Uma citação

F.A.T.A.L. e a sua circunferência vaginal... brrrrrr... Surprised

"You think I'm old and feeble, do you? Well, face my Flying Windmill Kick, asshole!"

Segundo o que li da citação e do restante texto o autor parece distinguir o aspecto intelectual dos RPGs focando-se apenas no seu potencial didáctico. Não podemos deixar de admitir que a maioria dos textos publicados actualmente são de carácter lúdico e que tanto o seu potencial didáctico como o pedagógico é raramente (no primeiro caso) e infrequentemente (no segundo caso) explorado. Contudo o aspecto pedagógico do RPG tem sido explorado por alguns académicos e entusiastas da América e do Brasil. Aliás, no caso do Brasil existe mesmo uma associação, a Ludus Culturalis, que já fez palestras e tem obras publicadas acerca disso.

Será que existe apenas um espaço para cada um desses potenciais? Duvido muito...

"Se alguma vez sou coerente, é apenas como incoerência saída da incoerência." Fernando Pessoa

Tendo em conta que o texto original é de 1993, fiquem sabendo que saíu uma nova versão (e pelo que parece revista e finalmente completa) numa antologia de ensaios do MIT sobre jogos em "segunda pessoa" (o que inclui RPGs de mesa e não só) chamada apropriadamente "Second Person". O livro apesar de carote (40 euros!) tem 400 páginas e contém ensaios do Kenneth Hite, Jonathan Tweet, Paul Czege e Rebecca Borgstrom de entre outros. O livro contém versões revistas também dos jogos "The Extraordinary Adventures of Baron Munchausen" de James Wallis e do "Puppetland" de John Tynes. A ver...

Aliás se estiverem interessados, dêm uma vista de olhos na Amazon que o livro também lá se encontra à venda...

"Se alguma vez sou coerente, é apenas como incoerência saída da incoerência." Fernando Pessoa

Para que fique registado, e que eu não tenha de falar mais nisto: desagrada-me profundamente The Forge, e acho as teorias do Ron Edwards chorrilhos de mentiras temperados com inveja, ressentimento e ciúmes. Assim, os jogos indy, especialmente os que nos agradecimentos "beijam a mão" ao "Papa" Ron e ao resto dos sequazes, são coisas de que desconfio imenso e no meu tribunal são culpados até serem declarados inocentes sem qualquyer sombra de dúvida. Assim, Não, não me refiro aos jogos "indy". [Para o moderador: As minhas desculpas, Ricardo, não volto a falar nisto. Honest.]

Voltando à vaca fria, a citação de uma introdução a um RPG de 1993 que quer apresentar as técnicas teatrais do Sr. Brecht:

[quote=neonaeon]

- O que te leva a dizer que "nessa altura havia bem mais razão para dizer o que aí diz do que hoje em dia"? Os RPGs indie? Mas sempre os houve e, tal como sempre, estes rpgs continuam a ser um nicho de mercado. A única coisa que me parece ter mudado foi a internet e o facto de estes criadores se terem unido para dar mais visibilidade às suas obras.

[/quote]

Se a memória não me atraiçoa, em 1993 estávamos em plena Era de Ouro do RPG. Apareciam jogos novos a toda a hora, e em vários pontos do globo. Mas os grandes e visíveis, especialmente nos EUA (pois os norte-americanos, como habitantes de um pais grande e com muita população, têm tendência a ignorar tudo o que se passa fora das fronteiras, e o mundo do RPG não é excepção), eram o AD&D com mais de metade do mercado e depois coisas como o Shadowrun, o Battletech, o Cyberpunk, o World of Darkness, dessa época vêm os suplementos mais memoráveis de Call of Cthulhu, as miniaturas mais espampanantes de Epic e Warhammer Fantasy Battle e 40,000 - tudo coisas extremamente ligadas à cultura popular escapista e fácil, tudo coisas facilmente adaptáveis a outros media - como era a televisão (live action ou animação) e que por vezes o foram mesmo (lembro-me de haver ums série de animação do Battletech. Nesse ambiente, não era difícil crer que o RPG era anti intelectual e eminentemente franchised e vendido. Greg Costykian parece ignorar que um jogo completamente experimental como Over the Edge e outro, profundamente poético e com laivos de literário como Ars Magica, são da mesma época e tiveram os seus melhores suplementos e maior momento por essa altura. Assim, compreendo o ponto de vista dele, achando-o, mesmo assim, limitado e pouco informado. Até porque em França se faziam jogos desde terríveis a oníricos que pouco teriam a ver com a cultura popular dos mass media norte-americanos - refiro-me, entre outros, aos jogos do game designer Croc da empresa Siroz, apenas como exemplo.

