Stakes resolution e Character Knowledge

Na passada sessão de Exalted 2nd Ed. (27-08-2006) decidimos remover o Stakes Negotiation que havia sido inserido desde a primeira sessão.

Uma das razões disto esteve relacionado com certos poderes existentes no jogo que permitem ao jogador saber as verdadeiras intenções de alguém com quem está a inter-agir, no fundo dar o conhecimento sobre os stakes em jogo do lado da outra personagem.

À primeira vista isto das duas uma, ou torna o poder inválido e desnecessário ou torna os stakes desnecessários.

Comecei a pensar mais no assunto, até porque muitos destes poderes ou habilidades não existem apenas em Exalted mas em também muitos outros jogos que não recorrem ao stakes negotiation como parte integrante da resolução de acções, e que pelos vistos inviabilizam o uso desta técnica.

Embora existam estes poderes estão apenas funcionam no campo do conhecimento do personagem, não do jogador, ou seja, o que eles fazem é dar a conhecer ao personagem as verdadeiras intenções da outra personagem com quem interage, enquanto que o stakes negotiation dá ao jogador. Visto estas duas entidades serem distintas será que se invalidam assim tanto as duas coisas?

Exemplo: Conflito armado
Cenário: NPC combate com um PC
Stakes: se o NPC ganhar o combate ele propositadamente apenas fere o personagem em vez de o matar (visto ele fazer parte da resistência), se o PC ganhar ele mata o NPC mostrando a sua supremacia perante o império rival.

Aqui tanto o jogador como o GM sabem o que está em jogo quando o conflito ocorre, mas o PC não, ele não sabe que o NPC apenas o pretende ferir porque faz parte da resistência e não pode agir sobre isso. Contudo depois de usar um "poder" o personagem passa a saber isso sobre o NPC, agora o jogador pode pensar como é que o PC se sente com essa informação e como é que irá reagir.

Não sei se isto faz muito sentido, por isso gostava de saber a vossa opinião.

Pessoalmente usar stake negotiation em jogos extremamente virados para task resolution parece-me um bocado peixe fora de água, mas desde que li sobre uma sessão inteira de TSoY que foi jogada em BDTP (task resolution) e como gosto de fazer estas experiências, queria mesmo ver se é válido e funcional ou não.

"the drunks of the Red-Piss Legion refuse to be vanquished"

Alguns pensamentos disconexos:

-Task Resolution, como eu entendo, e como o nome indica, já tem stakes incluídos: ou a task é bem sucedida ou não, simples. Ir mais longe do que isso, entrar no ganhar/perder algo, já é Conflict Resolution.

-As stakes não precisam de ter uma stake “perdedora” específica; não conseguir a stake “ganhadora” basta perfeitamente. Simplesmente a maioria dos jogos que usam o Conflict Resolution costumam ter uma stake perdedora que vai além disso, para aumentar ainda mais o interesse e a antecipação, para haver algo mais em jogo.

-Não precisam de definir tanto as stakes ao ponto de “o NPC X faz-te isto”. Basta um “acontece-te isto”. Em muitos destes jogos, a narração da forma como a stake que o dado ditou se torna real é metade da diversão. Imagina que perdeste o conflito e que a stake dita que vais ficar ferido: quem narra a Stake pode descrever que te feriste a ti próprio, que quase derrotaste o vilão mas um dos capangas dele te feriu à traição, que o vilão foi muito superior e te feriu, etc; as possibilidades são quase ilimitadas. Deste modo, o GM não precisa de revelar a forma exacta como o PC perde o conflito até o jogador de facto o perder; isto ajuda a manter parte do suspense até mesmo depois dos dados ditarem o resultado.

-Quando as stakes são negociadas, é impossível ter algo que não se deseja. Se uma das stakes vai por caminhos onde não se quer ir… é só escolher outra melhor!

Não creio que este poder permita ao JOGADOR saber, mas sim ao PERSONAGEM. E a diferença? Apenas tem a ver com a onda com que o pessoal nesse grupo está a jogar.

TSoY está cheio de exemplos de habilidades que permitem ao personagem saber coisas que nas minhas sessões os jogadores já sabem… Sense Danger, Discern Truth, etc.

E porque é que é uma questão de onda?

