Olá, :)
Há quem ponha em causa a existência do SIM como Agenda Criativa, não só aqui como também na Forge e em outros foruns. Vou tentar explicar onde e como é que existe.
A melhor maneira de evidenciar a sua existência é começar pelas outras duas.
GAM - O gozo do desafio.
De certeza que já jogaram RPGs com pessoas que estavam à espera do próximo "problema". São os jogadores para quem os momentos altos são planear o assalto à fortaleza ou descobrir quem matou o Coronel Clarke ou como é que vamos convencer o Príncipe a convidar-nos para os Festivais de Inverno. Estes jogadores vivem para enfrentar o desafio e superá-lo. Obviamente, o desafio só faz sentido à luiz de RPG se fôr baseado em Imaginação Partilhada, ou Exploração. Ou seja, tem que ser um desafio que exista e faça sentido no mundo imaginário do jogo. Se não, também podiam ir resolver Sudoku ou jogar Xadrez. Mas os momentos de imaginação que os fazem vibrar são os que engajam o seu modo de resolução. Essa resolução pode passar por planeamento, acuidade táctica, ou simplesmente gambling. Step On Up.
Jogos típicos que suportam bem GAM:
DD3 tem o combate táctico, que é o protótipo do "desafio a resolver" do ponto de vista de história de RPGs. Outro não tão óbvio à primeira vista é o ShadowRun, que tem GAM não só a nível do combate táctico, mas também a nível de planear a missão. Curiosamente, ShadowRun é considerado por muitos um "híbrido" que suporta prioritariamente GAM, mas com uma forte componente SIM à mistura, evidenciado nos milhares de source books.
Ora, da mesma maneira que estes jogadores existem, é fácil compreender a existência de jogadores para quem os "desafios" não são o componente principal. São jogadores que não se importam com a existência de desafios, mas também não se importam com a sua não existência. Chamemos a estes indivíduos jogadores non-GAM.
(Também existem jogadores anti-GAM, mas são bichos raros e vamos ignorá-los sem detrimento da generalidade do argumento...)
NAR - Tema e significado.
Da mesma maneira, há jogadores cujos momentos principais de jogo são as oportunidades de fazer escolhas com significado. Os seus momentos preferidos são aqueles em que o jogo lhes apresenta duas alternativas, ambas igualmente válidas, em que "jogar bem" não é escolher uma ou outra, mas sim o acto de escolha em si. São jogadores que induzem significado nos jogos pelas escolhas que fazem, independentemente daquilo que "o personagem faria", embora esse possa, de facto, ser um factor de decisão. Não se trata do super-herói escolher entre salvar inocentes hoje ou apanhar o vilão e evitar muito mais mortes amanhã. Nos livros, o super herói salva sempre o inocente primeiro. Trata-se, sim, do super-herói que decide nem sequer ir atrás do vilão porque o primo, que não sabe que ele é super, tem um exame de matemática amanhã, e o nosso herói prometeu ajudar.
Jogos típicos que suportam bem NAR:
No mainstream, não há nenhum óbvio. A melhor aproximação é pegar em Legend of the Five Rings e jogar com bastante ênfase na honra, no dever, na etiqueta e na glória, recompensando o jogador à custa de Honor e Glory e remetendo os XPs para segundo plano. É um drift que até é razoável, e podemos considerar que ficamos com um híbrido NAR com GAM em suporte. Se jogarmos L5R out-of-the-box, estaremos provavelmente a jogar híbrido GAM com suporte NAR.
Mais uma vez, da mesma maneira que estes jogadores existem, também existem jogadores que não se importam com a escolha temática ocasional mas também não em importam se ela não existir, não tendo quaisquer preocupações com o significado ou ausência dele. Chamemos a estes indivíduos jogadores non-NAR.
(Curiosamente, os jogadores anti-NAR são bastante mais frequentes do que possa parecer. São os jogadores que, quando continuamente confrontados por escolhas difíceis, se perguntam porque é que o GM anda tão em cima deles, em vez de os deixar jogar. Mas novamente, vamos ignorar estes indivíduos sem perda de generalidade...)
SIM - Direito ao sonho
Agora vamos considerar um jogador que é simultaneamente non-GAM e non-NAR. Vamos definir esse jogador como sendo um jogador com preferencias SIM. Pronto, a existência de SIM como CA está demonstrada. Só que isto não chega para a definir, pelo que vou escavar um pouco mais. Como já foi dito noutros threads, role-play é imaginação negociada, com base na exploração de um espaço imaginário partilhado. Essa exploração pode suportar desafios e pode suportar dilemas, mas nem um nem outro são necessários. Quando a prioridade é o desafio, a agenda é GAM. Quando a prioidade é o dilema, a agenda é NAR. Acontece que para muita gente, a prioridade não é nem o desafio nem o dilema, mas sim a exploração em si. A exploração existe sempre, mas na agenda SIM, a própria exploração torna-se a prioridade.
