Ahoy, :)
Isto vem de um outro thread...
[quote=JMendes]Nos RPGs tradicionais, os resultados e consequências reais das acções dos personagens estão sempre total e completamente nas mão do GM.[/quote]
[quote=Nietzsche]É verdade, infelizmente. Mas acho que a culpa é mais dos mestres de jogo do que dos jogos ou dos sistemas. [...] acho que sempre consegui manter sob controlo quaisquer tendências ditatorais enquanto mestre de jogo[/quote]
Not so. Como GM, podes dar a liberdade que quiseres aos jogadores, mas no fim, eles vão ter que te perguntar o que é que aconteceu. Os jogadores podem tomar todas as "decisões" que quiserem, mas quem injecta significado nas situações é sempre o GM. Sempre! É inescapável. Não tem nada a ver com tendências dictatoriais. Tem a ver com o facto de, pelas regras, os jogadores, pura e simplesmente não terem autoridade para introduzir significado no jogo.
Atenção: Eu enfaticamente [b]não estou[/b] a dizer que isso esteja errado. Estou, sim, a dizer que se as pessoas souberem de facto o que se está a passar, vão poder jogar melhor ou de alguma forma melhorar a experiência de jogo.
[quote=Nietzsche]Enquanto mestre de jogo - sempre a mestrar jogos "tradicionais" - a minha preocupação é dar grande liberdade aos jogadores, e os mestres de jogo com quem joguei (é verdade que foram poucos...) também nunca me limitaram as possibilidades e nunca senti que o destino de tudo estava na mãos do GM.[/quote]
Isso é completamente ilusório. Se o GM puser um cofre num quarto, se tentares arrombar o cofre, quem decide o que lá está dentro é o GM. Se não tentares arrombar o cofre, quem decide o que está de fora, em cima da secretária, é o GM. Claro que o GM não te vai obrigar a arrombar o cofre, nem vai decidir se consegues ou não, deixando esses pormenores para o jogador decidir e os dados resolverem. Mas quem decide as consequências e o significado de [b]tudo[/b] é o GM. (E novamente, não estou a dizer que isto é mau, isto é como é!)
Se o GM põe um NPC à frente dos PCs, é completamente a decisão dos jogadores a maneira como vão reagir ao NPC. Mas, quem decide as consequências de os jogadores matarem o NPC é o GM, assim como é o GM que decide as consequências de o deixarem vivo. Se nunca sentiste que te limitaram as possibilidades, é porque, francamente, nunca olhaste para além da situação imediata. E nunca o fizeste, especulo, porque o sistema não te recompensa isso.
Agora, existem várias maneiras de ultrapassar este problema. Vou falar de três:
1) As regras dão aos jogadores poderes directoriais. Os jogadores passam a poder introduzir conteúdo no jogo sem ser exclusivamente através das atitudes e acções dos seus PCs. Em PTA, por exemplo, os jogadores têm direito a fazer scene framing, e além disso, volta e meia, ganham direitos de narração.
2) As regras estabelecem stakes resolution com consequências bem demarcadas. Os jogadores passam a ter influência directa sobre as consequências das suas acções. Há inúmeros jogos com isso. PTA, Dogs, etc...
3) O próprio GM anuncia as consequências das coisas, e as regras incentivam os jogadores a tomarem decisões com base em conhecimentos do jogador, para além dos conhecimentos do personagem. É uma versão mais soft do número 2. The Shadow of Yesterday funciona assim em alguns tipos de acções.
É o velho conflito entre maneuver resolution e stakes resolution (o qual é diferente da dicotomia task- vs conflict-, e de novo, vamos não misturar as coisas).
Ora, eu já tive conversas com vários jogadores batidos em RPGs tradicionais acerca dos pontos 1 e 2, e a reacção universal tem sido "yeewww, nojo! Não me parece que vá gostar disso!", sem se aperceberem do que está por trás, e das consequências do que estão a dizer.
Quanto ao ponto 3, já tentei fazer isto um par de vezes em D&D, mas não funcionou muito bem, porque os jogadores não entraram em tune e não se aperceberam do que eu estava a fazer, provavelmente porque não estavam à espera do drift. Vou tentar ser mais explícito next time.
De qualquer maneira, espero ter sido claro quanto ao facto de não estar a falar de railroading nem de force nem de dictatorialidade, mas sim, da própria estrutura interna dos jogos. E só para repetir, porque nunca é demais, eu não estou a dizer que isso é uma coisa má.
[quote=Nietzsche]Não acredito que um tipo que goste tanto do controlo sobre as sessões se comporte de modo diferente se for mestrear um dos tais jogos não-tradicionais. Ou então, se de facto o sistema desse jogo o deixar de mãos atadas e ele não poder exercer o controlo a que está habituado, o mais provável é que ele coloque o tal jogo imediatamente de parte e volte ao que estava a jogar anteriormente.[/quote]
Já este é um fenómeno inteiramente diferente, e um que eu devo, infelizmente, conceder. Conheço este fenómeno. Se é bom ou mau, já não tenho tanta certeza. To each his own, suponho...
Cheers,
J.