Imagina esta situação que aconteceu numa sessão minha de TSoY:

O Duval e a Moyna estão a dar um passeio romantico pela floresta ao luar. Eu viro-me para os JOGADORES e digo que está um grupo de cinco soldados amenitas a preparem-se para os embuscar. O que é que fazem? Nesta situação, o João, jogador do Duval, disse que queria ver se o Duval os topava, portanto partimos para um conflito, neste caso Sense Danger vs Stealth e a situação desenrolou-se a partir daí.

Agora, a verdadeira pergunta é quais foram as motivações do João para os querer ver e não ser embuscado. Na minha humilde opinião, foram claramente vicio. Os João está habituado a proteger o personagem de cenas más que lhes possam acontecer não ponderou a questão que devia ser mais importante tendo em conta a onda com que a gente está jogar:
O que é que é mais interessante para mim e para o resto do grupo? A gente abafar mais um grupo de amenitas? Ou se calhar eles embuscarem-nos e capturarem a Moyna ou o Duval, ou mesmo os dois daria uma situação mais interessante? É tudo uma questão de onda (ou CA em forgês).

Voltando ao teu ponto inicial que este rambling acabou por sair um pouco off-topic. Stakes Negotiation parte do principio que os jogadores sabem tudo o que têm a saber e que a informação que os personagens têm é diferente daquela que os jogadores têm. Não vejo o porquê de poderes como esse invalidarem o uso de stakes negotiation. Só tem a ver com o que o pessoal quer do jogo.

Agora, quando dizes que Stakes Negotiation não funciona em Task Resolution, concordo contigo. Ainda há pouco tempo tive uma conversa sobre isso com o João. Mas! Em jogos task resolution, a parte detalhada de resolução normalmente está englobada num conflito sub-entendido - Podes usar stakes resolution para o conflito, e usar simple task resolution para a parte detalhada da resolução do conflito. Exemplo do teu combate em cima:

Vai haver um combate entre um NPC e um PC. Quando entram em combate, há ai claramente um conflito - ambos querem ganhar. Podes negociar os stakes aqui, apesar de não haver um roll apenas que decida os stakes. Depois partes para resolução detalha em Task Resolution (ver quem acerta, quanto dano dá, etc) e no fim da resolução detalhada tens claramente um vencedor do conflito - aí aplicas os stakes negociados para o conflito.

Hoy, :)

[quote=Ralek]Agora, a verdadeira pergunta é quais foram as motivações do *João* para os querer ver e não ser embuscado. Na minha humilde opinião, foram claramente vicio. Os João está habituado a proteger o personagem de cenas más que lhes possam acontecer não ponderou a questão que devia ser mais importante tendo em conta a onda com que a gente está jogar:
O que é que é mais interessante para mim e para o resto do grupo?[/quote]

Beuf! Tás-te a lembrar mal. ;)

O que aconteceu foi que tu perguntaste para onde é que a gente queria ir, e nós mandámos uma de, ya, emboscada e bute ver o que acontece. Se nós os topávamos ou não, para mim, era igual, e provavelmente, até teria curtido sido emboscado. O que estava na mesa perante os jogadores era se queríamos interagir com os amenitas ou se queríamos ir para outra.

[quote=Ralek]Stakes Negotiation parte do principio que os jogadores sabem tudo o que têm a saber e que a informação que os personagens têm é diferente daquela que os jogadores têm. Não vejo o porquê de poderes como esse invalidarem o uso de stakes negotiation. Só tem a ver com o que o pessoal quer do jogo.[/quote]

Já isto, subscrevo total e completamente, como aliás era de esperar. :)

[quote=ricmadeira]-Task Resolution, como eu entendo, e como o nome indica, já tem stakes incluídos: ou a task é bem sucedida ou não, simples. Ir mais longe do que isso, entrar no ganhar/perder algo, já é Conflict Resolution.[/quote]

Mmmmaprox. Task Resolution pode ou não incluir Stakes ou pode ser puro Maneuver Resolution. Já agora, Conflict Resolution também. Por exemplo, um combate em D&D é Conflict Resolution com Maneuver Resolution.

[quote=ricmadeira]-As stakes não precisam de ter uma stake "perdedora" específica; não conseguir a stake "ganhadora" basta perfeitamente. Simplesmente a maioria dos jogos que usam o Conflict Resolution costumam ter uma stake perdedora que vai além disso, para aumentar ainda mais o interesse e a antecipação, para haver algo mais em jogo.[/quote]

Inteiramente verdade. Dogs, por exemplo, pelas regras, nem sequer é para ter counter-stakes. Isto acontece, no entanto, porque é virtualmente impossível "não acontecer nada" como resultado de um conflicto, quanto mais não seja, em termos de fallout. Noutros jogos, no entanto, é boa ideia entrar na onda de ir buscar os counter-stakes, só para não cair no boring default de, ya, se falhares, não acontece nada. Depende do jogo.

