Tinner’s Trail ou “Trilho dos Mineiros de Estanho” é um título muito particular. O tema, o sistema de jogo e o próprio grafismo compõem um flavour de jogo pesado, mas feitas as contas, não o é, nem nunca o quis ser. Será que, tal como se fosse um vinho, lhe podemos chamar um leve, meio seco?
Por mais críticas que lhe faça, acabo sempre por lhe pegar e sugeri-lo para aquele espaço de tempo tão cruel para os heavy-gamers - a hora e meia. Precisamente! O Tinners’ Trail não é mais do que uma armadilha para jogadores de peso, atraídos por um mapa austero, recheado de quadros, tabelas e tabelinhas. Talvez por outro lado, encontre a redenção como uma boa iniciação a jogos de gestão mais complexos.
Este título integra a linha Treefrog da editora Warfrog Games. Uma colecção de jogos tem como particularidades as suas edições absurdamente limitadas e os seus componentes exclusivamente em madeira. Tinners’ Trail não é excepção, e apresenta uma selecção de peças em madeira, desde os habituais cubos, passando pelos barcos, comboios, mineiros e até as próprias minas. Para todos os que gostam de eurogames tradicionais, o título brinda-nos ainda com um grande mapa da região, cercado por quadros importantes para o desenrolar do jogo, incluindo até um pequeno player-aid das acções possíveis. Três bonitos dados integram os componentes e são, na minha opinião, o elemento chave para dar um pouco de emoção ao jogo.
Mas afinal, o que raio se passou de interessante na Cornualha do séc. XIX?!
Uma pequena península que podemos identificar no sudoeste Britânico, é hoje a região mais pobre de toda a Inglaterra. A pobreza, no entanto, não é nova na Cornualha. Fruto da instabilidade dos mercados de minério, o fecho inesperado das minas provocava despedimentos em massa por toda a região. Não era fácil ser mineiro na altura, o mesmo não se pode dizer de ser patrão, papel que os jogadores desempenharão no jogo. Através do investimento em minas e tecnologias de extracção, vamos conseguindo superar os nossos adversários na quantidade de estanho e cobre que retiramos do subsolo, enquanto nos esforçamos para minimizar os custos de extracção, proporcionais à quantidade de água que vai entrando nas minas.
O jogo desenvolve-se durante quatro rondas sucessivas, cada uma delas recheada com várias acções possíveis. Em cada ronda os jogadores dispõem de tempo, mais concretamente dez unidades de tempo. As diferentes acções de desenvolvimento custam diferentes quantidades de tempo. Acrescentar mineiros a uma mina ou melhorar as bombas de drenagem custa uma unidade, construir um porto ou caminho-de-ferro custa duas unidades por exemplo. Estes gastos em desenvolvimentos vão alterando a ordem de jogo de uma forma particular, garantindo que os jogadores que obtêm os melhores desenvolvimentos verão os seus adversários jogar duas ou mais vezes até alcançarem o mesmo gasto de tempo. Numa primeira impressão pode parecer confuso, mas é tudo controlado por uma das muitas tabelas do tabuleiro.
Para além destas acções de desenvolvimento, os jogadores podem ainda realizar outras acções básicas como construir uma mina numa das regiões do mapa, extrair minério de uma das suas minas ou passar. A construção das minas não é feita de forma arbitrária. Na sua vez, um jogador pode escolher uma região que será alvo de um leilão entre todos, até se encontrar aquele que está disposto a pagar mais por aquela localização. De acordo com um setup inicial, diferente em todas as partidas, existem localizações com maior concentração de estanho e cobre, e menos água a obstruir a extracção.