[quote=neonaeon]

- Em que te baseias quando dizes que a cultura popular surge primeiro nos RPGs e só depois no mainstream? O exemplo que dás não me parece significativo: as teorias da conspiração popularizaram-se com a contracultura dos anos 70, com Robert Anton Wilson e Umberto Eco. O que me parece ter acontecido é que uma coisa que foi moda há umas décadas voltou a ser moda outra vez. O mesmo aconteceu com a ficção fantástica, que esteve na berra com "O Senhor dos Anéis" na década de 70 e voltou a estar agora com a versão cinematográfica.[/quote]

Ui! Peço desculpa, devo ter sido muito pouco claro lá em cima. Não digo que "apareça primeiro", como lei ou regra universal. Simplesmente, na passagem de certa matéria de assunto marginal para assunto de mainstream, como as conspirações, os OVNIS, a paranóia, eu assisti à sua "previsão", de certo modo, na passagem que tiveram pelo RPG, neste caso, pelo GURPS. Que aconteceu antes de atingirem estatudo de mainstream. Não quer dizer que esses assuntos não tivessem sido mainstream antes - foram, e eu sou velho o suficiente para me lembrar em primeira mão da mania dos OVNIS dos anos 70. Claro, tens razão numa coisa: para uma ou duas coisas que se manifestem primeiro no mundo do RPG e depois no mainstream, tens 2000 ou 3000 que aparecem no mainstream e o RPG, como fenómeno de massas que quer ser, corre a copiar. Por outro lado, pessoas que escreveram material para RPG passaram depois a escrevê-lo para outros meios - exemplo, Larry DiTillio, que escreveu Masks of Nyarlathotep para Call of Cthulhu, escreveu espisódios de Babylon 5 e foi o editor principal da série. Assim, alguns criadores e jogadores de RPG começaram a apresentar material que viam nos jogos nos meios que escolheram - cinema, TV, comics - e as fronteiras entre temas da cultura popular e temas de RPG continuam a esbater-se.[/quote]

[quote=neonaeon]

- O autor do excerto não diz que não há RPGs mais profundos (pelo contrário, até menciona um). Diz apenas que a grande maioria são derivativos de tendências da cultura popular.[/quote]

E são - porque nos EUA cultura popular não é uma coisa desprezível. Regra geral. Mesmo para pessoas com educações mais elaboradas. O snobismo deles tem mais tendência para se medir, muito rigorosamente, pelo dinheiro que tens - e ganhas. Acho que quanto ao resto, já referi na resposta acima...


Tragedy is when I prick my finger, comedy is when you fall down a hole and die.

- Mel Brooks -

[quote=jrmariano]

Segundo o que li da citação e do restante texto o autor parece distinguir o aspecto intelectual dos RPGs focando-se apenas no seu potencial didáctico. Não podemos deixar de admitir que a maioria dos textos publicados actualmente são de carácter lúdico e que tanto o seu potencial didáctico como o pedagógico é raramente (no primeiro caso) e infrequentemente (no segundo caso) explorado. Contudo o aspecto pedagógico do RPG tem sido explorado por alguns académicos e entusiastas da América e do Brasil. Aliás, no caso do Brasil existe mesmo uma associação, a Ludus Culturalis, que já fez palestras e tem obras publicadas acerca disso.[/quote]

Bom, quanto a isso, fiz uso muita vez de suplementos de GURPS e de Ars Magica para trabalhos universitários, e foram-me mais úteis que o material mais "sério" e "didáctico" que encontrei - sem os mencionar na bibliografia, claro.