[quote=ricmadeira]-Não precisam de definir tanto as stakes ao ponto de "o NPC X faz-te isto". Basta um "acontece-te isto". Em muitos destes jogos, a narração da forma como a stake que o dado ditou se torna real é metade da diversão.[/quote]

Subscrevo. E mesmo em jogos sem narração partilhada, isto continua a aplicar-se.

[quote=ricmadeira]-Quando as stakes são negociadas, é impossível ter algo que não se deseja. Se uma das stakes vai por caminhos onde não se quer ir... é só escolher outra melhor![/quote]

E esta é a cena importante de stakes negotiation. É fundamental distinguir dois tipos de "não se deseja":
a) Não, não quero isto, vou ficar completamente entalado
b) Não, não quero isto, é blah...
(a) é bom, (b) é mau... :)

Não queria, entretanto, deixar de comentar esta parte:

[quote=RedPissLegion]Aqui tanto o jogador como o GM sabem o que está em jogo quando o conflito ocorre, mas o PC não, ele não sabe que o NPC apenas o pretende ferir porque faz parte da resistência e não pode agir sobre isso. Contudo depois de usar um "poder" o personagem passa a saber isso sobre o NPC, agora o jogador pode pensar como é que o PC se sente com essa informação e como é que irá reagir.

Não sei se isto faz muito sentido, por isso gostava de saber a vossa opinião.[/quote]

Isto faz total e perfeito sentido, e é uma maneira de dar ao jogador um grounding para mudar de intenções (leia-se mudar de stakes). Existem mil maneiras de prosseguir a partir daqui, todas elas com potencial para serem interessantes.

A meu ver, não há qualquer impedimento entre esse(s) poder(es) e o conceito de stakes negotiation. :)

Cheers,
J.

Um áparte para apoiar esta afirmação - isto fazia parte daqueles velhinhos conselhos para apimentar o D&D que alguém postou na Forge. Dar stakes ao combate para além de “ganhas” ou “perdes”.

Não só é possível decidir stakes antes de entrar em task resolution, é (para mim) uma excelente maneira de melhorar um jogo baseado nessas técnicas (“tradicional”) sem mexer demasiado com o sistema ou com o que os jogadores estão habituados.

Pelo menos comigo funcionou :slight_smile:

JP

Quando pensei em meter Stakes Negotiation em Exalted tinha acabado de chegar de uma semana de rpg onde tudo fazia sentido. Os Stakes em TSoY fazem sentido, porque se resolve o conflicto, os Stakes em Exalted fazem menos sentido, porque aquilo que se faz fora do imaginário (discussão entre jogadores e gm) é aquilo que devia acontecer dentro do imaginario (no caso, o combate social entre pc's e npc's), e esta é uma diferença extremamente grande e importante; fazem menos sentido também porque se resolve o pormenor, em vez do todo (maneuver vs conflict resolution, ou algo do género).

Imaginemos o seguinte, que até é bem próximo do que me levou a decidir por abandonar os Stakes:

Situação: jogadores estão no Lapis Court a conversar com a Lady Neshi*, para obtenção de favores militares. Esta situação aconteceu mesmo, embora as palavras não sejam exactamente estas.

GM: Ok, estão sentados à mesa com os Fair Folk, podem iniciar as hostilidades. O que é que querem deles?
Inês: Nós queremos que eles nos ajudem com um exército.
GM: Ok, vocês querem isso, eles querem que vocês sirvam como escravos deles durante um ano.
António: Epá, isso é demais. Desisto.
Inês: Hey, não podes baixar os Stakes?
GM: Posso; que tal isto: eles ajudam-vos militarmente, mas vocês vão à frente do exército a dizer a toda a gente que foram vocês que pediram a ajuda deles. Parece bem?
Todos: Não, é muito pesado, não queremos.

