RPGs no Tabuleiro

Retomo este tópico do meu blogue, depois desta questão..
[quote=smascrns (negritos meus)]«Continuo a defender a minha posição actual que é a de aproximar os RPGs dos jogos de tabuleiro. Diria mesmo: fazer coincidir os RPGs com os jogos de tabuleiro.»

Eu até nem discordo, bem pelo contrário. A questão é o como: como é que achas que isto se pode fazer.[/quote] ..ter sido novamente suscitada aqui, no blogue do jrmariano.

Na minha opinião, queria então destacar três vantagens que os jogos de tabuleiro apresentam:

vantagem A - captação de novos jogadores
O grau de preparação/material que se exige de um iniciado é praticamente zero. Chega a ser possível o pessoal combinar jogar ás quatro da tarde, ás cinco da tarde aparecer de surpresa alguém que nunca jogou e ás cinco e dez essa pessoa estar a jogar.

vantagem B - partilha de experiências
O mesmo jogo experimentado por milhares de pessoas diferentes em todo o mundo tem resultados semelhantes e consistentes. As muitas ideias que outros aficionados trocam sobre o jogo coincidem de forma concreta com a experiência que eu tenho dele.

vantagem C - adaptação ao tempo disponível
Quer seja para 2 ou 20 jogadores, quer seja para 30 minutos ou 3 horas, existem boas e diversas alternativas para jogar que encaixam na disponibilidade de cada um. Se existir tempo de preparação necessário, este é relativamente pouco.

Estas três vantagens são particularmente importantes para quem sente falta de haver mais roleplayers, numa altura em que todos nós temos cada vez menos tempo disponível, e para quem aproveita a Internet para tentar manter-se em contacto com o que é que se joga e o que é que outras pessoas acham.

Quando falo numa aproximação aos jogos de tabuleiro, estou principalmente a pensar de um ponto de vista de design, da própria criação dos RPGs (se bem que, do lado de quem mestra/joga, também pode haver algo que se possa fazer). Desta perspectiva - que compreendo não interessar à maior parte dos roleplayers - posso indicar três pontos de aproximação:

ponto 1 - a evidência física
Conforme já foi discutido no tópico anterior, "os complementos visuais e 'físicos' são algo fundamental para tornar os jogos de roleplay algo mais empolgante". Julgo que este ponto já foi bem apresentado anteriormente e tenho pouco a acrescentar. Aquilo que se joga com a mente é estimulado e estruturado por aquilo que se joga com as mãos e com os olhos. Assim sendo, os apoios visuais/físicos são essenciais, mas não devem tentar substituir inteiramente o nosso imaginário. Desde que haja um equilíbrio, a tal physical evidence dá imenso jeito e é um passo na direcção certa.
Um exemplo recente do uso deste ponto é o novo D&D 4ed com as suas cartas de poderes. No entanto, o uso de miniaturas e tiles é exagerado e quebra o tal equilíbrio que já referi.

ponto 2 - regras fortes
A força das regras é uma expressão que já foi discutida neste tópico de 2006 no grupo de Designers-RPG. Uma regra é tanto mais forte quanto mais próxima for daquilo que se passa em sessão. Desse ponto de vista, não é possível reproduzir nos RPGs em absoluto a força impressionante que os livro de instruções dos jogos de tabuleiro têem, onde aquilo que está escrito tem uma exacta correspondência passo-a-passo com aquilo que é jogado - mas é certamente possível fortalecer muito mais os sistemas de roleplay que conhecemos em que é apenas dada uma ideia do ambiente e umas regras para resolução das acções. Raros são os RPGs que respondem directamente ás questões de como organizar uma party (já abordado neste tópico), como é que se começa uma primeira sessão, como conciliar os objectivos das personagens, etc. O que é que se passa exactamente numa sessão do RPG em causa?
Exemplos de RPGs com regras fortes são o Primetime Adventures (que estrutura a sessão com o conceito de turnos) e o My Life With Master (que sistematiza a história com o conceito de fases, também próximo dos jogos de tabuleiro).

