Não há nada como um bom confortante boardgame de colocar tiles. Há algo de especial em colocar tile atrás de tile atrás de tile. E quando o jogo é rápido mas ao mesmo tempo incrivelmente profundo então teremos nas mãos algo verdadeiramente especial. E esse é o caso com o Taluva.
Taluva, um jogo publicado pela Rio Grande Games, tem por objectivo os jogadores construírem três tipos de peças ao mesmo tempo que colocam tiles. O objectivo é construir totalmente dois dos três tipos de peças no jogo. Para tal um jogador primeiro saca um dos tiles e coloca-o em jogo e depois poderá construir cabanas, templos ou torres, cada um dos quais com regras especiais de colocação. O interessante é que os tiles podem ser colocados na vertical tanto como na horizontal através duma erupção vulcânica. É um jogo aparentemente simples e rápido.
Passemos à análise.
Em termos de apresentação temos aqui um boardgame bem bom. As regras são curtas, simples de entender e bastante fáceis de explicar. O manual está claro e conciso, logo não provoca dificuldades a ler. Os tiles são a estrela deste boardgame. Grossos como nada que já vi até hoje, feitos de cartão resistente e decorados com uma arte esplendorosa. Este é capaz de ser dos boardgames mais bonitos que tenho. As peças de madeira não são moldadas nas formas já tão conhecidas a eurogamers. Em vez, as peças são interessantes, moldadas como cabanas, templos e torres, e facilmente distinguidas umas das outras. O único senão é a caixa do jogo. Não é o insert, que acomoda todas as peças de maneira eficaz e organizada, mas sim o ar todo dentro da caixa. A caixa podia ser metade do tamanho e o jogo só beneficiaria disso. É um boardgame que merece uma caixa um pouco mais pequena, mas fora isso temos um jogo com uma excelente apresentação. Nada negativo a declarar.
O número de jogadores ideal é, basicamente, qualquer número entre dois e quatro. O jogo escala-se bem para qualquer número de jogadores, e este jogo a dois é bastante porco e lixado. Se quiserem um jogo que funciona bem com qualquer número de jogadores de dois a quatro, este é ideal.
Este jogo está entre um tema sólido e o puro abstracto. Apesar de qualquer tema poder ser usado neste jogo, o tema escolhido, o de grupos de nativos a popular a ilha, está bem escolhido e cola incrivelmente melhor do que eu pensava. Seria dificil explicar como os tiles seriam postos na vertical e erupções vulcânicas são uma boa explicação. Logo não é um jogo inteiramente abstracto, tem um tema que está decentemente colado e que pega e, como tal, os jogadores vão ter a ideia que estão de facto a popular a ilha de Taluva. Mesmo assim não é um tema que cola totalmente e sofre um pouco com isso. Mas é agradável de jogar e os jogadores não terão problemas a adaptarem-se ao tema. Nada mau para um eurogame.
Quanto a estratégia e táctica, temos aqui um jogo que nos engana. Ao abrir a caixa e ao ler as regras, um jogador seria desculpado ao pensar que este jogo não tem muito que se lhe diga. Quando se começa a jogar, no entanto, a conversa é outra. Este jogo revela-se solidamente táctico ao mesmo tempo que incrivelmente estratégico para o que é. E este jogo tem, de facto, muita estratégia, mas mesmo muita. Embora o foco do jogo seja a táctica, pois um jogador tem que pensar a curto-prazo, os mecânismos de colocação dos templos e torres aliados ao facto que quem construir todas as peças de dois dos três tipos de peças tornam este jogo fortemente estratégico. Um jogador tem que constantemente avaliar a sua posição e a melhor maneira de colocar uma peça agora de maneira a poder colocar outra peça nas próximas jogadas. No entanto o jogo não é mais estratégico devido à interferência humana. Uma erupção pode destruir várias cabanas e mudar o terreno do jogo, tornando inuteis os nossos planos de longo-prazo e obrigando-nos a repensar os nossos planos. Apesar disto, este jogo é mais estratégico do que as primeiras impressões podem provocar. Um jogo táctico com forte vertente estratégica, o que o torna agradável a quem queira um eurogame com uma boa dose tanto de tácticas como de estratégia.