Resultado: no dia seguinte, montes de àrvores digitais foram mortas para alimentar todas as mensagens sobre Stakes. Eu achei que a discussão tinha sido boa, faltando apenas entrosamento na negociação, mas também fiquei com um sabor amargo na boca, pois pareceu-me que tudo o que tinha sido discutido poderia fazer já parte da mecânica do combate social; a troca de argumentos entre jogadores e gm devia ser a troca de argumentos entre pc's e npcs, como referi acima. Alguém disse: "o meu problema n é deixar de usar os stakes, mas sim primeiro percebe-los, e saber até onde posso ir com eles", o que eu traduzo como "stakes não são quantificáveis, ainda não sei como posso ganhar sempre ao usá-los". Tudo isto me levou a pensar durante a semana que o que eu julgava ir introduzir liberdade de escolha aos jogadores, na verdade estava a limitá-los mais.

Situação: os jogadores acabam de chegar à tenda do Saloy Hin e querem convencê-lo a pedir o comando do seu exército. Esta foi a situação que nos levou a não usar stakes, e reproduzo-a aqui já sem eles; mais uma vez, as palavras não são exactamente estas, mas o resultado é.

GM: Vocês querem o exército do gajo, né? Rolem iniciativa.
*todos rolam, começam a fazer ataques sociais*
Padeira (como SeilSya): General, você está aqui com o seu exército porque se recusou a voltar à Ilha Sagrada, e quer aumentar o seu exército. Nós achamos que podemos ter uma excelente colaboração entre todos, nós e o seu exército, mas que este podia ser melhor gerido por nós. *rola dados, passa o Mental Defense Value (MDV)*
GM (como Saloy Hin): *gasta 1 de Willpower (WP) para resistir* Sim, claro vocês têm razão... mas o que estou a dizer? Não, este exército é meu, e será aumentado com mais Dragon-Blooded, e só teria a beneficiar se tivesse 4 solares nos seus ranks. Vocês deviam juntar-se a nós e trabalhar sobre as nossas ordens. *GM rola dados, passa o MDV do perso do Padeira*
Padeira (como Seilsya): *gasta 1 de WP* General, isso não vai acontecer. Lembre-se que na 1ª Era os DB's trabalhavam para os solares, não em conjunto *1º ataque social*, e além disso você precisa de nós para limpar aquela Manse** e aceder a tudo o que está lá dentro. Você precisa de nós, não o contrário *2º ataque social*.
GM: *gasta 1 de WP, não pode gastar mais e é convencido* Bom, rendo-me às evidências e à sua eloquência. Desde que eu possa continuar no comando do exército, vocês podem contar com a minha colaboração.

Resultado: Tudo foi feito usando as regras que já existiam sem introdução de regras novas; toda a gente sabia as regras e como as usar em seu benefício. A negociação foi feita usando as abilidades dos PC's e NPC's (todo o combate social podia ter sido feito com: "eu quero convencê-lo disto e daquilo", em vez de todo aquele floreado, mas o floreado é mais giro), e não a capacidade negocial dos jogadores e gm. Pode preparar-se o perso para isso e resolver as coisas dentro do combate social, o que faz muito mais sentido para o jogo que estamos a jogar, e para a maneira como o jogamos.

Depois disto, sei que agora há nas regras de Exalted ferramentas mecânicas que permitem o input criativo dos jogadores (pedir cenas para recuperar WP, delinear objectivos, recompensados com XP quando atingidos), que foi o que me levou a introduzir os Stakes no jogo, e que só por isso já não fazem falta lá. A haver problemas no grupo e não haver diversão, e esta não-diversão ter sido causada por um elemento exterior ao jogo, prefiro que seja este a sair (em vez de tirar o Charm, como sugerido pelo RPL).

Não considero ter sido um erro apresentar os Stakes a este grupo; foi errado introduzir desta maneira e com este jogo. Se fossemos jogar TSoY, não saímos daqui até termos os Stakes bem sabidos, ou desistíamos do jogo e passávamos à frente. Neste momento, toda a gente está a gostar do Exalted, todos exploram uns e/ou outros elementos do jogo, e todos querem ver o seu personagem a desenvolver-se além da 6ª sessão. Por isso, Stakes out, fun in.

*Fair Folk em Exalted são o equivalente ligeiramente menos poderoso ao Grande Cthulhu na Terra (alienigena e incompreensível), com a diferença que os humanos em Exalted roubaram a casa às fadas, o que as deixou ligeiramente incomodadas.

**uma Manse é o equivalente a Jerusalém nas Cruzadas, com a diferença que há várias e o poder é real.

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Alguém muito sábio disse uma vez: "So, Trebek, we meet again! The game's afoot!"