ponto 3 - mudar o formato
Porque é que todos os RPGs têem de ser um jogo para 3 a 5 jogadores com sessões de três horas que se encaixam continuamente prolongando-se indefenidamente no tempo? Em vez disso, alguns RPGs podem tentar preencher diferentes formatos conforme a disponibilidade das pessoas. A nível do número de jogadores, são poucas as alternativas para dois jogadores e desconheço se existe algum RPG pensado pensado para seis ou mais. A nível da duração da sessão, se o sistema a estruturar de alguma forma, a tendência é para que a duração diminua para as duas horas, mas pergunto-me se será possivel existir um RPG pensado para sessões de meia-hora. A nível da duração da campanha, é possivel criar RPGs para jogar especificamente só uma história (o que facilita a aplicação do ponto 2) e também é desejável haver RPGs pensados para serem jogados numa só sessão.
Beast Hunters é um exemplo de um RPG pensado para dois jogadores. Não me lembro de nenhum RPG que indique um tempo de sessão mais baixo que o habitual, mas tanto o Primetime Adventures como o InSpectres determinam no seu sistema quando é que a sessão termina. Quanto à duração da campanha, My Life With Master está pensado para três a quatro sessões e The Mountain Witch é um exemplo de um RPG criado para jogar uma única história. Não me recordo de nenhum RPG especialmente feito para ser jogado numa só sessão (ainda não li o Ninja Burguer).

De certa forma, estes três pontos podem corresponder ás três vantagens que assinalei. De um ponto de vista de jogador ou mestre-jogo, apenas o ponto 1 tem algum valor como forma de aproximação aos jogos de tabuleiro. De qualquer forma, como clientes, poderão estar atentos ás alternativas que existem a nível do ponto 2 e 3. Nos três pontos existe bastante espaço para evoluir.

Pessoalmente, e falando dos jogos que tenho estado a desenvolver, confesso que ainda só incorporei o ponto 2 nos meus RPGs. É relativamente fácil dizer que se usa o ponto 1, mas fazê-lo verdadeiramente dá bastante trabalho. Talvez o maior desafio se encontre no ponto 3, onde nos podemos questionar se sequer é possível reduzir o tempo de sessão sem desvirtuar completamente aquilo que é um RPG.

Parabéns por remeter o tópico para um local próprio!

Relativamente às vantagens dos jogos de tabuleiro relativamente aos RPG’s que apresentas concordo que seja necessário, mesmo vital, para a indústria a captação de novos jogadores e os boardgames fazem-no de um modo exemplar. Mas como transpor isso para um tipo de jogo tão distinto sem descaracterizar o mesmo?

Quanto à vantagem da partilha de experiências não julgo ser uma verdadeira vantagem mas sim o resultado de um jogo completamente diferente. A experiência retirada da mesma “aventura” jogada por 3 grupos diferentes vai ser, provavelmente, totalmente distinta, ao passo que o mesmo jogo de tabuleiro jogado por 3 grupos diferentes, vai provavelmente ser bastante semelhante. O princípio inerente a cada tipo de jogo assim o define.

Quanto à adaptação ao tempo disponível, é uma realidade a vantagem dos jogos de tabuleiro em relação aos RPG’s.

Quanto aos pontos de aproximação:

1 – Evidência física: Depende do RPG. Tomando o exemplo que deste, jogar D&D 4th sem miniaturas ou tiles (ou os respectivos substitutos) é algo impossível de concretizar com sucesso. Queres experimentar na próxima sessão? :wink:

Gostaria de salientar algo que já referi noutro post; os jogos de tabuleiro tem um limite físico (tabuleiro e peças) bem definidos, algo que não existe no RPG, mesmo em D&D 4th…

2 – “Regras fortes”: Confesso que não assimilo muito bem este conceito de “regras fortes”. Também não é possível reproduzir num jogo de tabuleiro a força impressionante das infinitas opções que um grupo tem ao jogar RPG’s. Têm os RPG’s assim “regras fortes”?

3 – Mudar o formato: Não pode o DM jogar a campanha/aventura para um número variável de jogadores, adaptando o que tem estruturado às necessidades que tem ou ao que pretende alcançar? Então e as “one shots” e as demos da maioria dos RPG’s?
Não me parece que alterar o formato resolva alguma coisa em benefício dos RPG’s quando existem diversas opções para isso.

_____________________________________________________________<br “Artificial Intelligence is no match for Natural Stupidity.”

[quote=Nazgul]Mas como transpor isso para um tipo de jogo tão distinto sem descaracterizar o mesmo?[/quote]Do ponto de vista de quem faz os jogos, tento oferecer aqui estas minhas sugestões.

[quote]Quanto à vantagem da partilha de experiências não julgo ser uma verdadeira vantagem[/quote]Não? É a razão que, por exemplo, ajuda a explicar o facto de neste site haverem muitas mais reviews de jogos de tabuleiro do que de RPGs. Maior partilha de experiências é uma vantagem.

