Vasco da Gama - Análise / Crítica

Trabalha por mostrar Vasco da Gama
Que essas navegações que o mundo canta
Não merecem tamanha glória e fama
Como a sua, que o Céu e a Terra espanta.

Luís de Camões, Os Lusíadas - Canto III

Vasco da Gama

Designer: Paolo Mori
Arte: Mariano Ianelli
Edição: What's Your Game (2009)
página no BGG

A estrofe do grande poema épico Português tão cheio de inflamado patriotismo acima citada procura colocar acima de outras viagens, glorificadas noutros poemas, especialmente os Gregos, a grande epopeia da descoberta do caminho marítimo para a Índia. O jogo Vasco da Gama terá lugar depois dessa epopeia e colocará os jogadores na posição de ricos armadores que procuram, com a ajuda desse e de outros personagens históricos, obter riqueza e glória.
Não deixa de ser curioso que tenha sido um italiano a criar um jogo cujo personagem principal é uma das maiores figuras da história de Portugal. Será que lhe fez justiça?

Componentes

A What's Your Game? aposta na qualidade dos componentes e do design gráfico dos seus jogos. Vasco da Gama não é excepção e os componentes, desde o tabuleiro de dimensões generosas até às peças de madeira e variados marcadores de cartão, mostram isso mesmo.
Os marcadores de cartão são espessos e ilustrados, bem como os cartões dos personagens e as moedas também. Os discos de madeira e peões de marinheiros são adequados às funções e fáceis de manusear. O único tipo de componente que pode deixar um pouco a desejar são os peões para os capitães. São bastante pequenos e por vezes podem ser difíceis de agarrar e manusear, especialmente para alguém com dedos mais grossos. Tirando isso, um pequeno pormenor, são excelentes.

Pontuação: 5/5

Regras

A versão que adquiri do jogo é a alemã, mas as regras em inglês estão disponíveis para serem descarregadas. Estão bem escritas e são bastante claras. Não serão muitas vezes necessárias, mesmo no decorrer de uma primeira partida, e após se adquirir alguma experiência no jogo tudo fica claro.
Vasco da Gama joga-se me 5 rondas. O tabuleiro está dividido em várias zonas que correspondem às acções que os jogadores podem fazer. Na zona central existe uma área em que os jogadores irão fazer uma selecção pela ordem em que realizam as suas acções. Esta é a mecânica mais original do jogo pelo que irei tentar descrevê-la com mais algum detalhe.
Esta área tem 20 espaços onde estão discos numerados de 1 a 20. Um marcador (Vasco da Gama) é colocado junto a um destes discos de acordo com um dos mosaicos de cartão (correspondente à influência de Vasco da Gama) que saiu no turno anterior, por exemplo junto ao disco 11. Isto significará que todas as acções a partir da 11ª poderão ser gratuitas ou pelo menos será algures por aí em que as acções não terão custo. Perceberão mais à frente como este valor pode variar.
Os jogadores, pela ordem de turno (determinada por quem detém a figura de Bartolomeu Dias), escolhem um dos discos numerados e colocam-no num espaço disponível correspondente à acção que pretendem realizar sobre um dos seus discos coloridos para que se saiba a quem corresponde esta escolha. Naturalmente, fazer as acções mais cedo é vantajoso, mas isso poderá ter um custo dependendo da posição final do marcador de Vasco da Gama. Farão isto até que nenhum deles possua mais discos de acção disponíveis.
Nesta altura é voltado um novo mosaico de Vasco da Gama que determinará a variação do marcador e o valor inicial para o próximo turno. Esta variação poderá fazer com que o marcador de Vasco da Gama se mova subindo ou descendo o valor dos discos gratuitos entre -3 e +3. Por exemplo, se o novo mosaico de Vasco da Gama apresentar um -2, o marcador move-se para o espaço 9 e todas as acções feitas a partir da 9ª posição serão gratuitas. Toas as acima desta custarão a diferença entre o número no disco e 9.
A partir daqui as acções são feitas pela ordem dos números que foram colocados pelos jogadores. O custo para aquelas que ficam abaixo do valor indicado pelo marcador de Vasco da Gama são pagas em dinheiro e depois é feita a acção correspondente à área do tabuleiro em que o disco se encontra.

Estas áreas permitem:

- Adquirir marinheiros e capitães.
- Obter o apoio de um dos personagens históricos, a saber; Bartolomeu Dias (obtém primeiro jogador e 2 pontos de vitória), Girolamo Sernigi (recebe um navio mercante que é imediatamente lançado na navegaçao), Francisco Alvares (recebe um marinheiro de cor branca), D. Manuel I (um disco de acção extra) ou Vasco da Gama (reflectido como um apoio em dinheiro).
- Adquirir projectos de navegação (marcadores de navio que requerem um determinado número de marinheiros de cores diferentes e terão maior ou menor alcance na área de navegação).
- Lançar navios na área de navegação (Estes irão depois mover-se ao longo da costa oriental de África e até à India rendendo pontos e benefícios especiais conforme os destinos onde chegam).