Ou seja, até concluiste que o sistema está bem pensado para o que faz e não precisa de tanto drifting! :P :D

"Se alguma vez sou coerente, é apenas como incoerência saída da incoerência." Fernando Pessoa

Rui, acho que estás a fazer uma ENORME confusão entre Stakes e a maneira de resolver o conflicto. As duas são fundamentalmente independentes.

No teu exemplo em que dizes que não usas stakes:

Declaração de Stakes para se eles ganharem o conflito.

O que se segue é a maneira como o conflito foi resolvido:

Eles ganharam, portanto os stakes de ganhar o conflicto entram. O que acontecia se eles perdessem o conflicto? O que quer que acontece-se era da TUA unica responsabilidade. Mesmo que o que acontece-se fosse apenas eles não conseguirem o que queriam, ISSO são as stakes de falhar o conflicto. Vamos lá ver… a não ser que a cena seja fluff (não tenha qualquer consequencia) há sempre consequencias de ganhar ou perder um conflicto (independentemente da maneira como se resolve). A unica coisa que stakes negotiation faz é a decisão das consequencias sair da responsibilidade exclusiva do GM e passar a ser da responsabilidade de todos.

Gostava que dissesses exactamente o que teria acontecido em jogo se o Saloy Hin tivesse ganho o conflito.

Acho que os problemas que estás a ter com stakes negotiation devem-se a uma confusão entre stakes negotiation e metodo de resolução de conflictos e os stakes que têm sido avançados por ti terem pouco suporte face à situação (disconnect esse que também aconteceu um par de vezes durante o retiro em TSoY, se bem te lembras).

Oi, :)

Eh... <blink> <blank stare> <blink> ...

Ok. Aviso: vou pontificar. Vou fazê-lo porque, (a) gosto, e (b) pode ser útil a alguém. No entanto. Disclaimer: algumas das coisas que vou dizer aqui, só me apercebi muito recentemente. Não fiquem com a ideia que sou o guru de stakes negotiation, ou que se não fizerem o que eu digo vou achar que estão a jogar mal, ou outra imbecilidade qualquer...

But first, some homework:
1) Este thread meu na Forge, já antigo
2) Este outro thread na Forge, mais recente
3) Este thread no Story Games, mais comprido

Ok. Now that that's over with, gostava de repetir algo que disse upthread:

[quote=JMendes]É fundamental distinguir dois tipos de "não se deseja":
a) Não, não quero isto, vou ficar completamente entalado
b) Não, não quero isto, é blah...
(a) é bom, (b) é mau... :)[/quote]

Ponto Primeiro: Stakes Negotiation vs Character Ownership

[quote=Rui]Inês: Nós queremos que eles nos ajudem com um exército.
GM: Ok, vocês querem isso, eles querem que vocês sirvam como escravos deles durante um ano.
António: Epá, isso é demais. Desisto.
Inês: Hey, não podes baixar os Stakes?[/quote]

Gostava de perceber de onde é que isto vem. Minha opinião, o que se verificou à mesa nesta ocasião foi exactamente o mesmo que aconteceu na nossa sessão de TSoY no link #1 acima, nomeadamente, uma reacção instinctiva motivada por issues de character ownership.

Hipotética, com uma alternativa da minha autoria a bold:

[quote=Rui]GM: Vocês querem o exército do gajo, né? Rolem iniciativa.
*todos rolam, começam a fazer ataques sociais*
Padeira (como SeilSya): General, você está aqui com o seu exército porque se recusou a voltar à Ilha Sagrada, e quer aumentar o seu exército. Nós achamos que podemos ter uma excelente colaboração entre todos, nós e o seu exército, mas que este podia ser melhor gerido por nós. *rola dados, passa o Mental Defense Value (MDV)*
GM (como Saloy Hin): *gasta 1 de Willpower (WP) para resistir* Sim, claro vocês têm razão... mas o que estou a dizer? Não, este exército é meu, e será aumentado com mais Dragon-Blooded, e só teria a beneficiar se tivesse 4 solares nos seus ranks. Vocês deviam juntar-se a nós e trabalhar sobre as nossas ordens. *GM rola dados, passa o MDV do perso do Padeira*
Padeira: Epá, isso é demais. Desisto.[/quote]

Porque é que o jogador decidiu acatar as acções tentadas pelo GM em vez de protestar contra a tentativa, como o fez acima? Porque no exemplo acima, o jogador estava a negociar, e no exemplo abaixo, estava a jogar. Se o jogador estava a falar a sério em termos de não querer esses stakes como jogador, seria de esperar que protestasse como na hipotética. Se não o fez, isso leva-me a querer que o jogador apenas não queria esses stakes como personagem.