[quote]1 – Evidência física: Depende do RPG.[/quote]Todos estes pontos dependem principalmente do RPG. "Quando falo numa aproximação aos jogos de tabuleiro, estou principalmente a pensar de um ponto de vista de design, da própria criação dos RPGs (se bem que, do lado de quem mestra/joga, também pode haver algo que se possa fazer)."[quote]2 – “Regras fortes”: Confesso que não assimilo muito bem este conceito de "regras fortes".[/quote]É uma definição que também já teve o seu próprio tópico :) mas talvez seja mais fácil entenderes se te lembrares de RPGs com regras "fracas": sistemas que deixam as coisas-assim -mais-ou-menos e entregues à interpretação do freguês ou RPGs que tentam ser três ou quatro tipo de jogos ao mesmo tempo ou livros que não se preocupam minimamente em facilitar a transposição entre o que está escrito e a mesa de jogo. Regras fortes é o contrário. Estão o mais próximo possível da sessão em concreto.

[quote]3 – Mudar o formato: Não pode o DM jogar a campanha/aventura para um número variável de jogadores, adaptando o que tem estruturado às necessidades que tem ou ao que pretende alcançar? Então e as “one shots” e as demos da maioria dos RPG’s?[/quote]Um DM até pode escrever o seu próprio RPG, mas tem tempo para isso? Algo feito de raiz (e volto a frisar que estou a falar "de um ponto de vista de design, da própria criação dos RPGs") é sempre mais eficaz do que algo adaptado e dá menos trabalho. As adaptações do tipo one-shot que demonstram um determinado RPG são, de facto, demonstrações: amostras pensadas de forma a levar os potenciais clientes a comprarem o jogo a sério.

Sobre a diferença de perspectiva entre Sessões (a questão do "não pode o DM fazer XYZ?", "não pode o super-DM transformar um cenário de one-shot fraquinho num sucesso histórico?", "não pode um grupo alterar as regras conforme lhes dá mais jeito?", etc.) e Regras (que é principalmente aquilo a que me estou a referir neste tópico), temos este artigo onde ela já foi abordada.

Ricks, fazes uma abordagem interessante, mas vou tentar rebatê-la em defesa dos "RPG enquanto não-boardgames". ;)

Ponto 1 (evidência física) - Estou plenamente de acordo contigo quanto à questão dos elementos visuais. Mas não vejo qual é a necessidade de "converter" os RPG em boardgames para promover isto. (Aproveito para, novamente, fazer um disclaimer: a minha vivência de RPG resume-se a D&D).

Nos meus jogos utilizo inúmeros elementos visuais, essencialmente imagens impressas que ajudam a ilustrar o que se está a passar. Mas tenho usado muitas outras coisas "home-made", como o esqueleto de um moinho em cartão, ou até mesmo uma data de pinheiros-bebé que arranquei para fazer um cenário de uma batalha numa floresta anciã.

Não sei se a tua sugestão é tentar algo parecido com o boardgame "World of Warcraft"? Atenção que eu nunca joguei isto e posso estar a dizer uma tremenda barbaridade! Pelo que vi parece-me ser a essência do role-play, mas com cartões, bonecos e "quests", tudo em elementos visuais. Estou correcto?

Se o que estás a sugerir é "um novo ramo" de tipologia de RPG, encarado enquanto uma espécie de novo jogo, penso que é uma abordagem interessante, e que poderá ter espaço num nicho de jogadores que goste dessa abordagem.

Mas se por outro lado defendes que a própria essência dos RPG deve "evoluir" neste sentido... então estou em desacordo.

Ponto 2 (regras fortes) - Deu-me a impressão que a sugestão de "regras fortes" é o que eu entendo como "linearização do jogo". Se existir uma "checklist" a dizer ponto por ponto como te deves comportar e como deves agir num RPG... matas toda a criatividade do jogo. Começa a ser praticamente um daqueles mini-módulos oficiais, lineares, e que se jogam bem numa tarde solta, mas que muito pouco têm a ver com RPG.

Deixo-te um exemplo. No meu D&D 3.5 uma das coisas que eu abomino são os spells "save or die". Não me passa pela cabeça fazer "petrify" a um jogador, ou deixá-lo 10, 20, 30 turnos a dormir ou imobilizado ou algo que o valha. Eiminei por completo a possibilidade de isso acontecer. Quando faço um petrify, o efeito vai "ocorrendo" aos poucos. Ou seja, começa por lhe atingir um braço, reduzindo-lhe a Dexterity em 2; mais uma ronda e ela começa a ter dificuldades em movimentar-se, e assim sucessivamente. Ou seja, basicamente eu "descarto" as ditas "regras fortes" que são muito claras ao dizer "se o jogador falhar o save, acontece rigorosamente isto", e tento improvisar uma forma de tornar estes efeitos em desafios interessantes de parte-a-parte.

