quote]Sim, assim as coisas ficam mais simples, tendo em conta que se está a ignorar o facto dos cavaleiros se tentarem mover à volta dela antes sequer de atacarem. Em vários RPGS, existe um determinado movement rate que pode ser usado independentemente do atack bonus. No exemplo que dás, as duas coisas são integradas num só lançamento.

Sim, estao integradas num só lançamento. Não porque ignorei os movimentos possíveis dos cavaleiros, mas sim porque contabilizei o facto de que, mesmo que eles se movam, a princesa vai mover-se correspondentemente de forma a bloquea-los. Logo, isso está contabilizado no aumento de dificuldade que eu, caso fosse o GM, aplicaria nesta situação.

Se realmente for necessário/for obrigatório utilizar movement rates (sejam ft/turn, hexágonos ou quadrados), aí o caso complica-se. Porque deixas de poder considerar parte das acções como passivas, e és obrigado a tomar decisões turno-a-turno, consoante a ordem de iniciativa.

Alias, bem vistas as coisas, se metermos movement rates e iniciativas, tal situação nunca ocorre:

Princesa: “Eu meto-me entre eles os dois”
rolam iniciativas
Cavaleiro 1: "Bom, eu ganhei iniciativa, movo-me 1 quadrado para o lado, e outro em frente, de forma a atacar o meu oponente sem a interferência da princesa*
slash, crash, cry, bang
Cavaleiro morre e princesa sente-se inutil por ter um baixo valor a iniciativa

K.I.S.S.

Who the fuck cares!

Estamos a tentar simular o que? O sexo dos anjos em pormenor hardcore triple-X?

Filhos, a princesa apanha um estoiro nas fronhas e ficam os dois cabaleiros com um melão da porra a olhar para a desgraçada de olho ao peito. Good enough?

[quote=Warman]Who the fuck cares![/quote]Ya, eu também não sou particularmente adepto de simular tudo ao pormenor, mas a questão parte desse pressuposto. Pega nela, se quiseres.

"Se alguma vez sou coerente, é apenas como incoerência saída da incoerência." Fernando Pessoa

Cá para mim esta é uma pergunta quanto a uma situação cinemática. Por isso faz tanta espécie tentar arranjar uma solução para os outros jogos, visto que eles não contemplam regras de cinemática (leia-se "à cinema").

Cá para mim, se quiserem fazer algo como isto num jogo como D&D (onde todos concordamos que pura e simplesmente não dá), o melhor é agir sem regras, negociando cada momento entre os intervenientes. É uma situação de stress emocional, e como o sistema não a consegue simular, temos de improvisar. Stress da princesa que não quer que os cavaleiros se magoem, stress dos cavaleiros que não querem magoar a princesa mas se querem magoar um ao outro.
Até agora ainda não vi nenhum sistema que pudesse resolver isto bem (OK, PTA consegue mas é um sistema de resolução de cenas e não acções), mas se se quer mesmo ir em frente com isto, acho que a princesa pode ser representada por modificadores ao ataque e defesa dos combatentes. Dependendo do que se está a usar, assim serão os modificadores (D&D -ATT +AC; WoD penalty a atacar ou tentar called strikes; etc..) Pode-se tentar incluir as stats da princesa mas será dificil, visto guerreiros serem muito mais competentes para combate do que donzelas.

Isto tá-me a dar ideias... Prestige class Damzel in Distress... Feats do género meter-se á frente dos lutadores, encantar todos com o seu sofrimento... Talvez assim a populaça se acalme nestas situações, porque já está nas regras!


Light allows us to see, Darkness forces us to create...

 

E obtive estes comentários. Espero que ajude.

 

--~~--

To crush your enemies, to see them driven before you, and to hear the lamentations of their women.
-Noddy, Lord of Darkness