Nesse caso, em vez de "Epá, isso é demais. Desisto.", deiva ter dito "Epá, isso é demais. Vou-me bater tudo por tudo para não acontecer! Que é dos dados, dêem-me dados!"

Ponto Segundo: Stakes vs Intentions

Outra hipotética (again, o bold é meu):

[quote=Rui]Inês: Nós queremos que eles nos ajudem com um exército.
GM: Ok, vocês querem isso, eles querem que vocês sirvam como escravos deles durante um ano.
António: Epá, isso é demais. Desisto.
Inês: Hey, não podes baixar os Stakes?
GM: Não, estas são as intenções do NPC. Podes desistir à vontade. Ele não vai desistir. Rola.[/quote]

Em oposição a:

[quote=Rui]Inês: Nós só queremos ver as vistas...
GM: Ok, enquanto vocês vêem as vistas, aparece um gajo a tentar escravizar-vos durante um ano.
António: Epá, isso é demais. Desisto.
GM: Er... desistes de quê, exactamente...?[/quote]

A onda de balancing counter-stakes é um exercício de fairness e de interesse. Serve para não surgirem cenas como estas:

[quote=Rui]Inês: Nós queremos que eles nos ajudem com um exército.
GM: Ok, vocês querem isso, eles querem que vocês sirvam as bebidas no bar esta noite.
Players: Er... meh, whatever... se a gente servir as bebidas à mesma, podemos ter o exército?
[/quote]

Basicamente, nada obriga os counter-stakes a serem minimamente equilibrados. Apenas têm que ser interessantes para toda a gente. Acontece que pensar em intenções equilibradas para os NPCs é um bom ponto de partida para chegar a stakes interessantes.

Mas. A partir do momento as intenções dos NPCs estão determinadas, estão determinadas! (Nota: determinadas = anunciadas à mesa; até lá, o GM pode gerir a "realidade" conforme lhe fôr mais útil ou interessante para o jogo.)

Isto significa que "eu desisto" não é particularmente útil para os jogadores. Nada impede o NPC de tomar a iniciativa e partir ele para o conflito. Da mesma forma, implica que o GM não deve nunca usar counter-stakes para levar os jogadores a desistirem das suas intenções, e implica que os jogadores devem confiar em que a intenção do GM com aqueles counter-stakes agressivos não é levá-los a desistir, mas sim, encontrar um conflito interessante.

Por exemplo, o meu primeiro impulso seria apresentar counter-stakes de o dito exército se juntar ao inimigo... :)

Ponto Terceiro: Drift.

Ya. Também já tentei, nomeadamente durante a minha actual campanha de D&D.

Basicamente, drift tem os seus problemas. Às vezes, uma ideia que parece óptima no papel e parece funcionar em primeira análise revela ter consequências inesperadas a long prazo e acaba por ter que ser abandonada.

Aqui entra o ponto três do Fun Now: play with rules you like.

Ao que parece, os jogadores do vosso grupo estavam virados para um tipo de jogo que stakes negotiation não suporta muito. So, cool deal, foi uma tentativa. Não concordo contigo quando dizes que foi um erro. Aprendeste qualquer coisa, e ao partilhá-la connosco, nós (ou eu) também. Quando os introduziste, melhoraste o jogo. Quando os retiraste, melhoraste o jogo outra vez. (How's that for an apparent contradiction?)

Go Play! :)

Olá Rogerio, obrigado pelos teus comentários.

Quanto à tua questão: se o Saloy Hin tivesse ganho o conflito, aconteceria algo determinado por mim, e que seria completa surpresa para os jogadores. Temos todos perfeita noção disso.

Não julgo que houvesse alguma vez disconnect da situação - para quem conhece o setting de Exalted, um Fair Folk pedir alguém como escravo durante um ano (principalmente pedi-lo a um campeão dos deuses) é normal, como seria normal o mesmo Fair Folk dar-lhes o coração de 20 poetas só porque está apaixonado por um deles, ou em vez de lhes dar o exército para ajudar na conquista de uma cidade, enviarem eles o exército e dizimarem tudo - o que houve foi uma escalada da minha parte que não era de maneira nenhuma aquilo que os jogadores poderiam esperar à partida; apesar de insistentemente lhes dizer como fazer (negociar pareceu-me mal, sugeri regatear, deu no mesmo), as dificuldades continuaram. Por isso, retirei o que tinha posto.