A meu ver, as regras fortes vão servir somente para linearizar o jogo e reduzir a margem de "criatividade/fantasia" de quem joga. É um pouco uma das principais críticas que têm sido feitas a D&D 4.0, as regras são bastante mais simples, concretas e sem estarem sujeitas a "possíveis interpretações", mas a experiência de jogo/role é bastante mais reduzida.

Ponto 3 (mudar o formato) - Não compreendo esta questão. Existem incontáveis sistemas/formatos de RPG, mais do que eu alguma vez conseguirei conhecer, como tal, basta que cada um escolha aquele de que mais gosta...

Não creio que exista "um formato RPG". Existem vários. E não me parece que standardizar a coisa seja a solução. Eu sou activamente contra TUDO o que envolva standardizações. A humanidade não é standardizada, logo porque carga de água é que todas as outras coisas o devem ser?

Conclusão: fico com a sensação que és um grande apaixonado por RPG e ao mesmo tempo um grande apaixonado por boardgames, e como não deves ter tempo para jogar tudo o que gostas estás à procura de "matar dois coelhos com uma cajadada". Smile

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"Blog" https://balazanar.blogspot.com/ "D&D" https://jrc589.googlepages.com/

Se bem compreendo, o que tu queres é, a certo nível, um regresso às origens. Eu explico-me. Na origem, ou seja, há 30 e tal anos atrás, os jogos que trabalhavam sobre a história e a ficção eram os jogos de guerra. Foi a partir deles que se desenvolveu o rpg e foram os wargamers a fornecer os primeiros jogadores de rpg. Num certo sentido tu propões actualizar esta abordagem mas colocando os board games no lugar dos wargames, dado aqueles serem hoje bem mais populares. Eu não discordo, bem pelo contrário.

a evidência física
Uma das coisas que me aproximou aos rpgs algumas décadas atrás (a mim e a muita outra gente) foi precisamente a evidência física. Os dados bizarros, as miniaturas, os mapas, etc. Hoje é tão válido como então. Claro que não funciona para toda a gente nem para todos os tipos de rpg mas é um elemento que não pode ser menorizado.

regras fortes

Aqui já penso que é uma preocupação secundária. Do meu ponto de vista o rpg deve ter regras fortes para as mesmas coisas que os jogos de tabuleiro as têm, e não mais. O roleplay assenta em regras fracas por natureza. O problema com muitos rpgs é que procuram criar sistemas de regras ainda mais fortes para as coisas cobertas pelos jogos de tabuleiro (ou wargames), quando isso não é necessário. Repara, é frequente encontrarem-se rpgs com regras de combate bastante mais complexas do que as de wargames, por exemplo.

mudar o formato

Porque é que todos os RPGs têem de ser um jogo para 3 a 5 jogadores com sessões de três horas que se encaixam continuamente prolongando-se indefenidamente no tempo?

Sorry mas isto não é uma norma dos rpgs, é aquilo que a prática veio a consagrar. É assim porque é o modelo mais satisfatório para os jogadores. Isso tem a ver com a natureza dos rpgs que é diferente da dos jogos de tabuleiro. Nota, aliás, que há nestes distinções empíricas (fillers, meaty, etc.) que denotam diferentes tipos de jogo.

Os rpgs podem ser mais variados e podem ser concebidos diferentes níveis de jogo? Talvez. Há porém neles um elemento que limita muito a variabilidade: o jogar vestindo a pele da personagem. A atitude psicológica que se pede ao jogador determina em grande parte o formato. É difícil vestir a pele da personagem quando se vai jogar por 1/2 hora ou mesmo por 1 hora; é difícil vestir a pele da personagem quando se vai jogar o MJ apenas, sem a participação de outros jogadores (um aspecto importante para se vestir a pele da personagem é, do meu ponto de vista, a existência de tempos passivos onde o jogador assiste às interacções entre outros jogadores, eles também a agir na pele das suas personagens).

O que me parece que falta na tua aproximação aos jogos de tabuleiro é um teste bastante simples conceptualmente. É o seguinte:

Pega num jogo de tabuleiro, preferencialmente num jogo de tabuleiro cooperativo tipo Runebound, Descent, Harkam House; e transforma-o num rpg. Quer isto dizer, usa os seus materiais, as regras como estão para aquilo que elas definem (stats, combate, etc.) e adiciona o que for necessário para ele servir de base a um rpg.

Já alguma vez tentaste fazer isto? Eu não tentei mas acho que é bem mais difícil do que parece.

Sérgio Mascarenhas

PS Um exemplo recente do uso deste ponto é o novo D&D 4ed com as suas cartas de poderes. Interessante, não sabia disto. Confirma o que pensei desde que vi o DD4: ao contrário do que se dizia, que era uma aproximação aos MMORG, ele pareceu-me ser fundamentalmente uma aproximação aos jogos de cartas coleccionáveis e aos jogos de tabuleiro com cartas.