O factor sorte está presente neste jogo duma só maneira, o sacar um tile. Os jogadores sacam um tile ao calhas sem saberem qual é, o que obriga os jogadores a adaptarem-se constantemente consoante os tiles são sacados. Fora isso, este jogo não têm mais sorte nenhuma nas suas mecânicas. Eu diria que este jogo têm menos factor sorte do que o Carcassonne, visto os tiles aqui não serem assim tão variados, o que ajuda os jogadores a tomarem uma decisão mais rapidamente.
A interacção entre jogadores é baixa e, como já foi referido, é feita através das erupções vulcânicas, que é como quem diz por um tile em cima de vários outros. Quando tal acontece pode acontecer que várias cabanas sejam destruidas, provocando um disturbio nos planos de vários jogadores. Isto implica que o jogo força os jogadores a constantemente estarem atentos uns aos outros e a aproveitarem oportunidades de estragar os planos uns dos outros. Outra interacção é na colocação das peças, pois o espaço neste jogo, pelo menos a principio, é sempre pouco e onde colocamos as peças vai influenciar os planos dos outros jogadores. Mas este jogo só tem interacção indirecta e, como tal, não irá agradar aos jogadores que gostam de negociações embora possa agradar aos jogadores que gostem de lixar os outros jogadores.
O tempo de jogo médio costuma variar entre os 20 e 30 minutos. É sem dúvida um jogo rápido que se joga sem problemas, mas não se deixem enganar pelo curto período de tempo, este jogo é muito mais pesado do que o que o tempo possa indicar.
O peso deste jogo é um middleweight. Este jogo não é leve, de maneira nenhuma, apesar de se jogar rapidamente. Este jogo obriga os jogadores a fazerem constantes decisões dificeis que influenciarão todos os jogadores. Aqui não há espaço para um jogo leve, este jogo é bem pesado para o que é e devido ao facto de nos obrigar a tomar decisões tensas e dificeis. Logo eu digo que este jogo se encaixa perfeitamente como middleweight e que, como tal, terá que ser abordado não como algo que se joga rapidamente mas como algo que nos irá fazer queimar o cérebro a pensar nas jogadas.
Quanto a ser um gamer’s game ou um filler, está muito mais próximo do gamer’s game do que do filler. De facto se este jogo tivesse uma ou outra mecânica para complementar as restantes mecânicas este jogo seria um gamer’s game que se jogaria em meia-hora. Mas tal como está é um jogo que se mais inclina e que tenta ser um gamer’s game. Não pensem que este jogo é um filler porque não é só porque se joga em 30 minutos.
A longevidade deste jogo é bem boa. Com o facto do tabuleiro ser sempre modular e diferente todos os jogos fica aberta a possibilidade de cada jogo ter uma configuração completamente diferente e, como tal, possibilidades diferentes também. O jogo em si não é mau mas com o tabuleiro modular o jogo torna-se muito mais apelativo de se jogar de novo. É um bom jogo com uma boa replayability, com o facto do seu tempo de jogo curto ajudar à sua longevidade. Sem dúvida se este jogo demorasse o dobro do tempo este jogo cansaria depressa mas tal como está os jogadores irão sempre jogar este jogo repetidamente. É um caso exemplar e pragmático de um boardgame com excelente longevidade graças às suas mecânicas e natureza de jogo.
O dinâmismo do jogo é excelente. O tabuleiro está sempre em constante evolução assim como os dominios dos jogadores. Nada é garantido pois uma colónia poderá ser quase destruida graças a uma erupção, logo este jogo obriga os jogadores a evoluirem as suas estratégias conforme o que se passa no tabuleiro, e isso é bom pois provoca um dinâmismo em constante evolução que torna o jogo muito mais divertido. Não é um jogo estático sem dúvida nenhuma. É um jogo que tem bastante profundidade que não é aparente a principio. Este jogo desdobra-se de tal maneira que um jogador apercebe-se que este jogo torna-se tão profundo que pode supreender os mais incautos que pensavam que este jogo era outro eurogame como todos os outros.