Quando um determinado jogador decide que está na altura de extrair o precioso minério do subsolo, ele escolhe uma das suas minas, avalia a capacidade de extracção (que varia consoante o número de desenvolvimentos que lhe aplicou) e pode retirar da região até esse número de cubos, (laranja para o cobre e brancos para o estanho) pagando por cada cubo o valor igual ao número de cubos azuis, que representam a água dentro da mina, logo, a dificuldade de extracção. Confuso? Aqui está um exemplo:
O jogador amarelo tem à sua disposição uma mina, um porto e um mineiro, isto garante-lhe uma capacidade de extracção de 4, (2+1+1) logo, ele vai poder extrair os quatro cubos de uma vez, pagando 2£ por cada cubo (o número de cubos de água da região). Sendo assim, porquê apostar nos desenvolvimentos em vez de fazer duas extracções? A verdade é que no final de cada extracção o jogador terá que adicionar um cubo de água à região, tornando a mina muito menos rentável e por vezes inviabilizando a relação custo-benefício que a sua mina pode oferecer, uma vez que os preços do estanho e do cobre muitas vezes não são assim tão apelativos, como podem constatar:
Há um aspecto a salientar aqui -o carácter cronológico do jogo. De início somos confrontados com os preços tendencialmente altos dos minérios, mas com pouca capacidade de extracção, à medida que o jogo avança, vamos tendo acesso a desenvolvimentos tecnológicos preciosos para as minas, mas nada nos assegura que os preços de venda irão compensar os esforço. Outra das particularidades do jogo é o sistema de investimento externo. No final de cada uma das quatro rondas somos forçados a vender todo o minério que extraímos e depois investir algum do dinheiro ganho. A dificuldade está em decidir quanto dinheiro, uma vez que ronda após ronda a quantidade de pontos de vitória que podemos comprar com 5£ varia, (entre 6 na primeira ronda e 3 na última) mas nunca podemos esquecer o dinheiro que iremos precisar para investir na extracção durante a próxima ronda. Dêem uma vista de olhos à tabela de investimentos:
A verdade, é que as personagens que interpretamos no jogo eram magnatas incrivelmente vocacionados para o negócio. Este quadro de investimentos representa na realidade a compra de acções na industria metalúrgica em geral. Eles tentavam a todo o custo que os seus metais tivessem a procura adequada para assegurar o escoamento das extracções, e já que tiveram esse trabalho, porque não lucrar com o produto acabado também? Estes pontos de vitória comprados ao longo das quatro rondas, irão determinar no final do jogo o vencedor.
Conclusão
Tinners’ Trail é um jogo de decisões. Esta localização é boa para uma mina? Até quanto estou disposto a pagar por ela? Em que altura devo extrair? Em qual dos minérios devo apostar? Quantos pontos compro, quanto dinheiro guardo para a próxima ronda? -São perguntas com as quais se vão deparar durante todo o jogo. Se as vão levar mais ou menos a sério é uma escolha vossa, uma vez que o preço dos mercados não pode ser controlado (é decidido no início de cada ronda por um lançamento de dados) e este factor decisivo pode irritar muitos jogadores mais mal-dispostos (o meu caso). O autor refere esta preocupação, porém defende-se com a aplicação do tema, uma vez que a descoberta de depósitos de um determinado minério podia fazer cair o seu preço. Pergunto-me se, uma vez que o jogo inclui uma mecânica de prospecção, não se podia ter aplicado o tema ainda mais a sério, fazendo variar os preços conforme a abundância/escassez dos respectivos minérios no tabuleiro. Não querendo impor-me de forma nenhuma às opções de Sir Wallace, este pode ser o único entrave para a passagem de um bom jogo a um excelente jogo, uma vez que tantas outras boas mecânicas estão incluídas neste título. Adoro os componentes, a começar pelo artwork da caixa e a terminar nos dados feitos por encomenda. Gosto bastante da quantidade de decisões que podemos tomar e da pitada de leilão que o jogo inclui.
Tudo parece encaixar muito bem, fazendo de Tinners’ Trail um dos jogos mais densos jogáveis neste período de tempo. Se gostas de jogos de gestão e de mercados, aconselho-te a experimentares este título, se por outro lado já consideras o Brass “para meninos” é bem provável que te desiludas.
Quanto a mim, nem que seja pela sua belíssima caixa, vou continuar a tirá-lo do saco - de outro gajo qualquer.
Tereso