«Quanto à adaptação ao tempo disponível, é uma realidade a vantagem dos jogos de tabuleiro em relação aos RPG’s.»

A minha não muita experiência de jogos de tabuleiro diz-me que isto não é correcto. Ou melhor, é verdade do ponto de vista macro, dos jogos de tabuleiro em geral, não do ponto de vista micro, de cada jogo de tabuleiro em particular. Há jogos de tabuleiro simples e rápidos de jogar e há jogos que levam horas, entre preparar e jogar.

Quanto muito pode-se dizer que os rpgs tenderam a centrar-se em jogos complexos e demorados, o equivalente dos Runebound, não havendo o mesmo volume de rpgs simples e rápidos que encontramos no campo dos jogos de tabuleiro.

Sérgio Mascarenhas

Se há uma lição que os designers de rpgs deveriam aprender com os designers de jogos de tabuleiro é a de que as regras devem ser subdivididas em níveis de dificuldade/complexidade/complementaridade e apresentadas «aos bochechos». Um dos obstáculos à disseminação dos rpgs está precisamente aqui. São-nos dados livros de centenas de páginas concebidos em tal termo que para começarmos a jogar temos de as absorver a todas. Não deveria ser assim. Aquelas centenas de páginas deveriam ser divididas em módulos do mais simples para o mais complexo, do mais essencial para o mais acessório, e cada módulo deveria ser imediatamente jogável.

Em rigor isto não é uma novidade. Isso sucedia com o DD original. Há dois rpgs modelo neste domínio, o Toon e o Prince Valiant. Infelizmente as suas temáticas de base eram demasiado de nicho. Um jogo com um género/tema mais standard que seguisse os mesmos princípios de apresentação poderia facilitar e muito a disseminação do hóbi.

Sérgio Mascarenhas

[quote=Psygnnosed]Ricks, fazes uma abordagem interessante, mas vou tentar rebatê-la em defesa dos "RPG enquanto não-boardgames". ;)
Ponto 1 (evidência física) - Estou plenamente de acordo contigo quanto à questão dos elementos visuais. Mas não vejo qual é a necessidade de "converter" os RPG em boardgames para promover isto.[/quote]Eu não estou a sugerir a conversão total dos RPGs em jogos de tabuleiro. Destaquei apenas três possíveis vantagens e, como consequência, três potenciais pontos de aproximação. Três pontos fazem um plano :) mas não deixam de ser só três.

[quote] Pelo que vi parece-me ser a essência do role-play, mas com cartões, bonecos e "quests", tudo em elementos visuais. Estou correcto?[/quote]Em termos de design, eu dou um passo um pouco atrás. Convencionou-se que os elementos físicos do jogo são folhas de papel a4, um conjunto de dados, um lápis e uma borracha. Sugiro que se volte ao início e se verifique a potencial utilidade de cada elemento. É necessário uma folha a4 ou podem ser usadas cartas? Será que marcadores podem substituir o lápis e borracha? No geral, não será possível tornar a experiência mais visualmente atraente? O importante é que se mantenha o tal equilíbrio que referi: "os apoios visuais/físicos são essenciais, mas não devem tentar substituir inteiramente o nosso imaginário."

[quote]Se o que estás a sugerir é "um novo ramo" de tipologia de RPG, encarado enquanto uma espécie de novo jogo,[/quote]A questão de nomenclatura e possível classificação foi discutida no tal tópico anterior.

[quote]Mas se por outro lado defendes que a própria essência dos RPG deve "evoluir" neste sentido... então estou em desacordo.[/quote]Defendo só enquanto sou sensível ás três vantagens que indiquei.

[quote]Aproveito para, novamente, fazer um disclaimer: a minha vivência de RPG resume-se a D&D. (...) Ponto 2 (regras fortes) - Deu-me a impressão que a sugestão de "regras fortes" é o que eu entendo como "linearização do jogo". Se existir uma "checklist" a dizer ponto por ponto como te deves comportar e como deves agir num RPG... matas toda a criatividade do jogo.[/quote]Não se trata de tornar o jogo mais linear, mas sim de focalizar a sessão no tipo de RPG que se quer jogar. Se experimentares um RPG como, por exemplo, Primetime Adventures, vais verificar que as regras fortes prestam todo o enquadramento para que os participantes sejam criativos. Aliás, Primetime Adventures é muito mais exigente em termos de criatividade do que, por exemplo, Vampire: the Masquerade ou qualquer edição de D&D. O mesmo acontece em My Life With Master. O grande factor de imaginação dos RPGs é algo que está sempre presente - mas pode estar a ser apoiado por regras fracas ou fortes. Penso que entendeste a "força" das regras como teres ou não permissão para as alterar, quando não é disso que estou a falar. Quando digo que "uma regra é tanto mais forte quanto mais próxima for daquilo que se passa em sessão" é porque ela não se fica por generalidades e indica expressamente no sistema aquilo que se pretende e de que forma isso tem consequência concreta em sessão.