Não é nada que aconselhe aos estudantes fazerem. Eram outros tempos, provavelmente os profes de hoje em dia já sabem mais de RPG que nessa época.

 

Tragedy is when I prick my finger, comedy is when you fall down a hole and die.

- Mel Brooks -

Talvez me tenha explicado mal mas estava a falar do RPG enquanto experiência de jogo e não como sendo texto literário.

Mas sim sempre dá para aprender algumas coisas especialmente na parte da pesquisa.

Hei-de fazer um a T-Shirt a dizer: "Tudo o que sei hoje aprendi a jogar RPG!". ;)

"Se alguma vez sou coerente, é apenas como incoerência saída da incoerência." Fernando Pessoa

Julgo que o aspecto pedagógico de que o Greg fala é no sentido brechtiano do termo, isto é, ensinar as pessoas a compreenderem melhor o que as rodeia e a sua própria situação e comportamento.

[quote=LadyEntropy]
Agora, agradecia que não andasses meter "strawmen" no meu discurso. Quando eu digo que quem joga é quem importa não digo que "não precisamos de livros para jogar". A diferença é muito grande. Podes ter duas partys com o mesmo jogo de DD e enquanto uma faz uma bandalheira a outra tem uma coisa genial a decorrer. Nós precisamos de livros e suplementos porque precisamos de conhecer o mundo em que jogamos, já que na maior parte das vezes, as ideias para fazermos uma personagem vêm do próprio setting em si, e não uma mesma personagem chapa 4 "one size fits all" que cabe em todos os settings e jogos.[/quote]


Questão: Se as personagens são derivadas do setting, em que medida este não tem de ser profundo para permitir personagens profundas? No AD&D 2.ª edição as personagens evoluiam (ganhavam XP) principalmente por matarem seres de outras espécies, partirem coisas e juntarem tesouros e feitiços. Isto não condiciona bastante o tipo de personagem que faz sentido jogar neste setting? Será que alguém tem interesse em jogar um pacifista abnegado em AD&D?


[quote=LadyEntropy]E para evitar mais strawmen dou-te o exemplo: Tens Vampire - O toni joga com a Draculina, Toreador que anda vestida de cinto de ligas e correntes, enquanto que o Miguelito joga com James St. Germain, que é um (aparentemente) calmo Brujah que na realidade anda a planear assassinar o principe, causar uma guerra entre os Ventrue e os Toreador e depois ajudar o sire a subir ao poder. Ambos existem no mesmo mundo -- mas não quer dizer que o mundo/setting cause boas personagens. Ou só más.[/quote]

Nenhuma dessas personagens é interessante em si, mas apenas na medida como podem ser exploradas em ligação com o seu mundo. Na peça "Ricardo III", do Shakespeare tens o suprasumo dos estereótipos: um tipo mau, feio, porco e pedófilo, e no entanto a peça é interessantíssima porque vemos o desenrolar das acções que esse tipo provoca até todas elas se virarem contra ele e ele se encontrar sozinho no campo de batalha a implorar por um cavalo.

O teu James St. Germain, se conseguir tudo aquilo que quer, é apenas um insípido estereótipo de tipo ganancioso e maquiavélico. No entanto, se todos os seus planos correrem mal e ele se vir acossado por todos os lado, como é que reage de forma coerente? E se, para atingir alguns dos seus objectivos, tiver de sacrificar algo muito importante para si? Então já começas a ter uma personagem interessante, na medida em que esta terá de se questionar e sacrificar para poder sobreviver.

Podes fazer isto em Vampire? Sim. O jogo contempla regras para isto? Não. No entanto o Pendragon contempla, na medida em que tem regras para salvaguardar que as personagens não mudam consoante o que é dá mais jeito no momento e para colocar em conflito traços psicológicos e objectivos das personagens.

Observo-te também que é de jogos que a citação trata, e não da maneira como são jogados.

 

 

Voltamos ao mesmo, qual pescadinha com o rabo na boca.