Jogos típicos que suportam bem SIM:
Também não conheço nenhum jogo mainstream que de facto suporte SIM puro. No mainstream, existe o conceito que tem que haver game balance e que as personagens evoluem em termos de eficácia situacional, e estes conceitos são inerentemente GAM-supporting. Muitas vezes, no entanto, a componente GAM existe apenas em suporte, num modo de jogo híbrido, sendo relativamente fácil driftar o jogo de modo a eliminá-la.
Tendo estabelecido a existência da agenda SIM em termos simplistas, vou agora mergulhar para a complicação que são as sub-agendas. Como SIM é acerca da exploração, não é grande rasgo de génio perceber que as subagendas são acerca das componentes da exploração, que são cinco: System, Setting, Character, Situation e Color.
SIM-System ou Purist For System
São as situações cuja fonte de diversão provém de observar o sistema em si em pleno funcionamento. O meu melhor exemplo de uma sessão Sim-System foi com RoleMaster, em que, na mesma sessão, atravessámos um rio e subimos uma escarpa, usando reolução detalhada com a Movement Maneuver Table. Quando se está a escalar, não há decisões tácticas nem de gambling a fazer. Há que rolar os dados e somar os números e ver se finalmente lá chegámos acima, ou se avançámos mais um bocadinho, ou se ficámos parados, ou se acabámos por cair dali abaixo. Antes que alguém venha dizer que isso não é role-play, se eu fechar os olhos e vir a tua personagem a esforçar-se e a suar, e se tu fechares os olhos e vires a minha imediatamente abaixo, a tentar alcançar o entalhe que tu acabaste de libertar, então temos uma imaginação partilhada, negociada através dos resultados dos dados, e como tal, temos role-play.
SIM-Setting
São as situações cuja fonte de diversão provém da identificação com o setting. Estão presentes mais fortemente na malta que diz que prefere jogar DD em Forgotten Realms porque leu as novelas e percebe o que quer dizer estar em Neverwinter. É também um dos dois grandes barcos de Simulationists By Default, nomeadamente o da malta que só distingue um RPG do outro pelo setting que trás e que decide se vai gostar ou não de um jogo após ler o capítulo de introdução ao setting. Trágico mas real. O pessoal que gosta de jogar em Middle Earth ou Star Trek ou outros está também a evidenciar este tipo de preferência.
SIM-Char ou Fundamental Immersionism
É a malta cuja definição de imersionismo, das várias possíveis, é a mais fundamental. São as pessoas cuja principal fonte de diversão é ver o seu personagem colocado em situações difíceis para o personagem, embora possam ser ou não óbvias para o jogador, para depois enfrentar as situações o mais in-character possível. O exemplo típico é a tal escolha mencionada acima entre salvar o inocente ou apanhar o vilão. Para o jogador, é (ou pode ser) óbvio que há que salvar o inocente, mas o jogador vibra ao "observar" as reacções internas dos seu personagem e a sua angústia existencial. É também o segundo grande barco do Simulationist By Default, o que dá origem ao My Guy Sindrome e à convicção de que a [i]única[/i] maneira de intervir no jogo é através do personagem, e que "se o meu personagem não sabe, então eu também não quero saber". Conversamente, quando toda a gente à mesa está alinhada, tende a ser o modo de jogo que gera os personagens mais memoráveis.
SIM-Situation
Esta subagenda é basicamente bizarra, porque Situation é o componente central da exploração, e sem Situation não pode haver imaginação partilhada, e como tal, não pode haver role-play. É perfeitamente possível que SIM-Situation nem sequer exista como subagenda real.
SIM-Color
São as situações em que a principal fonte de divertimento é o "cool factor". Quando um jogador diz, "mas o momento alto da noite foi quando o Berengor mandou aquela boca ao estalajadeiro e toda a gente se partiu a rir", está tipicamente a evidenciar Color. Se estas forem as suas situações preferidas, então é SIM-Color. O meu melhor exemplo foi a minha season de PTA, em que o que o pessoal curtia eram os one-liners geniais do Rogério e as descrições gráficas de enquadramento de câmara.
E pronto, espero ter conseguido pôr em evidência a existência de SIM como Prioridade Estética, e espero ter feito sentido em relação às subagendas. Comentem ou façam perguntas, conforme vos aprouver. :)
Cheers,
J.