[quote]Ponto 3 (mudar o formato) - Não compreendo esta questão. Existem incontáveis sistemas/formatos de RPG, mais do que eu alguma vez conseguirei conhecer, como tal, basta que cada um escolha aquele de que mais gosta... Não creio que exista "um formato RPG". Existem vários. E não me parece que standardizar a coisa seja a solução. Eu sou activamente contra TUDO o que envolva standardizações.[/quote]A questão é esta: "Porque é que todos os RPGs têem de ser um jogo para 3 a 5 jogadores com sessões de três horas que se encaixam continuamente prolongando-se indefenidamente no tempo?" É uma questão de tempo e disponibilidade que vai ao encontro da vantagem C, não uma questão de gosto. "Mudar o formato" é justamente no sentido de aumentar a variedade de formatos existentes, contra a standartização.

[quote]Conclusão: fico com a sensação que és um grande apaixonado por RPG e ao mesmo tempo um grande apaixonado por boardgames, e como não deves ter tempo para jogar tudo o que gostas estás à procura de "matar dois coelhos com uma cajadada".[/quote]Jogo todo o tipo de jogos mas, para mim, os RPGs estão no topo. Por isso, acho que devem aproveitar as coisas boas que os outros jogos têem.

[quote]Se bem compreendo, o que tu queres é, a certo nível, um regresso às origens.[/quote]É aquela história da tese, antítese e síntese :)[quote]O roleplay assenta em regras fracas por natureza.[/quote]A força das regras, pela definição que proponho, é diferente do seu nível de complexidade ou extensão, se bem que é mais difícil elas serem fortes se tentarem cobrir todo e qualquer tipo de situação. Se não existir qualquer espécie de critério sobre que situações é necessário ou não regular, o sistema torna-se um conjunto avulso de regras fracas. Eu não tenho problema nenhum com "rpgs com regras de combate bastante mais complexas do que as de wargames", mas suponho então que esses rpgs ocupam 90% do tempo de sessão com combate. Se têem regras de combate tão complexas, mas depois dizem que o combate só deve ocupar uma pequena parte do tempo de jogo, então essas regras são fracas: disconectadas do que se passa em sessão.

[quote]Porque é que todos os RPGs têem de ser um jogo para 3 a 5 jogadores com sessões de três horas que se encaixam continuamente prolongando-se indefenidamente no tempo?

Sorry mas isto não é uma norma dos rpgs, é aquilo que a prática veio a consagrar.[/quote]Mais uma consequência das regras fracas :) Os RPGs não se têem preocupado em estabelecer o seu número de jogadores ou tempo de sessão. Na prática, todos tendem para este número/duração.

[quote]É difícil vestir a pele da personagem quando se vai jogar por 1/2 hora ou mesmo por 1 hora; é difícil vestir a pele da personagem quando se vai jogar o MJ apenas, sem a participação de outros jogadores[/quote]Por isso é que esta é principalmente uma questão de design. Como fazer com que um objecto seja mais utilizável sem desvirtuar a sua identidade? É um objectivo do design fazer com que tarefas difíceis se tornem fáceis. Não é impossível.

[quote]O que me parece que falta na tua aproximação aos jogos de tabuleiro é um teste bastante simples conceptualmente.[/quote]Pessoalmente, prefiro partir do ponto de vista de um novo RPG do que estar a converter toda a bagagem de um jogo de tabuleiro que foi criado para servir um propósito diferente.

[quote]Há jogos de tabuleiro simples e rápidos de jogar e há jogos que levam horas, entre preparar e jogar.[/quote]É verdade, mas o tempo total de preparação é proporcional ao tempo de jogo e relativamente pequeno se o compararmos ao dos RPGs. Além disso, o tempo de preparação tende a ser distribuido equititivamente entre os participantes, enquanto nos RPGs se tende a concentrar numa só pessoa.

[quote]Se há uma lição que os designers de rpgs deveriam aprender com os designers de jogos de tabuleiro é a de que as regras devem ser subdivididas em níveis de dificuldade/complexidade/complementaridade e apresentadas «aos bochechos».[/quote]Concordo, mas apenas como uma possível solução para uma excessiva complexidade das regras. A maior parte dos jogos de tabuleiro não usam essa divisão em módulos. Dependente do quão inter-relacionado for o sistema, as regras ficam mais consistentes se for possível apresentá-las todas de uma vez. Não sei se será boa ideia começar a fazer um jogo desde logo com a intenção de o dividir em módulos. Acho que se deve ter primeiro uma ideia concreta da complexidade/extensão do jogo e apenas optar por esse caminho se tal for necessário.