Na última fase de cada ronda procede-se ao avanço das expedições anteriormente lançadas distribuindo os pontos e rendimentos correspondentes às mesmas.
Alguns aspectos do tabuleiro são depois actualizados e repostos para a ronda seguinte.

No final da última ronda os jogadores podem ainda lançar expedições para as quais tenham os recursos suficientes, ganhando 3 pontos por cada expedição pronta à sua frente e recebem pontos pelo dinheiro que lhes sobra (1 pontos por cada 3 Reais). Vence o jogador que tiver mais pontos.

O jogo é mecanicamente simples mas oferece algumas decisões interessantes. O seu coração reside na escolha dos discos para as acções e no julgamento das possibilidades de essas acções serem gratuitas ou a sua importância ser tal que justifique a despesa inerente a fazê-la primeiro ou mais cedo. No restante, ou seja, na execução das acções, também existirão alguns factores a ter em conta mas normalmente exigem menos meditação.
A forma como utiliza as mecânicas de leilão e de alocação de trabalhadores é original e veio trazer um novo aspecto e possibilidades a estes géneros.

Pontuação: 3/5

Jogabilidade

Já o joguei com todos os números de jogadores possíveis e o jogo adapta-se bem a essas mudanças. O número de espaços disponíveis em cada uma das áreas de acção é ajustado fazendo com que a competição pelas mesmas seja igualmente importante. Também o personagem com que cada jogador começa é diferente conforme o número de participantes.
Ainda assim, não joguei este jogo muitas vezes. Foram aparecendo outros títulos para experimentar e este tem ficado para trás. Escrever esta análise / crítica fez-me pensar que gostaria de o jogar de novo. Parece ser daqueles que se nos varre da memória durante algum tempo até que vemos a caixa ou algo que nos traz à memória o título e dá vontade de o ir buscar à prateleira.

Equilíbrio

Em nenhuma das partidas me pareceu que alguém fosse claramente beneficiado por algum factor presente ao início. As pontuações  no final costumam ficar próximas mas nota-se que um jogador beneficia de ter jogado em relação a alguém que o vê pela primeira vez. Nada mais natural e realmente basta uma partida para que ambos fiquem com as mesmas possibilidades de jogar competentemente.

Sorte

Pouca. Tirando a variabilidade da posição do marcador de Vasco da Gama, os outros factores aleatórios são pouco influentes. Os marinheiros disponíveis para aquisição costumam ser suficientes bem como os projectos disponíveis para aquisição. Não fará muito sentido alguém queixar-se de perder neste jogo por ter azar...

Pontuação: 5/5

Estratégia / Táctica

Planear é importante neste jogo. Cada ronda deverá ser uma maximização das possibilidades de cada uma das acções possíveis mas também uma preparação para a seguinte. A fase de leilão pela ordem em que são feitas as acções tem aspectos estratégicos pois é feita uma avaliação da importância dessa mesma acção, para o jogador que nesse momento a escolhe mas também para os seus adversários. Há que calcular o risco de uma acção ser muito cara em relação ao ponto a que tal acção é vital para o jogador bem como o ponto a que tal acção poderá ser tão vital que se justifique até o não poder pagar por uma outra.
Por outro lado, não existem propriamente muitos caminhos diferentes para a vitória. Todos os jogadores fazem as mesmas coisas mais ou menos na mesma sequência. Aquilo que os distinguirá será a forma como temporizam e valorizam cada uma das suas acções.

Conclusão

Vasco da Gama é um bom jogo. É mecanicamente sólido, algo original, equilibrado e premeia a habilidade dos jogadores em detrimento da sua fortuna.
Aqueles que o criticam mais duramente recorrem habitualmente ao argumento do tema, da ausência de uma narrativa resultante do jogo.
Pessoalmente, para seguir uma história, leio um livro. Num jogo procuro antes um desafio mental, uma saudável competição ou um simples motivo para o convívio.
Não me desagradam também os jogos altamente temáticos que praticamente nos mergulham numa história fantástica, mas fazer isso não é suficiente para ser um bom jogo e não o fazer não é suficiente para não o ser.

Não é um épico, não apresenta a grandeza que Vasco da Gama mereceria, mas para isso, temos os Lusíadas. Chegam e, às vezes, até sobram.

Vasco da Gama é, apenas, um bom jogo.

 

Pontuação Geral: 13/15