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Alguém muito sábio disse uma vez: "So, Trebek, we meet again! The game's afoot!"

[quote=JMendes]Ponto Primeiro: Stakes Negotiation vs Character Ownership

[quote=Rui]Inês: Nós queremos que eles nos ajudem com um exército.
GM: Ok, vocês querem isso, eles querem que vocês sirvam como escravos deles durante um ano.
António: Epá, isso é demais. Desisto.
Inês: Hey, não podes baixar os Stakes?[/quote]

Gostava de perceber de onde é que isto vem. Minha opinião, o que se verificou à mesa nesta ocasião foi exactamente o mesmo que aconteceu na nossa sessão de TSoY no link #1 acima, nomeadamente, uma reacção instinctiva motivada por issues de character ownership.[/quote]

É inteiramente possível; aliás, julgo que já mencionei isso algures - se não aqui, pelo menos no forum de Exalted.

[quote=JMendes]Ponto Terceiro: Drift.

Ya. Também já tentei, nomeadamente durante a minha actual campanha de D&D.

Basicamente, drift tem os seus problemas. Às vezes, uma ideia que parece óptima no papel e parece funcionar em primeira análise revela ter consequências inesperadas a long prazo e acaba por ter que ser abandonada.

Aqui entra o ponto três do Fun Now: play with rules you like.

Ao que parece, os jogadores do vosso grupo estavam virados para um tipo de jogo que stakes negotiation não suporta muito. So, cool deal, foi uma tentativa. Não concordo contigo quando dizes que foi um erro. Aprendeste qualquer coisa, e ao partilhá-la connosco, nós (ou eu) também. Quando os introduziste, melhoraste o jogo. Quando os retiraste, melhoraste o jogo outra vez. (How's that for an apparent contradiction?)[/quote]

Não disse que tinha sido um erro apresentar Stakes Negotiation ao grupo, disse que tinha sido um erro apresentar desta maneira e com este jogo.

Este drift destinava-se única e exclusivamente a dar-lhes mais poder de decisão; ao longo do tempo e confrontado com as suas dúvidas e problemas, fui investigando cada vez mais as regrazinhas obscuras, e descobri lá várias, que são muitas vezes descuradas (não vejo as pessoas a falar sobre elas na rpg.net, por ex), mas que já fazem isso, o que para mim é absolutamente excelente. Talvez se no futuro jogar TSoY com eles, a experiência de o jogar seja mais facilitada pela bagagem que levarmos do Exalted. :slight_smile:


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Alguém muito sábio disse uma vez: "So, Trebek, we meet again! The game's afoot!"

Não foi erro teu! Eu é que há uns dias tinha mudado um destes comentários de posição porque o haviam feito no sítio errado. A operação foi mal feita, o que acabou por lixar o esquema dos comentários posteriores. Já corrigi e deixei todos os comentários devidamente ordenados. Obrigado pela paciência!

Primeiro que tudo, obrigado por fugires ao meu pedido de dizeres ESPECIFICAMENTE o que acontecia :slight_smile:

Eu sei que estou a misturar as duas coisas mas, ursa comigo, incluindo eles servirem como escravos durante um ano, certo?

Porque é que os teus jogadores, sabendo à partida o que pode acontecer não estão dispostos a ir a conflito, mas não sabendo e não tendo qualquer controle sobre o que acontece se perderem já estão? Isto não é uma pergunta retórica, está-me MESMO a fazer muita confusão.

Quando falei de disconnect foi em relação à SITUAÇÃO especifica. Vou dar um exemplo de disconnect para tentar ilustrar o meu ponto. Mundo real, setting de espionagem.

Jogador: Vou lá até ao bar tentar sacar a gaja.
GM: Ok, se falhares, ela saca de uma pistola e dá-te um tiro entre os olhos.
Jogador: huh?

Ora, no mundo real, é perfeitamente possível ela ter uma pistola e até “normal” ela ter razões para lhe dar um tiro entre os olhos - Não deixa de haver aqui um disconnect situacional nos stakes.