Pois é, um tipo distrai-se e zás! 50km de posts onde muito do que foi dito seria o que iria dizer, enfim vamos lá ver se tenho algo mais a acrescentar.

Não me parece que seja o caso. O facto de existirem muitas mais reviews de jogos de tabuleiro neste site tem a ver com diversos outros factores.
Começando pelo facto de que há muitos mais boardgamers do que roleplayers em Portugal (segundo a minha percepção é claro),terminando no completo desinteresse em organizar eventos de RPG no nosso país e tudo o que passa pelo meio.

Como já foi referido pelo Psy existem muitos mais RPG por ai do que aqueles que vamos conseguir jogar até morrer. Escolha diversificada não falta.
O que falta é divulgação, criação de eventos e suporte local aos RPG’s (leia-se lojas).

Já alguém escreveu no Abreojogo (não me recordo quem) que há muito anos no Porto se via muita gente a jogar RPG, principalmente em lojas, hoje em dia…nada…parece que morreu.

Aproximar o design dos RPG’s dos jogos de tabuleiro não me parece uma medida de sucesso.
Temos pelo menos, como um possível “termómetro” para isso, o nível de sucesso que o D&D 4th vai ter. A ver vamos…

Até aí cheguei eu, mas o conceito não me faz muito sentido nos RPG’s. Torno a repetir a pergunta que te fiz:

“Também não é possível reproduzir em absoluto num jogo de tabuleiro a força impressionante das infinitas opções que um grupo tem ao jogar RPG’s. Têm os todos os RPG’s assim “regras fortes”?”

Nunca falei em fazer RPG’s, falei num DM ajustar a sessão que tem planeada ao número de jogadores que tem disponível ou ao que pretende alcançar. Se ele pretende apenas mostrar um RPG a um potencial grupo de interessados, as one-shots ou a demos são ideais.
Não estava a falar do aspecto comercial com que as mesmas foram feitas.

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Nazgul, volto a dizer que a perspectiva de Sessões - que é aquilo a que te estás a referir quando dizes..

"a força impressionante das infinitas opções que um grupo tem ao jogar RPG’s"
..ou..
"falei num DM ajustar a sessão que tem planeada ao número de jogadores que tem disponível ou ao que pretende alcançar"

..não é o ponto de vista do qual estou a falar. Estou a partir da perspectiva das Regras. Tu dizes "Nunca falei em fazer RPG's", mas é justamente para fazer RPGs que este artigo está orientado.

Quanto ás demos, elas não são "ideais" porque, como já disse, elas são "amostras pensadas de forma a levar os potenciais clientes a comprarem o jogo a sério", ou seja, são versões reduzidas e incompletas de um sistema de regras pensado com outros propósitos que não o de uma one-shot.

A maior parte dos jogos de tabuleiro não usam essa divisão em módulos. Dependente do quão inter-relacionado for o sistema, as regras ficam mais consistentes se for possível apresentá-las todas de uma vez. Não sei se será boa ideia começar a fazer um jogo desde logo com a intenção de o dividir em módulos.

Do meu ponto de vista é uma simples questão de bom senso. Claro que se o jogo tiver um sistema de regras simples, não faz sentido dividi-lo em regras básicas, avançadas, opcionais, etc. Mas a maior parte dos jogos que tenho - não são assim tantos, é verdade - divide as regras em níveis de complexidade.

E há depois questões de processo de design. Num jogo de sucesso há sempre a opção de ir adicionando módulos ao jogo de base (Carcassonne, Catan, Alhambra, ...).

O que é interessante também de um ponto de vista comercial.

Eu defendo que um rpg devia seguir este modelo: regras introdutórias, talvez apresentadas numa versão «lite» ou «fastplay»; regras base; regras avançadas; regras opcionais. O mesmo, aliás, quanto à apresentação do(s) universo(s) de jogo.

Sérgio Mascarenhas

Convencionou-se que os elementos físicos do jogo são folhas de papel a4, um conjunto de dados, um lápis e uma borracha. Sugiro que se volte ao início e se verifique a potencial utilidade de cada elemento. É necessário uma folha a4 ou podem ser usadas cartas? Será que marcadores podem substituir o lápis e borracha? No geral, não será possível tornar a experiência mais visualmente atraente?