Sim qualquer daqueles personagens pode ser bem ou mal interpretado. Mas desculpem lá, mas não me entra na cabeça que um jogo seja considerado “profundo” enquanto que outro é “porcaria para as massas” só porque um supostamente tem “mecânicas” que obrigam os jogadores a ver a guerra de forma dramática\fazer personagens profundas. Porque isso não é verdade – o sistema de envelhecimento de Pendragon pode dar muita angustia (ai o meu pobre cavaleiro cheio de reumatico) a algums, mas ser indiferente para outros: no final quem faz o jogo é quem joga neles – isto não são boardgames.

Não nego que haja muitas companhias que fazem jogos a tentar aproveitar a hype de uma série\filme (Big Brother RPG anyone?) mas dito senhor acaba por me lembrar aqueles tonis que acham que só vale a pena jogar Indies, porque o serem Indies automaticamente os faz bons jogos enquanto os “mainstream” são automaticamente uma porcaria, exactamente por serem “mainstream” (nota bem: quando me refiro a tonis que acham que só vale a pena jogar Indies não me refiro aos tonis do abre o jogo que jogam Indies. São tonis, mas gosto muito deles.)

Espero não estar equivocado mas a essa orientação chama-se didáctica e não pedagógica. Na minha resposta contemplei as duas mas a brechtiana é claramente didáctica. :)

"Se alguma vez sou coerente, é apenas como incoerência saída da incoerência." Fernando Pessoa

[quote=Verbus]

Greg Costykian parece ignorar que um jogo completamente experimental como Over the Edge e outro, profundamente poético e com laivos de literário como Ars Magica, são da mesma época e tiveram os seus melhores suplementos e maior momento por essa altura. Assim, compreendo o ponto de vista dele, achando-o, mesmo assim, limitado e pouco informado. Até porque em França se faziam jogos desde terríveis a oníricos que pouco teriam a ver com a cultura popular dos mass media norte-americanos - refiro-me, entre outros, aos jogos do game designer Croc da empresa Siroz, apenas como exemplo.[/quote]

Tenho dificuldades em acreditar que alguém tão experiente e conhecedor de jogos como o Greg Costykian possa não estar a par das novidades do mercado e da cena internacional. Aliás, um dos seus jogos, Violence, foi publicado numa colecção de jogos alternativos de uma pequena editora britânica.

E, tanto quanto sei, os jogos do Croc costumam assentar na hiperviolência física.

Man, aliás, woman: nada de tudo isto que começaste a discutir há quinhentos posts atrás invalida nem contradiz nenhum das ideias na citação original. Se fores ler o resto do texto, aliás, encontras a citação:

“As with all roleplaying games, the gamemaster makes the game. Even the best-designed game cannot rescue a poor gamemaster, while a good gamemaster can produce a compelling experience for his players even with an incomprehensible set of rules and the most inane of story lines.”

E so on, and on, a respeito dos players e do impacto que eles vão ter no resultado final que vai fazer da coisa um sucesso estrondoso ou um falhanço redondo. Vê lá tu que afinal o pobre Greg K está 200% de acordo contigo.

Cada jogo não é mais que uma ferramenta, não é o resultado final, e o que conta é como a usas, como bem andas a discutir. Ninguém PODE sequer discordar disso… tal qual como não acho que alguém possa discordar que para resultados pretendidos diferentes, se conseguem potencialmente melhores trabalhos (ou pelo menos execuções mais rápidas ou mais fáceis) usando as ferramentas mais adequadas para isso. Qual é a dúvida?

Tens razão, “pescadinha de rabo na boca”. Se o setting e as regras não podem servir para avaliar a “profundidade” ou “qualidade” de um jogo, de que serve fazer críticas de jogos? Ou discutir qualidades de jogos? Ou premiar jogos?

Eu vejo as coisas deste modo: há muitos carros diferentes. Uns são melhores que outros. Uns são mais seguros, outros mais fáceis de conduzir, outros têm mais potência.
Mas há maneiras diferentes de os conduzir: com o mesmo carro, uma pessoa pode ter um acidente fatal, outra pode andar com toda a segurança, uma pode engonhar o trânsito, outra pode ser um Fangio.

Mas, apesar disso, continuamos a dizer que há carros melhores, com mais qualidade, mais seguros, mais rápidos, que outros.

E isso é novidade?