Oi, :)
Voltei. Não sei durante quanto tempo é que me vou conseguir manter activo, mas pelo menos por uns tempos, voltei. E voltei por causa deste post, que, para grande surpresa da sua autora, eu muito apreciei.
Voltei, basicamente, porque me interessa discutir alguns dos pontos do post, num formato um pouco mais contido que uma resposta a um granda rant... Como tal, esta série de posts deste blog, adequadamente marcados como "Teoria", dos quais este é o primeiro, servem de ramos de discussão acerca daquele post da LadyEntropy.
Antes de começar:
Pressupostos: Entropy, tu e eu somos ambos pessoas inteligentes e com paixão pelo hobby. Temos opiniões diferentes, porque a nossa perspectiva é diferente. Aprendermos a ver as perspectivas dos outros é útil. Questionarmos a nossa própria perspectiva é útil.
Anyway, para discutir sobre coisas, convém falar um pouco sobre "o que" são essas coisas.
Existe para aí a corrente de pensamento que o termo RPG é suficientemente descritivo. Rir. Se duas pessoas falarem sobre RPGs, o termo vai ter três significados diferentes... Como tal, segue a minha definição. Não é a única possível, mas é a minha.
Postulado: (1) um RPG é uma actividade social que gira à volta de imaginação partilhada e negociada.
Isto é uma definição operacional. Podemos querer acrescentar algumas características à definição, mas a verdade é que esta sempre me chegou para base de trabalho, já que inclui todas as variantes que me dão jeito, ao mesmo tempo que exclui todas as que não dão. :D Se alguém quiser sugerir uma melhor, sou todo ouvidos, mas aviso à cabeça que provavelmente não vou comprar bases de trabalho que ocupem mais de uma ou duas linhas...
Adiante. Keywords sublinhadas:
1) Actividade
Isto devia ser self-evident. Jogar RPG é uma coisa que se faz, e é uma coisa específica que se faz. Infelizmente, não é assim tão óbvio. Muito boa gente por esse mundo fora vai a sessões de RPG, não para realmente jogar RPGs, mas apenas para estar com o grupo. "Eu é mais o chá." A cada um o seu, mas a componente social que não está dentro da actividade está fora da minha definição operacional.
2) Social
Isto também devia ser self-evident. No entanto, existe um conjunto razoável de pessoas que agrupam os CRPGs (Computer Role Playing Games) dentro deste cesto. Excluindo o multi-player (mas, ver ponto 3), os CRPGs single-player também estão fora da minha definição operacional.
3) Imaginação
Mais uma vez self-evident. Um RPG tem que ser acerca de algo que estamos a imaginar. Também pode ser acerca dos elementos reais que estamos a manipular, como os dados ou as folhas de personagem, mas o ponto central tem que ser o que é imaginado. Este é o ponto que coloca a maioria dos vários board-games fora da minha definição, embora não todos, já que um board-game com um tema forte também puxa á imaginação (mas, ver ponto 4). Este é também o ponto que coloca os CRPGs multi-player, e em particular, os MMORPGs, fora da minha definição. Basicamente, quando tudo o que há no jogo está representado graficamente e em chat, não sobra nada para imaginar se não alguns pormenores residuais. Estão excluidos os ambientes de texto, em que é preciso imaginar o que está descrito (mas, ver ponto 5).
4) Partilhada
Este já não é tão self-evident. Há muita gente que coloca tudo o que está ligado a uma dada sessão dentro do saco do RPG. A minha definição operacional só contempla o que é partilhado. Já agora, partilhado, significa comum, em primeira aproximação. Na falta de dotes telepáticos, é impossível partilhar verdadeiramente a imaginação. Mas, se eu disser que estou a imaginar uma vivenda e te disser para imaginares a mesma vivenda que eu, ambos podemos aceitar que estamos a imaginar a mesma vivenda, apesar de termos imagens radicalmente diferentes dessa vivenda. Este é o ponto que coloca o resto dos board-games de fora. Eu posso sentar-me a jogar um board-game, principalmente se tiver um tema forte, e divertir-me a imaginar as várias entidades do jogo como se estivessem realmente a viver aquela situação. Acontece que não há razão nenhuma para tu partilhares essa imaginação. Já agora, se o fizeres, então provavelmente sim, transcendemos o board-game em si e começámos a entrar no domínio do role-play (embora, ver ponto 5).
5) Negociada
Este é o ponto mais polémico de todos, mas não devia ser. Na minha definição operacional, imaginação partilhada só é verdadeiramente role-play se todos os participantes aceitarem integrar os vários elementos partilhados na sua versão da imaginação. Isto basicamente significa que o pessoal não pode estar todo a acrescentar pormenores à toa. É preciso um sistema para negociar e estabelecer quem é que tem direito a dizer o quê. Já agora, negociar não quer dizer "toma lá, dá cá". Na maior parte dos RPGs minimamente funcionais, esta negociação é imediata, instintiva e transparente, de acordo com o sistema e com o set de regras que estiver a ser usado. (Free form é um sistema, damn it!) Mas, isso não quer dizer que não esteja lá. Este é o ponto que coloca a facada final nos board-games com tema e na grande maioria do que se passa nos ambientes de texto à lá MUDs e MUSHes. A única excepção são os chamados TinyPlots, mas isto já começa a sair do âmbito deste post. Quem quiser que vá ver o que é.
Para início de discussão, isto chega. Esta frame of mind tem algumas consequências curiosas, mas calculo que vão aparecer em comentários e respostas aos mesmos. Se não aparecerem, eu logo acrescento. :)
Discuss!
Cheers,
J.
(1) Quem não souber o que é um Postulado, faça favor de ir descobrir antes de postar uma resposta neste thread.