O problema é fundamentalmente económico e empresarial. Dou um exemplo a partir dos jogos de tabuleiro: o primeiro jogo de cartas de fantasia, tanto quanto sei, não foi o Magic, antes foi um jogo que o inspirou, o Wiz War (eu tenho, por sinal). Ora o Wiz War nunca conseguiu dar o salto. Porquê? Porque o seu autor nunca conseguiu as finanças e as capacidades empresariais para criar uma versão atraente e facilmente vendável.

Num rpg o problema aumenta exponencialmente, se assim me posso exprimir. O autor do jogo cria o mesmo e depois precisa de uma equipa complexa para criar os materiais para o jogo. Não é propriamente fácil. Ainda se existissem empresas especializadas em criar cartas, peças, etc., assim como há as que criam dados. Tanto quanto sei, não existem.

Sérgio Mascarenhas

[quote=Rick Danger]Nazgul, volto a dizer que a perspectiva de Sessões - que é aquilo a que te estás a referir quando dizes…

“a força impressionante das infinitas opções que um grupo tem ao jogar RPG’s”
…ou…
“falei num DM ajustar a sessão que tem planeada ao número de jogadores que tem disponível ou ao que pretende alcançar”

…não é o ponto de vista do qual estou a falar. Estou a partir da perspectiva das Regras. Tu dizes “Nunca falei em fazer RPG’s”, mas é justamente para fazer RPGs que este artigo está orientado.[/quote]

???

Estas palavras são tuas, eu apenas usei o mesmo argumento para o “outro lado da cerca”.

???

Relembro-te o que disse:

Não percebi a relação das tua resposta com o que eu disse…


Outro assunto que gostava de relembrar é algo que também já foi dito aqui, e provavelmente noutras threads e forums;

Existem centenas (senão milhares) de RPG diferentes, desde o mais complexo ao mais simples, do mais demorado ao mais rápido, escolha não falta para o gosto de cada um.

Como já foi referido aqui, um exemplo é o do D&D original(BECM) que tinha as regras separadas em vários livros com as mesmas cada vez mais complexas. Começar a jogar com as regras simples era muito fácil.

O real problema é a falta de divulgação e suporte.

A aproximação aos boardgames que estamos a debater, no meu entender, não vai resolver nada, apenas vai criar mais um “tipo” de RPG (nem sei se lhe podemos chamar isso) para o meio das outras centenas/milhares.
Que diferença vai isso fazer sem divulgação e suporte?

_____________________________________________________________<br “Artificial Intelligence is no match for Natural Stupidity.”

[quote=Nazgul] ??? [/quote]Só prova que não se consegue discutir estes dois pontos de vista (Regras e Sessões) ao mesmo tempo.

O que disse após o quote seguinte é o complemento dessa interrogação…

Estás a dizer que eu não consigo discutir os dois pontos de vista em simultâneo ao utilizar o mesmo argumento que tu, mas tu consegues?

:smiley:

_____________________________________________________________<br “Artificial Intelligence is no match for Natural Stupidity.”

[quote=Nazgul]Estás a dizer que eu não consigo discutir os dois pontos de vista em simultâneo ao utilizar o mesmo argumento que tu, mas tu consegues?[/quote]Nao é minha intenção discutir duas coisas em simultãneo. Podemos dizer que, tratando do voo das aves, tu falas da galinha e eu falo do ovo :) Ambos os lados são essenciais, mas um é agricultura e o outro é genética ;)
Aliás, tu é que te manténs sempre do mesmo lado da cerca e tentas estar nos dois sítios ao mesmo tempo. Se nos lembrarmos deste, deste ou deste caso, não me surpreende que voltes a bater na mesma tecla. Tenho que te escrever uma dedicatória neste artigo :)

p.s.: Já agora, para que não entendas que eu do lado das Sessões não faço nada, esta secção do fórum foi feita a partir de um grupo criado por mim, completamente dedicado a apoiar os mestres-jogo. Tens aqui o manifesto.

Onde é que tu dizeres isto:

É diferente de eu dizer isto:

Onde é que, em ambas as afirmações, tu estás a falar de “regras” e eu de “sessões”?

As coisas que vais buscar ao baú!

Onde está, em qualquer uma dessas threads, algo relacionado com o que eu disse aqui?

A sério, agradecia que me indicasses onde é que eu, aqui, falei de “sessões” e não de “regras”. Quando estou errado gosto de o saber.

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[quote=Nazgul]A sério, agradecia que me indicasses onde é que eu, aqui, falei de "sessões" e não de "regras". Quando estou errado gosto de o saber.[/quote]Não estás errado, apenas estamos a falar de coisas diferentes. Se a minha ilustração foi insuficiente para explicar a diferença - bem como a indicação que dou antes de ter enumerado os três pontos - este é o artigo onde esta questão foi detalhada.