Quanto a introdução a novatos, pessoalmente não creio que este boardgame seja bom para tal. Sim, joga-se rápido e tem montes de táctica e estratégia, mas também é extremamente profundo e subtil, algo que um novato não irá apanhar. Mais, um jogador habituado a boardgames iria dar cabo de qualquer novato neste jogo, pelo que sinceramente não aconselho este jogo para novatos, não é um gateway game e é bem mais profundo do que aparenta, facto ao qual os novatos não irão perceber. Pessoalmente não recomendo este boardgame a novatos.
Quanto ao problema de analysis paralysis este jogo poderá ter um pouquinho mais do que no Carcassonne, mas mesmo assim não é nada que se note. Os jogadores costumam decidir-se rapidamente e as jogadas são muitas vezes relativamente aparentes. Mesmo assim este jogo pode ser dado a uma análise extensiva por parte dos jogadores e isso pode criar um pouco de analysis paralysis mas na minha experiência os jogadores não passam tempo em demasia a pensar na próxima jogada.
Relativamente ao downtime este jogo tem pouco. O tempo dispendiado à espera da nossa próxima jogada costuma ser curto, apesar do jogo ser mais complexo do que aparenta. Logo o downtime deste jogo é quase minimo e acaba por não irritar ninguém. De facto o downtime deste jogo é menos do que no Carcassonne, o que é muito bom. Mas se vos calhar um grupo que gosta de analisar todas as jogadas então o downtime já se torna um problema neste jogo. Este jogo pode ser dado a análise como disse acima.
Em relação ao visual do jogo, este sim é um jogo que chama a atenção de quem quer que esteja a passar pela mesa de jogo. É um jogo belo enquanto está a decorrer e vai-se tornando muito mais colorido à medida que o jogo decorre. Se quiserem impressionar non-gamers às virtudes de um boardgame só pelo visual do jogo então este jogo é um dos mais indicados para tal. Em termos de visual são muito poucos os boardgames que atingem um grau de beleza como este jogo atinge, muito graças à maravilhosa arte nos tiles.
Quanto às mecânicas, temos tile placement e set placement. Ou seja, o jogo trata-se de colocar tiles em jogo e de usar completamente dois dos três sets de peças em jogo. É competente na execução de ambas as mecânicas e como tal o jogo flui muito bem de jogada a jogada. Também tem uma mecânica engraçada em que se um jogador não puder construir mais nada na sua jogada perde automaticamente o jogo, o que obriga os jogadores a raciocinarem muito bem o que vão colocar e aonde, de maneira a não gastarem um tipo de peças demasiado depressa. É esta mecânica que torna o jogo muito mais divertido e agonizante. Uma boa execução de mecânicas origina um jogo bom e competente.
E é isto.
Eu gosto bastante deste jogo. Apesar de se jogar rapidamente este jogo tem muito mais que se lhe diga, tem bastantes manhas e é muito mais do que aparenta ser. É um jogo em que todas as nossas jogadas são cruciais tanto para nós como para os outros jogadores e que nos obriga a pensar antes de fazer algo.
É um jogo muito bom e divertido, um jogo que boardgamers experientes não se importarão de jogar sempre que houver tempo para tal. A sua profundidade aliada ao tempo de jogo torna este jogo muito mais impressionante do que deveria ser e, como tal, muito mais apelativo.
Pessoalmente eu recomendo este jogo e acho que deveria estar na coleção de todos os boardgamers. É um boardgame brilhante no sentido de provar verdade a expressão “nada é o que parece ser”. É um jogo que nos irá supreender com a sua profundidade e como tal irá atrair qualquer boardgamer que goste de eurogames. Este é, sem dúvida, um eurogame no seu âmago mas ao mesmo tempo o conflito indirecto entre jogadores irá atrair quem goste de boardgames com algum conflito.
Um boardgame brilhante que recomendo vivamente. Uma jóia escondida.
15 de 20.